Fazendeiros ameaçam comunidade quilombola do Norte de Minas

Apesar de várias denúncias da presença de milícias armadas contratadas por fazendeiros para amedrontar a comunidade q...

21/09/2009 - 00:01
Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais
 

Fazendeiros ameaçam comunidade quilombola do Norte de Minas

Apesar de várias denúncias da presença de milícias armadas contratadas por fazendeiros para amedrontar a comunidade quilombola de Brejo dos Crioulos, não existe nenhuma denúncia formal na delegacia de São João da Ponte (Norte de Minas). A falta de uma ação firme das polícias Militar e Civil em relação aos problemas enfrentados pelos remanescentes de quilombos na cidade é apenas um dos inúmeros problemas enfrentados por eles. A grande questão: disputa de terra.

Nesta segunda-feira (21/9/09), as Comissões de Direitos Humanos e de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais foram a São João da Ponte para ouvir autoridades e membros da comunidade na tentativa de acelerar o processo já em andamento de demarcação das terras. Apesar da elaboração de um laudo para adiantar o processo de homologação e titulação do quilombo, a população que vive em oito pequenas comunidades tem sofrido ameaças e não pode utilizar toda a extensão do território.

Compareceram representantes da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Governo Federal, do Incra, dos quilombolas e da Procuradoria da República em Minas. Após a reunião, os participantes foram à delegacia da cidade, que tem somente dois agentes. Em conversa com o delegado Genalson Pinto de Oliveira, ficou decidido o encaminhamento das questões à Delegacia Estadual de Conflitos Agrários. Também foi decidido o acionamento da Polícia Federal no caso.

"Sem a demarcação de terra, os problemas só vão aumentar", comentou o deputado Durval Ângelo (PT), que solicitou a reunião em conjunto com o deputado André Quintão (PT). "Estamos aqui em caráter preventivo, para que não aconteça como em Felisburgo, onde cinco morreram antes que alguma providência concreta fosse tomada", disse.

O deputado André Quintão ressaltou a necessidade de pressionar o poder público para que o processo de demarcação seja concluído. Ele declarou-se indignado com a falta de estrutura para a realização da reunião na cidade, que foi feita no Parque da Vaquejada. Além de não ter nem instalações elétricas adequadas, faltou energia durante a reunião. "É, no mínimo, muito esquisito a luz cair exatamente na hora de começar a audiência. Não vai ser luz cortada que vai nos impedir de estar ao lado dos quilombolas", falou. Procurada, a Cemig informou que houve um problema no gerador, de causa ainda desconhecida. Durval Ângelo avisou que a bancada do PT vai se reunir com presidência da Cemig para exigir explicações.

Incra - Segundo o gestor do Serviço de Regularização de Territórios de Quilombolas, Antônio Carlos da Silva, o terreno de 17 mil hectares foi delimitado no final de 2007 e identificado pelo Incra como de direito dos quilombolas, que somam cerca de 500 famílias. A área está situada em três cidades: São João da Ponte, Verdelândia e Varzelândia. No total, entre 80 e 90 proprietários ou posseiros estão em terreno quilombola. "Até o final de setembro, pretendemos terminar as notificações", contou. Após notificados, os fazendeiros têm 90 dias para contestar. Só depois, é encaminhado processo administrativo para a presidência do Incra.

"O próximo passo é o ato da presidência declarando o perímetro de Brejo dos Crioulos como área de interesse social. Aí, tem início a avaliação das propriedades, para desapropriação", explicou. "Os maiores proprietários de imóveis já apresentaram recursos administrativos, que já foram analisados pela procuradoria do Incra. A orientação provável é de indeferimento desses recursos", informou. Ele comentou a falta de equipes no órgão. "Nunca vi o Incra com pessoal suficiente para atender demandas", disse o gestor, que trabalha na autarquia há 20 anos.

