Entenda propostas aprovadas da nova Lei Florestal do
Estado
A medida de maior destaque do Projeto de Lei
2.771/08, de autoria do governador, aprovado em definitivo pela
Assembleia Legislativa de Minas Gerais nesta terça-feira (11/8/09),
é a criação de limites e percentuais que reduzem progressivamente,
até 2018, o consumo legal de produtos ou subprodutos originados da
vegetação nativa de Minas Gerais, em especial o carvão vegetal. Por
esse motivo, o projeto é o principal instrumento por meio do qual o
Governo pretende atingir a meta estabelecida do Plano Mineiro de
Desenvolvimento Integrado (PMDI) de elevar a área de Minas coberta
por vegetação nativa dos atuais 33,8% para 40%, até 2023.
O PL 2.771/08 altera a Lei 14.309, de 2002, e
modifica o artigo 7º da Lei Delegada 125, de 2007, entre outras
providências. A Lei 14.309 dispõe sobre as políticas florestal e de
proteção à biodiversidade do Estado. Já a Lei Delegada 125 trata da
estrutura da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável (Semad).
Além da limitação ao consumo de produtos
provenientes da vegetação nativa, o projeto promove outras
alterações importantes na legislação, tais como a transferência,
para a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento
(Seapa), da atribuição de gerenciar as políticas públicas voltadas
para as florestas plantadas com finalidade econômica. Apesar da Lei
Delegada 114, de 2007, determinar que o desenvolvimento e o fomento
florestal são competências da Seapa, essas políticas ainda estão a
cargo da Semad.
Uma inovação do projeto, mesmo em relação à
legislação federal, é a regulamentação do conceito de microbacia
hidrográfica, que serve de base para a recomposição de reserva legal
em áreas não contíguas, mas nunca foi definido legalmente. A reserva
legal, definida na legislação federal, é o percentual de 20% da área
total da propriedade rural que deve ser preservada,
preferencialmente no interior da propriedade. O PL 2.771/08 também
modifica algumas regras referentes à reserva legal, permitindo a
contabilização de áreas de preservação permanente, pomares e outros,
segundo as condições admitidas no Código Florestal Brasileiro.
Além disso, o projeto detalha as condições em que
se reconhecerá e se permitirá o uso e a ocupação humana em áreas de
preservação permanente, em zonas rural ou urbana, a partir da
comprovação de uso continuado anterior a 19 de junho de 2002 até os
dias atuais. Por fim, entre outros pontos, a nova Lei Florestal
determina a criação de um índice oficial para aferir a evolução da
cobertura vegetal do Estado, que servirá de base para o cálculo da
meta estabelecida no PMDI, com relação ao aumento da área de
vegetação nativa no território mineiro.
Veja, a seguir, um detalhamento dos diversos pontos
do projeto, aprovado em definitivo pelo Plenário em 11/8/09. O texto
ainda depende de sanção pelo governador do Estado.
Seapa
O PL 2.771/08 modifica o artigo 7º da Lei 14.309 e
estabelece a formulação e execução das políticas publicas voltadas
para as florestas plantadas com finalidade econômica como uma
atribuição da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (Seapa). Em 17 itens, é detalhada essa atribuição da
Seapa, que será responsável pela captação de investimentos para a
atividade florestal; estímulo à apresentação de projetos de
aproveitamento de crédito de carbono; estímulo à formação de uma
base florestal para o atendimento da demanda por matéria-prima;
estímulo a programas de educação ambiental e de turismo ecológico,
no âmbito da cadeia produtiva florestal, entre outros pontos.
Ocupação consolidada
O projeto modifica o artigo 11 da Lei 14.309, com o
objetivo de detalhar as condições em que será permitida a "ocupação
antrópica consolidada" em áreas de preservação permanente (APPs). Ou
seja, prevê que será respeitada a ocupação humana estabelecida de
forma ininterrupta, anterior a 19 de junho de 2002, em APPs, na
forma de edificações, benfeitorias e atividades agrossilvipastoris,
inclusive na forma de aplicação do regime de pousio. A comprovação
da ocupação consolidada será realizada por meio de laudo técnico do
Instituto Estadual de Florestas (IEF), Emater ou profissional
habilitado. Essa ocupação não poderá ter sua área expandida e deverá
atender recomendações de medidas mitigadoras e de recuperação de
áreas degradadas feitas pelo IEF. A legislação federal não prevê
hipóteses de ocupação humana em APPs.
