Mortalidade pelo vírus HIV no Brasil ainda é
alta
Elogiado internacionalmente por sua política de
combate à aids, o Brasil ainda apresenta um índice de mortalidade
bem mais alto que o dos países desenvolvidos, além de muitas falhas
na prevenção das doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). Esse foi
o recado de especialistas no debate público "HIV/Aids: Prevenção,
assistência e parcerias entre Estado e sociedade civil", realizado
nesta segunda-feira (19/10/09) pela Assembleia Legislativa de Minas
Gerais. O evento foi realizado pela Comissão Extraordinária de
Políticas Públicas de Enfrentamento à Aids, DSTs, Alcoolismo, Drogas
e Entorpecentes, a requerimento dos deputados Fahim Sawan e Célio
Moreira, ambos do PSDB.
O alerta sobre o alto índice de mortalidade no
Brasil foi feito pela médica infectologista Cristina da Cunha Hueb
Barata de Oliveira. Segundo ela, entre 1980 e junho de 2008, foram
identificados 506 mil infectados. Mais de 250 mil deles já morreram,
um índice de 50%. Outros países da Europa e da América, segundo ela,
apresentam índices menores, de 40% ou mesmo 20%. "O problema é a
dificuldade de diagnóstico", afirma a especialista. Ou seja, os
brasileiros infectados descobrem a doença quando ela já está em um
estágio muito avançado.
Por outro lado, o País tem índices positivos
também, além de um sistema público de fornecimento de medicamentos
que é exemplo para o mundo. A estimativa era de que o Brasil
chegaria ao final da década de 90 com 10 milhões de infectados.
Hoje, temos 240 mil em tratamento e uma estimativa de 400 a 500 mil
pessoas que têm o vírus HIV e não sabem. Entre 1995 e 2007, a
sobrevida média dobrou, de 4 anos e 10 meses para 9 anos. Isso se
deve à utilização de medicamentos antirretrovirais, que contêm a
multiplicação do vírus, apesar de não eliminá-lo.
O coordenador da comissão, deputado Fahim Sawan,
afirmou que apenas no ano passado, 33 mil pessoas foram infectadas
pelo HIV no Brasil. Em Minas Gerais, o total de portadores do vírus
chega a 60 mil e, no País, 180 mil. Para ele, o trabalho de
prevenção da doença não pode ser responsabilidade apenas do poder
público. "É necessário que se tenha a sociedade como parceira nesse
trabalho", disse.
Os números surpreendem também o autor do
requerimento da reunião, deputado Célio Moreira. Em sua opinião, é
preciso investir para evitar a expansão do HIV. Para a médica e
sexóloga Adélia Maria Batista, chegou a hora de rever o programa
nacional de combate às DSTs, apesar de seus sucessos. "Aqui no
Brasil, quando uma coisa está funcionando a gente deixa estagnar.
Está na hora de melhorar", afirmou.
Minas é o Estado do Sudeste onde a aids mais
cresce
De acordo com a especialista Adélia Maria Batista,
a prevenção às DSTs ainda é um problema em Minas. Segundo ela, Minas
é o Estado em que a aids mais cresce na Região Sudeste. Ela criticou
principalmente a forma como a questão é tratada nas escolas
mineiras. "A criança mexe na internet já com três anos de idade, mas
só se pode falar em sexo na escola a partir dos 11 anos", afirmou.
Essa restrição, segundo ela, não impede a erotização precoce, mas
impede uma orientação adequada das crianças. Ela também criticou a
resistência institucional à realização de testes de HIV entre
adolescentes, nas escolas.
Uma mudança na política estadual de combate à aids
já está em andamento, segundo a assessora da Subsecretaria de Estado
de Vigilância Sanitária, Vanessa Maria Rodrigues Coelho, que
representou o governo na reunião. A principal novidade é a criação
de cinco unidades de referência em doenças infecto-contagiosas, cada
uma em uma macrorregião do Estado. Uma delas já está em construção,
com recursos do Tesouro Estadual.
Os centros de referência, segundo Vanessa Coelho,
unirão tratamento e formação acadêmica. Funcionarão em convênio com
centros de acolhimento e priorizarão o diagnóstico precoce das
doenças. De acordo com a representante do Estado, 13,5 mil pacientes
mineiros recebem os medicamentos antirretrovirais. Ela afirmou que o
número de óbitos vem caindo.
Denúncia - A assessora da
Subsecretaria disse que a omissão dos municípios é um problema no
interior de Minas. Segundo ela, 55 municípios mineiros têm o Plano
de Ação e Metas (PAM) de combate à aids e DSTs, e recebem recursos
federais. No entanto, muitos não executam o plano, sobrecarregando
outras instituições não governamentais. Vanessa Coelho alertou que o
Estado está monitorando os municípios, mas admitiu que muitos não
executam as medidas necessárias por falta de conhecimento e pessoal
qualificado. Por esse motivo, o Governo vem procurando qualificar
profissionais no interior.
Movimento Gay cobra mais investimentos
O fundador do Movimento Gay de Alfenas e Região Sul
de Minas, vereador Sander Simaglio Maciel, criticou o programa
estadual para combate à aids e DSTs. Ele afirmou que os recursos são
insuficientes, os convênios atendem a projetos pontualmente e não
podem ser renovados, e há morosidade no atendimento. Citou como
exemplo um projeto que contou com dinheiro do Estado para implantar
uma academia em Alfenas, mas que já não pode mais receber o
dinheiro. "O que fazer com os equipamentos caros que compramos?",
indagou. De acordo com Sander, neste caso o Governo Federal se
sensibilizou e decidiu continuar financiando o projeto, mas outras
iniciativas não têm a mesma sorte.
Para o membro do Grupo Vhiver, que representou as
organizações não governamentais, Samir Caetano Amim Jorge, não se
pode separar prevenção de assistência, pois são duas ações que se
complementam. Segundo ele, o soropositivo sofre sobretudo com o
preconceito e a falta de perspectiva e, quando se sente assim, acaba
não se prevenindo, pois perde o "sentido da vida". Se ele é bem
assistido, consegue elevar a autoestima, valorizar a própria vida e,
por isso, aceita com mais facilidade a prevenção. "O uso do
preservativo exige uma mudança de hábito. Deve ser um processo
educacional", defende.
A representante do Departamento de DSTs, Aids e
Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Noêmia de Souza Lima,
defendeu mudanças na forma de se discutir a doença no Brasil. Em sua
opinião, alguns problemas ainda precisam ser amplamente debatidos
entre o poder público e a sociedade, como a garantia de trabalho e
de uma vida social regular para os portadores de HIV e a
criminalização para os casos de transmissão voluntária do vírus.
O deputado Fahim Sawan endossou a sugestão, ao
lembrar que a doença está sob controle e, por isso, é preciso pensar
nas milhares de pessoas que têm o vírus mas não são doentes. "Quando
pensamos que 45% dos jovens não usam camisinha em suas primeiras
relações sexuais; que em 2009 foi menor o uso do preservativo na
comparação com 2008 e que as regiões Norte e Nordeste continuam
registrando aumento de casos de infecção, percebemos que avançamos,
mas ainda temos muitos desafios", advertiu.
Presenças - Deputados
Fahim Sawan (PSDB), coordenador, e Célio Moreira
(PSDB).
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