Governo Federal - Presente à audiência, o subsecretário da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Alexandro Reis, prometeu empenho do órgão em relação ao caso e afirmou que voltará em dez dias à cidade com uma equipe de defensores públicos federais. Durval Ângelo pediu que, junto, também fossem à cidade técnicos que pudessem esclarecer, por exemplo, programas do governo de repasse de verbas a municípios com comunidades quilombolas, seus direitos e deveres.

Quilombolas denunciam falta de assistência do poder público

Um carro velho que serve de ambulância e só pode ser utilizado com o pagamento de R$ 25. Esta foi uma das denúncias dos moradores de Brejo dos Crioulos, que também denunciam a falta de atendimento médico, de abastecimento de água e de programas assistenciais. Segundo eles, somente há dois anos começaram a ser recebidas cestas básicas do Governo Federal. Sobre os pistoleiros, eles afirmam que os homens abordam inclusive crianças e deixam a comunidade em clima de terror constante. Nenhum representante dos fazendeiros compareceu à audiência pública. A presidente da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais, Sandra Maria da Silva, ficou dois dias na comunidade e confirmou a presença de pistoleiros. O delegado afirmou desconhecer as denúncias.

"Estão encurralando nossos filhos. Deitamos e não sabemos se levantamos no outro dia. Nunca perguntaram para nós se estamos sendo acuados. Estão sempre do lado dos fazendeiros. Em uma ocupação recente, sete de nós foram notificados pela polícia", contou o presidente da Associação do Quilombo Brejo dos Crioulos, João Pinheiro de Abreu. "Uma senhora cortou oito paus para fazer uma barraca e está sendo processada. Na fazenda Bonanza, eles roçam oito hectares de mata, poem fogo e falam que fomos nós. Com eles não acontece nada."

Descaso - "Meia dúzia de fazendeiros controlam 70% da área. O Estado só se faz presente nos momentos de reintegração de posse. A eficiência é só contra os quilombolas", denunciou o membro da Comissão Pastoral da Terra, Paulo Roberto Faccion. Para o coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Conflitos Agrários, procurador Afonso Henrique de Miranda Teixeira, é fundamental que a comunidade se mantenha organizada e vigilante. "Vamos mostrar que temos o poder da mobilização", disse. A vice-presidente da Fian Brasil (organização internacional que trabalha pelo direito humano à alimentação adequada, com status consultivo perante a Organização das Nações Unidas), Mariza Rios, confirmou a situação das famílias e denunciou que "a aplicação de recursos estaduais em 2009 nas comunidades quilombolas até o momento é zero".

Um relatório da Fian Brasil recomenda, entre outras coisas, o imediato atendimento à comunidade de Brejo dos Crioulos com equipes do Programa Saúde da Família (PSF); a construção imediata de postos de saúde; o fornecimento de medicamentos; a regularização do transporte nos casos de urgência; a criação de um programa de saneamento básico; a regularização do fornecimento da alimentação e do transporte escolar para as crianças; um sistema de transporte mais eficaz para a comunidade; e a elaboração de um plano pedagógico nas escolas da região considerando as diferenças culturais.

Providências - Serão aprovados requerimentos na próxima reunião para envio: das notas taquigráficas para a Policia Militar; de ofício reforçando a necessidade da presença da Polícia Federal no caso; e de pedido às prefeituras que atuem no correto atendimento do Programa Saúde da Família e do transporte das crianças. Também foi sugerida a elaboração de um documento sobre o caso a ser entregue ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e à Delegacia Estadual de Conflitos Agrários.

Presenças - Deputados Durval Ângelo (PT) e André Quintão (PT). Também participaram da reunião o vice-presidente da Associação Quilombola de Minas Gerais, Francisco Cordeiro Barbosa; os representantes da comunidade de Brejo dos Crioulos, José Carlos Oliveira e Waldomiro Silva; o vice-prefeito de São João da Ponte, Élcio Júnior; o coordenador dos acampamentos, José Carlos de Oliveira Neto; o subcomandante do 30º Batalhão da PM, major Edvar; e o presidente da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial da Nova Central Sindical, Williman.

 

 

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