Comissão Especial da Execução das Penas aprova relatório
final
O relatório final da Comissão Especial da Execução
das Penas no Estado foi aprovado nesta quinta-feira (17/9/09) na
Assembleia Legislativa de Minas Gerais, com elogios das entidades
que participaram das atividades da comissão desde março. O relator,
deputado Durval Ângelo (PT), apresentou, depois de receber
contribuições, 23 recomendações aos órgãos do sistema de defesa
social e justiça, além de sugerir a apresentação de projeto para
alterar alguns pontos da Lei 11.404, de 1994, que contém normas de
execução penal. O relatório menciona os presos provisórios como o
principal gargalo do sistema mas, segundo o próprio estudo aponta,
não existem dados exatos de quantos eles são do total dos 46.573
presos acautelados do Estado.
Entre as principais recomendações do relatório está
a de regionalização das varas de execuções criminais, a começar pela
criação de uma vara única na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
A comissão também recomendou o envio de ofícios aos órgãos
competentes para que haja capacitação e treinamento das autoridades
e servidores atuantes na área de justiça criminal e execução penal
para a utilização de métodos de justiça restaurativa, bastante
enfatizada no relatório. Segundo o texto, a justiça restaurativa
evidencia a busca de interlocução entre vítima e infrator, tornando
o processo penal mais humano e menos tecnocrático. O foco deixa de
ser a punição do condenado, passando para a busca da restauração da
relação social abalada entre a vítima e o infrator da lei.
A situação dos defensores do Estado recebeu
destaque no relatório. Os estudos da comissão concluem que a falta
de estrutura e de pessoal da Defensoria Pública afeta diretamente a
parcela mais pobre da população. "Existe certo consenso de que parte
relevante das prisões provisórias no País ocorre de forma
arbitrária, seja porque faltam elementos que configurem a
pertinência da prisão cautelar, seja porque a população pobre do
País, maior 'cliente' desse tipo de privação de liberdade, não
apresenta condições de se defender judicialmente", afirma o
relatório.
O relatório da comissão também demonstra que, até
2011, segundo estimativa da Secretaria de Estado de Defesa Social,
haverá 76.430 acautelados no sistema prisional do Estado. Em 2003,
havia pouco mais de 23 mil detentos em Minas. O estudo aponta que o
problema maior parece estar relacionado ao enorme contingente de
presos provisórios que adentram diariamente no sistema. De acordo
com o texto, a ausência de assistência jurídica ocorre desde a
investigação policial, permanecendo durante a fase de instrução do
processo.
Falta de defensores agrava problema de superlotação
nos presídios
Dados de 2009, citados no
relatório, dão conta de que atualmente 61% das comarcas mineiras não
têm defensor público. O relatório afirma que,
além de ajudar a encher os presídios de pessoas de origem social
mais pobre, a ausência de assistência jurídica faz com que os presos
sejam alvos fáceis de torturas e violência, ora por parte de agentes
do Estado, ora por parte dos próprios custodiados.
O relator também afirma que a ampliação do quadro
de defensores públicos, ao reduzir o número de pessoas mantidas
ilegalmente ou desnecessariamente nas carceragens estaduais,
acarretará redução proporcional dos gastos com a manutenção dos
custodiados. "Vale lembrar que o custo mensal para o Estado de
apenas três presos equivale à remuneração atual de um defensor
público", concluiu o deputado no relatório.
Gargalo - O estudo ressalta
resultados positivos do Poder Judiciário mineiro, como as
videoaudiências na Vara Execuções Criminais de Belo Horizonte, as
associações de proteção aos condenados (Apacs) e o Programa de
Atenção Integral ao Paciente Judiciário, mas afirma que permanece o
gargalo relacionado ao baixo número de magistrados e servidores do
Judiciário em relação ao grande volume de processos. "Além das
questões relacionadas às prisões provisórias, o excesso de demanda
junto ao Judiciário resulta também em prejuízos na execução penal
propriamente dita. Alguns problemas poderão ser minimizados com a
informatização generalizada das varas de execução, conforme
recomendamos ao final deste relatório", acredita o relator.
O documento recomenda então a realização regular de
concursos públicos para a magistratura e para a Defensoria Pública
do Estado e para a admissão de agentes penitenciários, no intuito de
substituir gradativamente os agentes que estão trabalhando com
contrato administrativo. Além disso, a comissão recomendou a
informatização e integração de informações e procedimentos relativos
à execução penal, com a adoção de software específico com
essa finalidade, constando a idade do preso e a tipificação
penal.
Relatório enfatiza trabalho das Apacs
O método de recuperação dos detentos desenvolvido
pelas Apacs foi enfatizado no relatório, em função dos bons
resultados obtidos. A Apac está presente em 80 comarcas de Minas
Gerais, abrangendo 271 municípios. Há 24 em funcionamento sem a
presença de policiais e agentes penitenciários. Estão em construção
outras 44 unidades, sendo onze com recursos estaduais. Atualmente,
cerca de 1.200 recuperandos cumprem pena nas Apacs.
Foi aprovada recomendação para ampliação dos novos
convênios a serem firmados com as Apacs e ainda o estabelecimento de
termos aditivos para ampliação do objeto dos convênios em vigor, de
modo a possibilitar maior flexibilidade na aplicação dos recursos
repassados pelo Estado. Também foi incluída recomendação, por
sugestão dos participantes da reunião, de que o Executivo preste
assessoramento técnico às Apacs para a correta utilização dos
recursos repassados e para a prestação de contas.
