Moradores da Vila Paciência cobram transparência da
Vale
Moradores da Vila Paciência, em Itabira, cobraram
nesta quarta-feira (2/9/09) a revisão dos valores oferecidos pela
Vale para que eles vendam seus imóveis e deixem o bairro, localizado
próximo à mina do Chacrinha, e também mais transparência nas
relações da companhia com a comunidade. O assunto foi debatido em
audiência pública na Comissão de Minas e Energia da Assembleia
Legislativa de Minas Gerais a pedido do deputado Ronaldo Magalhães
(PSDB), que alertou para o fato de a mina ter se aproximado muito da
área urbana ao longo dos anos.
"Essa é uma questão ambiental e social séria. A
cidade depende da mineração, mas a Vila da Paciência vive um
contexto específico porque a atividade da mina deve avançar pelo
menos 50% sobre a área", frisou o parlamentar. Ele disse esperar que
a empresa proceda de forma planejada e democrática. "É preciso pelo
menos dar condições ao morador para adquirir outro imóvel", defendeu
o deputado.
Segundo o parlamentar, os imóveis da vila perderam
valor diante dos impactos causados pela mineração, como poluição,
barulho e tremores de terra, mas o mercado imobiliário da cidade
vive um período de supervalorização que precisa ser levado em conta
pela empresa ao negociar com os moradores.
Parte desses impactos denunciados foi mostrada aos
deputados pela secretária da Associação dos Moradores da Vila,
Brígida Linhares, que exibiu um vídeo com imagens de comércio
fechado, casas em processo de destruição, lotes vagos e ruas com
casas que restaram só de um lado do quarteirão desde que a Vale,
segundo ela, iniciou a compra de imóveis, sem ter concluído o
processo e sem oferecer preços justos. "Gostaríamos de estar tendo
uma vida plena, mas essas são imagens corriqueiras da vila", resumiu
ela.
O presidente da associação, José Eduardo dos Passos
Guerra, acrescentou que grande parte das casas está com trincas
devido às constantes detonações de explosivos na mina, às vibrações
da estrada de ferro e ao movimento intenso de caminhões e máquinas
pesadas em função da atividade. "Nossa tranquilidade foi
destruída".
Deputados cobram mais ação do poder público
Para o presidente da comissão, deputado Sávio Souza
Cruz (PMDB), os problemas levantados na audiência demonstram a
importância de um licenciamento ambiental preventivo para
empreedimentos de mineração, que causam forte impacto ambiental e
social. Ele defendeu, ainda, uma participação mais pró-ativa do
poder público, tanto estadual como municipal, na mediação do
conflito na Vila da Paciência.
Diante da insegurança dos moradores quando ao seu
futuro, o presidente da comissão defendeu, ainda, que a Vale
estabeleça um canal de interlocução mais confiável com a comunidade,
de modo a garantir o avanço das negociações.
Os deputados Célio Moreira (PSDB) e Tiago Ulisses
(PV) também endossaram a importância de uma solução que não
prejudique os moradores. Tiago Ulisses acrescentou que a prefeitura,
se necessário, terá inclusive que readequar serviços públicos como o
transporte urbano, diante da mudança dos habitantes da vila.
Dúvida sobre licenciamento ambiental provoca
debate
O presidente da comissão levantou dúvidas quanto ao
processo de licenciamento das atividades próximas à Vila Paciência,
questionando se o licenciamento ambiental não deveria ter sido
preventivo para evitar os danos agora reclamados pelos
moradores.
Segundo expôs o secretário municipal de Meio
Ambiente, Gilberto Antônio Magalhães, a mineração da Vale é uma
atividade antiga na cidade, iniciada em 1942, tendo sido o primeiro
licenciamento ambiental concedido apenas em 2000, com caráter
corretivo, uma vez que as minas já estavam em operação.
Em 2006, frisou o secretário, o Plano Diretor do
município considerou a Vila Paciência como zona de amortecimento, ou
seja, que não mais deveria sofrer processo ou investimento que
causasse sua expansão urbana. Mais recentemente, a Vale solicitou a
ampliação de suas minas, tendo obtido aval no Conselho Municipal de
Meio Ambiente com várias condicionantes, entre elas a realização de
uma nova audiência pública. "Esperamos que essa audiência ocorra
visando aos interesses dos moradores remanescentes".
