Funed diz que perda de licitação reduziu ganhos de
servidores
O presidente da Fundação Ezequiel Dias (Funed),
Carlos Alberto Pereira Gomes, admitiu nessa quarta-feira (24/6/09)
que o salário pago aos servidores do órgão "não é adequado" e que
isso vem gerando evasão nos quadros, apesar de a maioria dos
servidores ser de jovens aprovados em concurso realizado em 2006.
Ele justificou, contudo, que a questão salarial foge à sua alçada,
devendo ser tratada no âmbito das secretarias de Estado da Fazenda e
do Planejamento.
Em audiência pública realizada na Comissão de
Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais para
debater a situação salarial na Funed, órgão do Estado responsável
pela produção de medicamentos, Carlos Alberto reconheceu que tem
havido queda também no valor de gratificações pagas à categoria e
argumentou que isso se deve à queda de receita da fundação, que,
segundo ele, perdeu licitação do Estado em função da concorrência de
preços.
"No jogo comercial há laboratórios que colocam
preço muito abaixo para nos tirar do mercado e distribuidoras
ofertando itens mais baratos do que os próprios fabricantes. Nossa
missão é ser melhor em qualidade do que o mercado e ter preço mais
baixo", disse o presidente da Funed.
A reunião foi feita a pedido do deputado Padre João
(PT) para tratar de desentendimentos e dificuldades de negociações
que estariam ocorrendo entre a direção da fundação e os servidores.
Segundo o sindicato da categoria, do final do ano para cá o valor
das gratificações caiu 40% e servidores de nível fundamental têm
piso inicial abaixo do salário mínimo. Os servidores reivindicam,
entre outros, 40% de reposição no vencimento base e revisão de plano
de carreira.
Perda de licitação -
Números apresentados pelo presidente da Funed indicam queda de pelo
menos 20% no valor de gratificações recentes pagas aos servidores.
Ele argumentou que as gratificações, sendo pagas com recursos
próprios, são variáveis, levando em conta a despesa e a receita.
Segundo Carlos Alberto, em 2009 a receita caiu, sobretudo porque a
Funed perdeu recente licitação da Secretaria de Estado de Saúde para
a compra de medicamentos em função de preços que teriam sido
rebaixados por concorrentes do mercado.
Segundo ele, o valor das gratificações subiu no mês
passado, mas deve ser menor novamente nesse mês de junho, porém, com
tendência de elevação ao longo do ano diante de perspectivas de
incremento da receita com o aumento da produção. A produção de todo
o ano passado foi de 820 milhões de unidades de medicamento,
apontando para um crescimento, já tendo chegado a 600 milhões de
unidades no meio desse ano, acrescentou.
Quanto a outros itens reclamados pelos servidores,
que lotaram o Teatro da Assembleia durante a audiência, o presidente
da fundação negou o corte de ponto de servidores ausentes do
trabalho em função de assembleias da categoria ou de presença em
reuniões de comissão de negociação. Ele disse que essa questão
também faz parte do processo de negociação. Negou também
transferências arbitrárias de servidores.
Modelo de concorrência preocupa deputados
O presidente da comissão, Délio Malheiros, destacou
que a Funed tem importância reconhecida internacionalmente e que sua
direção e seus servidores merecem respeito por essa conquista. Ele
propôs aguardar o resultado de negociação que estaria agendada com
os servidores na Seplag nesta sexta-feira (26), e que fosse criado
na comissão um fórum permanente para acompanhar esse processo.
O deputado Padre João (PT) criticou a ausência do
secretário de Estado de Saúde no debate e disse ser importante
resgatar a dimensão histórica da Funed, criada há 102 anos,
valorizando os servidores e criando condições para que ela cresça.
Ele criticou o corte de compra de medicamentos da Funed pela
Secretaria de Saúde, o que no seu entendimento estaria indicando
favorecimento da iniciativa privada em vez de priorizar os
medicamentos produzidos pelo órgão do Estado.