Segundo a proposta, as áreas consolidadas em
margens de rios, nascentes, represas ou veredas serão convertidas
progressivamente em vegetação nativa. No caso das veredas, formação
de solo e vegetação característica do cerrado, fica proibido o uso
do fogo e a criação de gado, e determina-se a manutenção de
corredores ecológicos. Nas encostas e topos de morro, a recomendação
é que o uso consolidado com culturas agrícolas anuais ou pastagens
seja substituído por cultivos de espécies arbustivas, mesmo aquelas
não nativas, tais como o café ou arbóreas.
Área urbana
Por meio de emenda, foi incluída no texto a
permissão para ocupação continuada de APPs em zonas urbanas, desde
que tenha ocorrido até 19 de junho de 2002 e constem em projetos de
expansão urbana ou Plano Diretor aprovados pelo município. A medida
atende situações como a do município de Itaúna (Centro-Oeste de
Minas), que tem avenidas inteiras edificadas há décadas em áreas de
preservação permanente.
Reforma agrária
Também por meio de emenda, foram incluídos os
projetos de assentamentos de reforma agrária, desenvolvimento
agrário e colonização, devidamente regularizados, na lista de
iniciativas de interesse social que justificariam a supressão de
vegetação nativa em área de preservação permanente. Esse tipo de
intervenção, segundo a Lei 14.309, só poderá ser autorizada em caso
de utilidade pública ou de interesse social, devidamente
caracterizado e motivado em procedimento administrativo próprio,
quando não existir alternativa técnica ou outro local para o
empreendimento proposto. A emenda surgiu da necessidade de
regularização da situação ambiental de assentados em perímetros de
irrigação, como o Jaíba, ou assentamentos de reforma agrária. A
emenda altera o inciso II do parágrafo 3º do artigo 13 da Lei
14.309.
Indústria e energia
O PL 2.771/08 modifica o artigo 14 da Lei 14.309,
explicitando que nas áreas de empreendimentos industriais, em
especial os destinados à geração, transmissão e distribuição de
energia e aos reservatórios de água que tenham entre seus objetivos
o abastecimento público não é se pode exigir a constituição de
reserva legal. A legislação federal já exclui os empreendimentos
industriais desta exigência, mas alguns órgãos ambientais vinham
exigindo a constituição de reserva como compensação pela área
inundada por barragens hidrelétricas.
Reserva legal
O projeto explica de que forma poderá ser computada
área de vegetação nativa em APPs para o cálculo da reserva legal de
20% da propriedade rural. Com isso, modifica-se o artigo 15 da Lei
14.309. Outra determinação é que, em propriedades rurais com área
igual ou superior a 50 hectares, localizadas no Polígono das Secas,
e igual ou inferior a 30 hectares, nas demais regiões, poderão ser
computados como reserva legal os pomares, arvores ornamentais ou
para utilização industrial, ou sistemas agroflorestais.
Esses aspectos já estão previstos na legislação,
porém o PL 2.771/08 reforça as restrições, alinhando a legislação
estadual com a federal.
Microbacia
Por meio de emenda, foi alterado o artigo 17 da Lei
14.309, de forma a definir que microbacia hidrográfica é a área que
se projeta sobre terra drenada por cursos d'água de 3ª e 4ª ordens
ou por curso d'água de qualquer ordem com área drenada inferior a
mil quilômetros quadrados. Para tanto, a emenda classifica os cursos
d'água em quatro ordens e, no parágrafo 7º, explica de que forma
deverá acontecer a compensação de reserva legal, caso seja
impossível ela acontecer dentro da mesma microbacia, conforme
recomenda a Lei 14.309.
Reserva reflorestada
A recomposição de reserva legal poderá ser feita
por meio de reflorestamento com espécie de interesse econômico, tais
como o eucalipto ou o pinus, desde que essa espécie ocupe no máximo
50% da área recomposta. O plantio deverá ser realizado em conjunto
com espécies nativas, e a exploração se limitará a um ciclo de
produção. A regra vale para propriedades de até 30 hectares (ou 50
hectares dentro do Polígono das Secas). O parágrafo único prevê que,
em propriedades maiores que essas, o limite para uso de espécie de
interesse econômico se limitará a 40% da área recomposta. A intenção
é facilitar o financiamento da recomposição de reserva legal dentro
das propriedades rurais.