Relatório traz proposta de alteração da lei de
execução penal
No relatório, o deputado Durval Ângelo sugere a
apresentação de um projeto para alterar a Lei 11.404, de 1994, que
contém normas de execução penal. A proposição tem o objetivo de
tornar obrigatória a informatização do controle da execução penal e
a instalação nas unidades prisionais de salas equipadas para a
realização de videoaudiências e prestação de assistência jurídica,
dando mais celeridade e economia ao processo. Também deve ser
assegurado, segundo a proposta, espaço adequado para atuação da
Defensoria Pública.
Outra alteração pretende estabelecer que, em caso
de inexistência de vaga para cumprimento de pena em regime aberto, o
juiz poderá conceder prisão domiciliar, ficando facultada a
imposição de monitoramento eletrônico. O projeto ainda tem a
intenção de prever a remissão de pena por trabalho e por estudo. A
proposição também deve prever a obrigatoriedade de fornecimento
semestral, ao preso provisório e ao sentenciado, de atestado de pena
a cumprir.
Sugestões - O deputado
Durval Ângelo afirmou que praticamente todas as sugestões
apresentadas nas audiências públicas realizadas pela comissão foram
incorporadas ao relatório. Na opinião dele, a participação das
entidades dá legitimidade ao texto. Ele ponderou, contudo, que não
adianta só a lei. "É preciso superar o hiato entre o Brasil real e o
Brasil legal", comparou.
O deputado João Leite (PSDB), presidente da
comissão, sugeriu que houvesse ao menos uma vara de execuções
criminais regional para cada unidade prisional criada. O deputado
Wander Borges (PSB) pediu que fosse incluída a tipificação dos
crimes cometidos e a idade dos infratores nos bancos de dados
informatizados que devem ser integrados.
Para o juiz da Vara de Execuções Criminais de Belo
Horizonte, Herbert José Almeida Carneiro, se as recomendações do
relatório forem aplicadas, a comissão será um divisor de águas para
a justiça criminal do Estado. Ele elogiou os estudos sobre a justiça
restaurativa e sobre o método Apac, incluídos no relatório. Foi dele
a sugestão de habilitar essas associações para dar tratamento
adequado aos repasses públicos recebidos. O juiz também destacou o
Programa de Atenção Integral ao Paciente Judiciário, iniciativa
pioneira do Tribunal de Justiça de Minas Gerais abordada no
relatório. "É um programa que faz a diferença para os portadores de
transtorno mental que cometeram crimes", concluiu.
Para o defensor público-geral do Estado, Belmar
Azze Ramos, o problema da Defensoria, além da falta de pessoal e de
estrutura, é de falta de orçamento. Ele sugeriu a criação de um
fundo para custear as atividades do órgão. A promotora Vanessa Fusco
Nogueira Simões pediu a inclusão de recomendação de ampliação de
unidades prisionais específicas para mulheres. Por sugestão do
defensor público federal Francisco Nogueira Machado, foi
acrescentada recomendação para separação de alas nos presídios do
Estado para receber os presos federais. Também foi acrescentada
recomendação da Pastoral Carcerária para que seja dada estrutura
digna para os familiares dos presos durante as visitas.
Pontos positivos - Nas
conclusões do relatório, são citados alguns avanços na questão
prisional do Estado. De acordo com o relator, a gestão da custódia
de sentenciados tornou-se mais profissional e centrada com a criação
da Subsecretaria de Estado de Administração Prisional e da carreira
de agente penitenciário. O planejamento da secretaria para a
construção de novas unidades prisionais indica que, até 2011, deve
haver um avanço significativo do número de vagas do sistema. Além
disso, o estudo lembrou as alternativas modernizantes da execução
penal, como o monitoramento eletrônico de sentenciados.
Trajetória da comissão - A
Comissão Especial iniciou seus trabalhos em março deste ano, e foi
criada para estudar as condições carcerárias do sistema prisional e
fazer um diagnóstico sobre a execução das penas no Estado,
detalhando o grau de intensidade com que cada órgão atua para
resolver os problemas existentes e mapeando a situação dos detentos
nos estabelecimentos prisionais.
Durante esse período, a comissão teve o prazo para
sua conclusão prorrogado duas vezes, e em quase seis meses de
trabalho, realizou diversas audiências públicas e visitas a varas de
execução criminal no interior e na Capital. A comissão ouviu
autoridades ligadas à segurança pública e defesa social, servidores
públicos e outros convidados, que traçaram um panorama da realidade
prisional em Minas.
Entre as 20 reuniões realizadas, os parlamentares
promoveram audiências nas cidades de Montes Claros (Norte de Minas),
Governador Valadares (Vale do Rio Doce), Uberlândia (Triângulo),
Pouso Alegre (Sul de Minas) e Ribeirão das Neves (RMBH), onde
conheceram os problemas e debateram alternativas para a melhoria das
cadeias e presídios do Estado.
Presenças - Deputados João
Leite (PSDB), presidente; Vanderlei Miranda (PMDB), vice; Durval
Ângelo (PT), relator; Wander Borges (PSB) e Sargento Rodrigues
(PDT). Também participaram da reunião os defensores públicos
estadual Fabiano Torres Bastos, Marina Lage Pessoa da Costa, Maria
Valéria Valle e Paula Regina Fonte Boa Pinto; o superintendente de
Atendimento ao Preso da Subsecretaria de Estado de Administração
Prisional, Guilherme Augusto de Faria Soares; Sílvia Sander, da
Direitora de Proteção de Direitos Humanos; o diretor de Articulação
do Atendimento Jurídico da Secretaria de Defesa Social, Alexandre
Martins da Costa; a ouvidora do Sistema Penitenciário de Minas
Gerais, Marlene Alves de Almeida Silva; a secretária executiva da
Pastoral Carcerária, Maria de Lourdes Oliveira e Silva; e a
representante da Capelania Prisional da Convenção Batista Mineira,
Mônica Felícia Peixoto.
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