Assentamentos da reforma agrária carecem de
infraestrutura
Os assentamentos em Minas Gerais, assim como em
outros Estados do Brasil, carecem de completa infraestrutura: não há
moradias, escolas nem crédito agrícola. Em muitos deles, os
assentados sequer têm comida para prover seu sustento. Mas há saída,
e esta deve vir em forma de parcerias entre os diversos órgãos
envolvidos para agilização dos processos e superação dos gargalos da
reforma agrária. As conclusões foram feitas na audiência pública
realizada nesta terça-feira (30/6/09) pela Comissão de Política
Agropecuária e Agroindustrial da Assembleia Legislativa de Minas
Gerais.
A reunião para discutir a situação dos
assentamentos mineiros foi solicitada pelos deputados Antônio Carlos
Arantes (PSC), Vanderlei Jangrossi (PP), Padre João (PT) e Getúlio
Neiva (PMDB), e reuniu dirigentes de órgãos ligados à reforma
agrária e aos movimentos sociais. A principal crítica foi com
relação ao descompasso entre o momento da desapropriação e a
viabilização de recursos para o assentamento. Mas muitos
reconheceram que em alguns assentamentos as condições já são
melhores, apesar de terem longo tempo de existência. Um exemplo é o
Projeto de Assentamento (PA) Betinho, em Bocaiúva, com 766 famílias
assentadas em 24 mil hectares de terras consideradas muito
produtivas.
Segundo o representante do PA Betinho, José Cosme
da Silva, apesar dos avanços conseguidos, como um convênio firmado
com o Instituto de Terras de Minas Gerais (Iter) para a construção
de 300 moradias, ainda é necessário muito apoio técnico e mais
agilidade na liberação dos recursos do Programa Nacional de
Agricultura Familiar (Pronaf), para que os assentados não percam o
calendário agrícola. O PA Betinho produz 5 mil litros de
leite/dia.
Outras críticas foram feitas pelo coordenador do
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Ênio Bohnenberg, para
quem o que inviabiliza a reforma agrária no País é o agronegócio.
Outros problemas, segundo ele, são a construção de barragens e o
avanço das plantações de eucalipto, que desalojam os pequenos
produtores. Para Bohnenberg, é preciso que a Assembleia tome medidas
para reaver as terras devolutas que estão com os contratos
vencendo.
"Com todos os problemas, os assentamentos no País
podem ser considerados modelos: todas as crianças têm escola, todos
têm emprego o ano inteiro, há casas, comida e segurança, pelo menos
no assentamento Franco Duarte, onde vivo", garantiu Bohnenberg. Já o
assessor de meio ambiente da Federação dos Trabalhadores em
Agricultura de Minas Gerais (Fetaemg), Eduardo Arantes do
Nascimento, propôs que a implantação dos assentamentos não
ultrapassasse os três anos e que os deputados solicitem à Emater o
relatório trimestral feito da empresa sobre a produção nos
assentamentos.
Números indicam avanços tímidos
O delegado do Ministério do Desenvolvimento
Agrário, Rogério Correia, disse que o problema da reforma agrária é
de modelo. "O Brasil fez a opção pelo agronegócio. Para se ter uma
idéia, 1,8% dos grandes proprietários detêm 40% das terras do País.
Enquanto isso, a agricultura familiar é responsável por 70% dos
alimentos produzidos e 77% dos empregos no campo", comentou. Ele
lembrou a importância das políticas públicas para a pequena
agricultura, como o Pronaf, os convênios com a Emater para
assistência técnica e a comercialização dos alimentos produzidos nos
assentamentos pela Conab.
Já o superintendente regional do Instituto Nacional
de Reforma Agrária (Incra), Gilson de Souza, reconheceu que a
reforma é tímida, apesar dos avanços. Em sua análise, um dos
principais complicadores é a falta de infraestrutura do órgão em
Minas. "Quando foi implantado, há 37 anos, o Incra tinha 250
servidores para um único assentamento. Hoje temos 14.500 assentados,
7 mil acampados e 244 assentamentos, mas somente 142
servidores".
Ele e o secretário de Estado Extraordinário para
Assuntos de Reforma Agrária, Manoel Costa, enfatizaram a necessidade
de parcerias mais efetivas entre governos Federal e Estadual e entre
os diversos órgãos e movimentos sociais. Manoel Costa sugeriu que a
Assembleia crie um grupo de trabalho para estudar metodologias e
propor sugestões.
Apesar de reconhecer que a reforma agrária ainda
precisa avançar muito, Rogério Correa disse que o governo Lula já
assentou 500 mil famílias no Brasil. "Isso é mais do que os 16 anos
de governos anteriores. Até o final do ano serão mais 9.500 famílias
assentadas", completou.
Deputados apresentam sugestões
O deputado Carlos Gomes (PT) lembrou que a dívida
do poder público com os pobres, sobretudo os da zona rural, é
enorme. "O Brasil foi um dos últimos países a acabar com a
escravidão, não é possível que aconteça o mesmo com a execução da
reforma agrária. A Assembleia deve somar esforços com o Ministério
do Desenvolvimento Agrário, o Incra e os assentados".
Carlos Pimenta (PDT) lembrou que soluções para os
assentamentos dependem muito de programas específicos. "Não se pode
atribuir os problemas da reforma a outras áreas, como o setor
agropecuário". Para ele, não basta apenas destinar a terra aos
produtores, é preciso que as condições para seu uso também sejam
garantidas, como o fornecimento da energia elétrica e água.
Para o deputado Adelmo Carneiro Leão (PT),
ex-superintendente do Incra em Minas, o órgão precisa ser melhorar
aparelhado no Estado. Ele disse que é preciso maior interação entre
todos os envolvidos e destacou a falta de moradias nos assentamentos
como um dos piores entraves no sucesso dos projetos. "É preciso
compatibilizar a entrega do lote à família com a moradia, e isso
pode ser viabilizado pelo PAC", afirmou.
Antônio Carlos Arantes disse que a agricultura
brasileira está em crise como um todo. Para ele, o endividamento
pega também o médio e o grande produtor, não só o pequeno. Mas
reconhece que o grande negócio está asfixiando a agricultura
familiar. Já Vanderlei Jangrossi enfatizou as limitações da
legislação e lembrou que a Assembleia vem cumprindo seu papel, ao
promover audiências como a dos assentamentos.
Requerimentos - Foram aprovados os seguintes
requerimentos: do deputado Antônio Carlos Arantes, propondo uma
audiência pública para discutir o endividamento dos produtores de
milho do Sul e Centro-Oeste do Estado; do deputado Padre João,
solicitando à Universidade. Federal de Viçosa que implemente, em seu
campus
em Rio Paranaíba, o curso de Direito com ênfase em Direito Agrário;
e solicitando à delegacia do Ministério de Desenvolvimento Agrário
no Estado a formação de um fórum permanente para acompanhar os
assentamentos da reforma agrária; do deputado Carlos Pimenta, de
audiência pública para discutir o maior programa de assentamentos do
Estado, o PA Betinho, em Bocaiúva, e propor soluções para as
dificuldades que enfrentam as famílias ali assentadas.
Presenças - Deputados
Vanderlei Jangrossi (PP), presidente; Antônio Carlos Arantes (PSC),
vice; Carlos Gomes (PT), Carlos Pimenta (PDT) Adelmo Carneiro Leão
(PT) e Padre João (PT). Também participaram da reunião o
representante da Ruralminas, Antônio Claret Maia; e o assessor
jurídico da Faemg, Breno Andrade.
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