Pequenas barragens
Por meio de emenda, foi alterado o artigo 20 da Lei
14.309, de forma a estabelecer um prazo de 30 dias para que o IEF se
manifeste sobre a construção de pequenas barragens de retenção de
água para controle de erosão, melhoria da infiltração de água e
fornecimento de água a animais. Esse prazo será seguido por mais 30
dias para manifestação do diretor-geral do IEF. O objetivo é acabar
com a demora no licenciamento das pequenas barragens.
Áreas especiais
O Conselho de Política Ambiental (Copam) definirá
áreas de importância biológica especial e as de importância
biológica extrema, que serão prioritárias para a criação de unidades
de conservação e proteção à biodiversidade. Nessas áreas, só será
permitida a supressão de vegetação nativa para implantação de
projetos de interesse social ou utilidade pública.
Manejo florestal
Passa a ser permitida a adoção, no cerrado, do
regime de manejo florestal em sistema de exploração em faixas
alternadas ou por talhões alternados.
Produtos florestais
Fica permitida a livre colheita e a comercialização
de produtos originados de plantações florestais, sem a necessidade
de licenciamento. O transporte desses produtos, no entanto, deverá
ser feito com nota fiscal que informe a geração da taxa florestal,
no caso de matéria prima "in natura". No caso do carvão vegetal, a
exploração e comercialização estarão condicionados à comunicação
prévia ao IEF que informe o volume da matéria-prima e a localização
da floresta que deu oriegem ao produto. Também deverá ser informada
a carvoaria onde a madeira foi carbonizada, no caso de empresas, com
anotação de responsabilidade técnica. O transporte do carvão
dependerá de nota fiscal específica.
Rastreamento eletrônico
O projeto permite a contratação para execução
indireta do rastreamento eletrônico via satélite do transporte de
carvão vegetal. Ela poderá ser feita por meio de concessão pelo
poder público ou outras modalidades previstas em lei. Os dados
poderão ser usados na penalização por infrações ambientais. O custo
do serviço será incluído no cálculo da taxa florestal. O
monitoramento eletrônico, segundo o projeto, só poderá ser utilizado
como instrumento de fiscalização ambiental 360 dias após a
publicação da lei correspondente a este projeto.
Registro
Torna-se obrigatório o registro e renovação anual
do cadastro as pessoas físicas e jurídicas que explorem, produzam,
utilizem, consumam, transformem, industrializem ou comercializem
produtos da flora nativa e plantada. Também deverá se registrar
aquele que transporte o carvão vegetal em Minas, mesmo que o produto
seja proveniente de outro Estado. O registro estará disponível na
internet. Estarão isentos da exigência os apicultores; aqueles que
usem os produtos de forma doméstica ou artesanal; os que utilizem os
produtos já processados; ou o produtor rural que produza carvão
vegetal proveniente de área recentemente aberta à exploração
agropecuária, de forma legal, no prazo máximo de 180 dias.
Proteção à mata nativa
É a principal medida do projeto. São estabelecidos
limites para o consumo de madeira ou carvão proveniente de mata
nativa do Estado. O limite se aplica aqueles que consumam anualmente
mais de 8 mil metros cúbicos de madeira, 12 mil estéreos de lenha ou
4 mil metros de carvão. Entre 2009 e 2013, os produtos nativos
poderão representar, no máximo, 15% do consumo anual. De 2014 a
2017, o máximo será 10%. De 2018 em diante, 5%. O projeto também
obriga esses consumidores a fazerem a reposição da madeira nativa
consumida, segundo diversas opções listadas, que vão desde a
formação de florestas próprias até o financiamento de projetos
ambientais ou treinamento de servidores de órgãos ambientais.
A reposição prevista em lei será equivalente ao
volume consumido apenas se este for de até 5% do volume total da
matéria-prima utilizada anualmente. Entre 5,1% e 12%, o dobro do
volume consumido deverá ser reposto. Acima de 12%, o triplo. Estão
isentos da reposição apenas aqueles que utilizarem lenha para
consumo doméstico ou madeira serrada ou aparelhada, desde que as
obrigações tenham sido cumpridas pelos fornecedores destes
produtos.
