Proposta de privatização da vistoria leva Detran e Denatran ao
confronto
A proposta federal de privatizar a vistoria para
transferência de veículos foi causa de uma exaltada discussão entre
dirigentes dos órgãos federal e estadual de trânsito, em reunião
realizada pela Comissão de Administração Pública da Assembleia
Legislativa de Minas Gerais, nesta terça-feira (29/9/09). O
Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran/MG) vem se
recusando a implantar a medida, autorizada pelo Departamento
Nacional de Trânsito (Denatran) por meio da Resolução 282/2008 e da
Portaria 131/2008.
Autor do requerimento para realização da audiência
e presidente da Comissão de Administração Pública, o deputado Délio
Malheiros (PV) alertou que a medida, se implantada, vai dobrar a
despesa de quem adquirir um carro usado. Isso porque a taxa de
transferência do Detran, de R$ 89,80, será mantida, enquanto que a
empresa vistoriadora cobrará o mesmo valor apenas para esse
serviço.
Durante a audiência realizada nesta terça, o
diretor do Denatran e presidente do Conselho Nacional de Trânsito,
Alfredo Peres da Silva, defendeu com veemência a privatização do
serviço, que para ele vai garantir melhor atendimento ao
proprietário de veículo. Já o chefe do Detran/MG, delegado Oliveira
Santiago Maciel, criticou a medida por considerar que isso significa
transferir para empresas particulares o poder de polícia do Estado
que, em última instância, continua a responder por qualquer erro ou
fraude ocorridos.
A divergência não se limitou às autoridades de
trânsito. A postura do Denatran recebeu o apoio do advogado da
Associação Mineira de Empresas de Vistoria em Veículos (Assomevv),
Ângelo Pettersen. Ele ressaltou que ninguém será obrigado a fazer a
vistoria em empresa privada. Se recorrer ao Detran, no entanto, terá
que enfrentar filas e demora. "O serviço é opcional", afirmou o
advogado. Os deputados presentes alertaram, no entanto, que a opção
não elimina a duplicidade da cobrança pela vistoria.
Advogado acusa Detran de fazer vistorias
inócuas
Ângelo Pettersen também acusou o Detran de não
fazer vistorias efetivas. "São três peritos e 40 agentes para
vistoriar 5 mil carros por dia. Está passando carro clonado e
roubado", afirmou o advogado. A acusação foi rejeitada pelo chefe do
Detran. Oliveira Maciel afirmou que, em três meses, 51 veículos
irregulares foram apreendidos em vistorias. Para ele, o procedimento
de vistoria é simples e está sendo complicado apenas para
encarecê-lo. O chefe do Detran disse que apenas a unidade do Detran
na Gameleira emite 3 mil documentos de veículos por dia. "Em 17
anos, nunca tivemos uma ação por vistoria malfeita", afirmou o
dirigente.
Os deputados também divergiram a respeito do
assunto. Apesar de todos condenarem a duplicidade de cobrança pela
vistoria, o deputado Ivair Nogueira (PMDB) disse ver vantagens na
privatização do serviço, desde que ele seja remunerado pelo Estado,
e não pelo proprietário do veículo. "Os Detrans não tem condições de
vistoriar tantos veículos e não podemos ampliar o número de
contratações em todo setor que tem falta de pessoal, em função dos
limites da Lei de Responsabilidade Fiscal", afirmou o parlamentar.
Já o deputado Neider Moreira (PPS) criticou a proposta de
privatização, feita pelo Governo Federal, por considerar que o
Denatran não tem condições de fiscalizar as empresas credenciadas
para realizar as vistorias. "Somos um País continental e essa
fiscalização teria que ser delegada aos Detrans. A fiscalização é
fundamental em um processo como esse", afirmou Moreira.
Já o deputado Délio Malheiros foi totalmente
contrário à proposta de privatização. Ele argumentou que, se o
Detran não tem pessoal e equipamentos para realizar as vistorias a
contento, cabe à Assembleia Legislativa ajudar o Poder Executivo a
encontrar uma solução para o problema.
O diretor do Denatran, Alfredo Peres da Silva,
admitiu que as instruções do órgão são apenas autorizativas e que,
se o Detran não quiser, não há nada que o obrigue a privatizar as
vistorias. Ele ressalvou, no entanto, que se mantiver o serviço, o
órgão estadual terá que seguir as mesmas regras que as empresas
credenciadas pelo Denatran adotam. O advogado da Assomevv, Ângelo
Pettersen, disse que a privatização já foi adotada pelos estados de
São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina, e em breve será
implantada no Pará.
Pettersen lembrou ainda que o Tribunal de Justiça
de Minas Gerais já concedeu liminar permitindo que uma empresa
credenciada faça a vistoria. Ele cobrou respeito à decisão. Sobre
isso, Oliveira Maciel disse que nada impede que essas empresas façam
vistorias, se os proprietários assim quiserem. Só que o Detran não
deixará de exigir do proprietário uma vistoria feita pelo próprio
órgão, a fim de licenciá-lo. "A lei não fala que pode credenciar. É
preciso observar minimamente o ordenamento jurídico deste País. Se
quer credenciar, tem que mudar o Código de Trânsito", afirmou.
Alfredo Silva afirmou que não há delegação do poder
de polícia na vistoria terceirizada, porque os dados originais do
veículo, que são registrados nos órgãos oficiais pelas montadoras,
não são repassados às empresas. "A empresa informa os dados que
recolhe, sem acesso à base de dados", declarou o dirigente do
Denatran.
Deputado diz que rastreamento por satélite
beneficia Fenaseg
Outra questão discutida na reunião foi a
determinação do Conselho Nacional de Trânsito, de 2007, para que
todos os veículos novos saiam de fábrica com um chip que permita o
rastreamento eletrônico. A determinação foi suspensa, em Minas
Gerais, pela Justiça. O deputado Délio Malheiros disse que a
determinação fere a privacidade dos cidadãos e visa a beneficiar tão
somente a Federação Nacional de Seguradoras (Fenaseg), instituição
que administra o seguro obrigatório de veículos (Dpvat).
O diretor do Denatran e presidente do Contran,
Alfredo Silva, negou com veemência que os órgãos estejam criando
normas com o objetivo de beneficiar a Fenaseg. Ele disse que a
obrigatoriedade do chip tem o objetivo de combater o roubo de
veículos. "Não é para proteger a Fenaseg, é para proteger o cidadão.
São roubados 380 mil veículos nesse País, anualmente, mas só 180 mil
são recuperados", afirmou. Ele ressaltou ainda que não há invasão da
privacidade, pois o serviço só é ativado com autorização escrita do
proprietário.
Presenças - Deputados
Délio Malheiros (PV), presidente da comissão; Ivair Nogueira (PMDB),
vice; e Neider Moreira (PPS). Além das autoridades citadas no texto,
participaram da reunião o coordenador-geral de Informatização
Estatística do Denatran, Roberto Craveiro Rodrigues; o advogado da
União lotado no Ministério das Cidades, Clóvis Bezerra; e a diretora
financeira da Assomevv, Fernanda Melo de Mendonça.
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