Para o deputado Adelmo Carneiro Leão (PT), essa
situação mostra que a lógica do mercado deve ser vista com cuidado
quando se trata de saúde pública, inclusive nas licitações. Ele
disse que existem cartéis de matérias-primas para produção de
medicamentos que põem em risco um patrimônio público como a Funed e
a soberania brasileira no segmento.
Comentando que possíveis desentendimentos entre a
direção da Funed e os servidores são impasses naturais no mundo do
trabalho, o deputado Domingos Sávio (PSDB) defendeu, com a
interlocução dos deputados, a busca de uma solução que valorize a
carreira dos servidores e garanta os avanços necessários ao
crescimento da Funed. O deputado Ivair Nogueira (PMDB) acrescentou
que, apesar da crise mundial, é necessário buscar soluções para
embates dessa natureza, buscando o entendimento quanto a perdas
salariais.
Fraude - Durante a
audiência o presidente da comissão criticou a falta de providências
quanto a denúncias levadas ao conhecimento do Ministério Público e
da Anvisa, há dois anos, de suposta fraude apontada por uma
psiquiatra envolvendo laboratórios de cerca de 40 medicamentos
genéricos de uso psiquiátrico. Segundo a profissional, vários
remédios não estariam tendo efeito no tratamento de pacientes e
estariam em desacordo com princípios ativos e outros insumos citados
nas bulas. Délio Malheiros pontuou que a Funed, pelo seu
reconhecimento, poderia ter feito testes para comprovar a fraude e
poderia estar produzindo medicamentos de mais qualidade e a preços
mais baixos se não fosse a omissão da Anvisa, a quem caberia a
solicitação das análises.
Baixos salários afastam 22% dos concursados, diz
servidor
Segundo representantes dos servidores da fundação,
o salário base de técnico em química da Funed está em R$ 680,00,
enquanto o piso inicial em instituições como a UFMG estaria acima de
R$1.300,00. A situação, apontaram, se agrava no Auxiliar de Saúde de
Nível 1 da Funed, que ganharia apenas R$ 377,00.
O presidente do Sindicato Único dos Trabalhadores
da Saúde no Estado (SindSaúde), Renato Barros, lembrou que há anos a
categoria luta por um salário referência, em lugar de uma
remuneração oscilante. O técnico Fernando Ramos frisou que essa
situação salarial da Funed fez com que 22% dos aprovados em concurso
de 2006 não tomassem posse ou entrassem e saíssem pouco depois.
Segundo ele, as 55 vagas abertas para o cargo de técnico em Química
ainda não foram preenchidas, mesmo tendo sido chamados 90
classificados.
Os servidores denunciaram ainda que a Funed estaria
descartando matérias-primas vencidas sem o conhecimento da Anvisa e
que um novo laboratório em construção seria usado por meio de PPP
(Parceria Público Privada) que estaria sendo planejada de forma
pouco transparente.
Em resposta, o presidente da Funed informou ter
solicitado à Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico um
estudo sobre uma possível PPP para a produção, entre outros, de
proteínas terapêuticas, de forma a garantir transferência de
tecnologia num segmento que segundo ele é tendência mundial. A
parceria, disse, daria mais dinamismo a avanços necessários à
Funed.
Já o descarte de insumos vencidos, segundo ele,
ocorreu dentro das normas, com incineração e envio obrigatório de
relatório à Anvisa, e deveu-se ao fechamento de uma fábrica de
líquidos da fundação por exigência da própria Anvisa, diante da
necessidade de reformas.
Presenças - Deputados Délio
Malheiros (PV), presidente; Ivair Nogueira (PMDB), vice; Domingos
Sávio (PSDB), Elmiro Nascimento (DEM), Padre João (PT) e Adelmo
Carneiro Leão (PT). Participaram ainda os servidores André Morete de
Oliveira e Bruno Félix Houti, técnicos de Saúde e Tecnologia Nível 1
da Funed.
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