O consumo excedente aos percentuais previstos será
inscrito como débito em conta corrente, a ser quitado no prazo
máximo de dois anos. Enquanto não pagar a dívida, o consumidor não
poderá transportar o mesmo tipo de matéria-prima. A forma de cálculo
do débito também é especificada no projeto.
Plantio
Aqueles que consumam mais de 8 mil metros cúbicos
de madeira, 12 mil estéreos de lenha ou 4 mil metros de carvão,
anualmente, deverão cumprir um cronograma anual de plantio florestal
para que, no prazo máximo de nove anos agrícolas a partir de
2010-2011, 95% de seu consumo seja proveniente de florestas
plantadas. Caso não cumpra o cronograma anual de plantio, o
consumidor de produto florestal deverá reduzir sua produção, de
forma proporcional à quantidade de matéria-prima que deixará de ser
produzida. Entre as formas de plantio que serão aceitas estão aquele
feito em terras próprias ou de terceiros, os programas de fomento
florestal com produção vinculada ou não ao consumidor e, ainda, a
compra direta no mercado.
Também se determina que o Governo do Estado
estimulará a utilização do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo do
Protocolo de Quioto, como forma de estimular o plantio de florestas
pelas empresas consumidoras de matéria-prima florestal. Esse
mecanismo permite que o responsável pelo plantio venda créditos de
carbono referentes ao volume de mata nativa que deixará de ser
consumido.
Aplicação de recursos
O PL 2.771/08 estipula a forma de aplicação dos
recursos referentes à reposição florestal, que tenham sido
depositados em conta especial do IEF por empresas consumidoras de
produtos provenientes da mata nativa. Metade deverá ser usada em
programas de recomposição florestal, na implantação ou manutenção de
unidades de conservação. A outra metade será destinada a programas
governamentais de reposição de estoque de madeira destinados a
produtores rurais e aprimoramento técnico de servidores de órgãos
ambientais. Serão priorizados projetos que utilizem espécies
nativas.
Alienação de imóvel
O consumidor de produto florestal em débito pela
utilização excessiva de matéria-prima nativa poderá transferir
imóvel ao Estado para quitar sua dívida. Esse imóvel, no entanto,
deve estar dentro de uma unidade de conservação com pendências de
regularização fundiária. Ou seja, o devedor poderá adquirir o
terreno para transferi-lo ao Estado. A transferência deverá ser
aprovada mediante relatório técnico.
Sisema
Além da alteração do nome, a estrutura do Sistema
Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) é
regulamentada no PL 2.771/08. Segundo o modelo adotado, os órgãos
municipais de meio ambiente e recursos hídricos são excluídos do
sistema, apesar de ser prevista sua articulação com as ações do
Sisema. Serão seus integrantes: a Secretaria de Estado de Meio
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), o Conselho Estadual
de Política Ambiental (Copam), o Conselho Estadual de Recursos
Hídricos (Cerh), a Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam), O
Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), o Instituto Estadual
de Florestas (IEF), a Polícia Ambiental, os núcleos de gestão
ambiental das secretarias de Estado que integram o Copam, os comitês
e as agências de bacias.
Índice de reflorestamento
O projeto prevê que o Copam aprovará índice para
identificar a evolução da cobertura vegetal natural do Estado, que
deverá refletir a relação entre as áreas recuperadas com vegetação
nativa e aquelas nas quais esta foi suprimida. Também será fixada
uma meta para este índice, que seja compatível com a prevista no
Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI) em vigor. O PMDI
propõe que seja aumentada a área de Minas coberta por vegetação
nativa, dos atuais 33,6% para 40%, até 2023.
Bolsa Verde
Ainda por emenda, o PL 2.771/08 determina que 50%
dos recursos provenientes de multas administrativas por infração à
Lei 14.309, de 2002, serão utilizados no financiamento da Bolsa
Verde, incentivo financeiro a proprietários e posseiros rurais
previsto na Lei 17.727, de 2008. O incentivo se destina àqueles que
atuarem na identificação, recuperação e preservação de áreas
necessárias à proteção das formações ciliares e à recarga de
aquíferos; ou de áreas necessárias à proteção da biodiversidade.
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