Empresa garante reavaliar preços de imóveis em até
30 dias
O coordenador de Relações Institucionais da Vale,
Rubens Vargas Filho, anunciou que nos próximos 30 dias estará
concluída uma nova avaliação dos valores dos imóveis da Vila
Paciência. Segundo ele, uma primeira revisão já havia sido feita
anteriormente, diante de reclamações de moradores quanto à
valorização do mercado imobiliário da cidade após a crise econômica
do primeiro semestre.
Quanto ao licenciamento, o representante da empresa
disse que o licenciamento para a ampliação citada no debate ainda
está em estudo, e aventou a possibilidade de se criar uma área de
lazer na região. "Nesse processo é difícil agradar a todos, mas a
empresa tem tomado todos os cuidados devidos com as avaliações
ambientais cobradas pela legislação e cumprindo as normas naquilo
que lhe é pertinente".
Ele informou que a empresa montou uma estrutura
para atender os moradores da Vila Paciência às terças e
quartas-feiras, e tem investido no "diálogo social", tendo realizado
um levantamento de toda a população do bairro. "Estamos tomando
todas as providências para uma negociação amigável".
Secretária defende sensibilidade nas
negociações
A secretária de Ação Social de Itabira, Maria das
Graças Carvalho Lima, disse reconhecer a importância da Vale na
economia da cidade, mas citou que a atividade muitas vezes deixa
"feridas abertas" e defendeu que a empresa tenha mais sensibilidade
na negociação com os moradores. "É preciso perceber que a moradia
não é só uma necessidade básica de abrigo, que às vezes consome a
economia de uma vida inteira para ser conseguida, mas também um
lugar de fortes laços afetivos". Revelando que mora no bairro, no
limite entre as casas já negociadas pela Vale e as ainda habitadas,
a vereadora Martha Mousinho Gomes Barbosa denunciou a situação de
insegurança dos moradores e lembrou que a vila tem em sua
proximidade serviços importantes, como hospitais, escolas, bancos e
igrejas, que não estariam sendo levados em conta nos valores
oferecidos pelos imóveis.
"Não se está valorizando o que se perde, está-se
apenas desarticulando toda uma comunidade em dois ou três anos",
criticou ela, ao defender que a empresa disponibilize assistentes
sociais e psicólogos para auxiliar a comunidade nesse processo de
mudança. "Há famílias do bairro que já estão na quarta geração e
pessoas em depressão que terão que se readaptar".
Advogado quer indenização também por danos morais
Advogado dos moradores e residente na vila, Marcial
Antônio Peixoto de Mello criticou o uso dos termos "negociação" e
"compra de imóveis" para abordar o assunto. "Trata-se de um dever da
empresa de indenização às famílias por danos materiais e morais",
insistiu ele. Condenando a presença de atividades de mineração em
áreas urbanas, ele criticou a ação dos órgãos ambientais e foi
endossado pela filha Sabrina, também advogada, que fez duras
críticas à pouca transparência nos contatos da empresa com a
comunidade e indagou a onde estava a aplicação do direito ambiental
no caso da vila.
"Não é fácil ver nossos pais vivendo nessa situação
aos 70 anos de idade", desabafou ela, revelando que no dia da
mudança de uma vizinha a mãe passou mal, e que são muitos os casos
de depressão e síndrome do pânico no bairro. "Mas o que os moradores
precisam não é de psicólogo, e sim do fim dessa afronta à dignidade
humana, uma situação deprimente causada também pela omissão do poder
público".
Audiência em Rio Pardo - Na reunião, foi aprovado requerimento da deputada Ana Maria
Resende (PSDB) para realização de audiência pública em Rio Pardo de
Minas com o objetivo de debater a exploração de minério de ferro no
Norte do Estado.
Presenças - Deputados
Sávio Souza Cruz (PMDB), presidente; Célio Moreira (PSDB), Tiago
Ulisses (PV) e Ronaldo Magalhães (PSDB). Também participaram da
reunião Ângelo José dos Ramos e José Romão de Andrade, diretores da
Interassociação de Amigos de Bairros de Itabira.
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