Lei da alimentação escolar abre mercado para agricultores
familiares
A publicação da Lei Federal 11.947, que trata da
aquisição de produtos para a alimentação escolar, foi comemorada
pelos participantes da reunião conjunta das Comissões de Educação,
Ciência, Tecnologia e Informática e de Política Agropecuária e
Agroindustrial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, nesta
quarta-feira (17/6/09). Quando a reunião foi solicitada pelo
deputado Padre João (PT), o objetivo era debater a Medida Provisória
455, de 2009, que deu origem à lei federal, sancionada nesta terça
(16) pelo presidente da República em exercício, José Alencar.
O autor do requerimento ressaltou a importância da
lei, sobretudo para os estudantes de ensino médio, que foram
incluídos no universo dos alunos atendidos com a alimentação
escolar, e para os agricultores familiares. Pela nova lei, pelo
menos 30% dos produtos adquiridos para alimentar os estudantes com
recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)
deve vir da agricultura familiar. A compra também fica dispensada de
licitação, desde que os preços sejam compatíveis com os do mercado
local e os produtos atendam normas de qualidade. "Um dos grandes
gargalos da agricultura familiar sempre foi a comercialização",
afirmou o deputado. Ele acrescentou que o Programa de Aquisição de
Alimentos (PAA) do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à
Fome (MDS) foi um avanço para os pequenos produtores e, agora, a
garantia de mercado para a agricultura familiar é incrementada pela
lei federal.
Agricultura familiar pode receber até R$ 1,8
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Segundo cálculos apresentados pelo coordenador
geral do PAA, Marcelo Resende, com a expansão do mercado consumidor
proposta pela lei, a agricultura familiar pode chegar a receber R$
1,8 bilhão. Ele ressaltou que os 30% de que tratam a lei são um
referencial mínimo. "Em algumas regiões, a agricultura familiar tem
condições de fornecer até 100% da alimentação escolar", acredita.
Ele explicou como será a operacionalização da lei e informou que um
grupo já estuda, desde o início do ano, a regulamentação da norma.
De acordo com o representante do MDS na reunião, a regulamentação
deve ser publicada nos próximos dias.
Marcelo Resende afirmou que a Lei 11.947 foi
pensada para ser de simples execução. Ele orientou o público da
audiência, formado por representantes dos Executivos e Legislativos
municipais e de órgãos e entidades ligados à educação e à
agricultura, que o primeiro passo será a elaboração do cardápio da
alimentação escolar. Os agricultores familiares agora devem ser
incluídos nesse planejamento que, anteriormente, envolvia os
nutricionistas e as pessoas encarregadas da alimentação escolar.
Em seguida, o prefeito deve fazer chamada pública
com o preço de referência de cada produto. Para isso, segundo
Resende, um técnico do quadro da prefeitura deverá fazer a pesquisa
de preço dos alimentos no mercado varejista local. Por último, os
agricultores apresentam suas propostas e a prefeitura adquire as
mercadorias com menor preço.
Luta antiga - A pressão
dos movimentos sociais para a aprovação da lei foi destacada pelo
presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado
de Minas Gerais (Fetaemg), Vilson Luiz da Silva. Ele destacou que a
agricultura familiar é responsável pela produção de 70% dos
alimentos consumidos pelos brasileiros, por 77% da mão-de-obra rural
e 10% do PIB brasileiro - percentual idêntico ao da indústria
automobilística. No entanto, segundo o presidente da Fetaemg, a
agricultura familiar começou a receber atenção muito recentemente.
"O Pronaf é de 1995", lembrou. Na opinião dele, os programas de
incentivo que existem hoje poderiam ter evitado o êxodo rural. Em
Minas, segundo pesquisa da Emater apresentada pelo superintendente
de Segurança Alimentar e Apoio à Agricultura Familiar, Lucas
Scarascia, realizada em 1.153 estabelecimentos rurais (70% do total
do Estado), 72% são de agricultura familiar, 17% de associações e 1%
de cooperativas.
Para o delegado do Ministério do Desenvolvimento
Agrário (MDA), Rogério Correia, a política do Governo Federal
voltada para os pequenos agricultores representa o reconhecimento da
importância desse segmento para a economia brasileira. Ele informou
que, na primeira quinzena de julho, o presidente Lula vai anunciar
outro Plano Safra, com recursos de R$ 15 bilhões, que deve
contemplar também assistência técnica e projetos de agregação de
valor.
Mercado deve se expandir mais com organização dos
produtores
Quanto ao fornecimento dos produtos para a
alimentação escolar, Correia acredita que Minas Gerais tem condições
de ultrapassar os 30% estabelecidos na lei ainda este ano. De acordo
com ele, com a inclusão dos estudantes do ensino médio na
alimentação escolar, os recursos do Governo Federal para essa
finalidade subirão de R$ 1,4 bilhão, em 2008, para R$ 2 bilhões
estimados para 2009. Para a agricultura familiar de Minas estão
previstos para este ano, segundo o representante do MDA, R$ 196
milhões. Com o fornecimento de 30% dos produtos para as escolas, os
agricultores poderão receber mais R$ 60 milhões. Rogério Correia
também acredita que o mercado da agricultura familiar não vai se
restringir apenas às escolas. A organização dos produtores e a
estruturação das associações, na opinião dele, vão possibilitar a
inserção dos agricultores no chamado Fair Trade (Mercado
Justo) e também no segmento de agricultura orgânica, por
exemplo.
A necessidade de organização dos produtores foi
enfatizada por vários participantes da audiência, entre eles o
subsecretário de Estado de Educação, Gilberto José Rezende dos
Santos. Ele salientou que a lei traz impedimentos para a aquisição
dos alimentos produzidos por estabelecimentos familiares, como
impossibilidade de emissão de documento fiscal, de fornecimento
regular e constante dos gêneros alimentícios e não-atendimento às
exigências sanitárias e de higiene. Contudo, segundo ele, os
agricultores precisam estar preparados para atendê-las. O
subsecretário disse ainda que o Governo do Estado está investindo na
recuperação das cozinhas e refeitórios das escolas e nos
equipamentos para armazenamento adequado dos alimentos.
Em relação ao controle sanitário dos produtos, o
coordenador do Centro Colaborador da Alimentação e Nutrição Escolar
de Minas Gerais, Élido Bonomo, defendeu um novo modelo, mais
adequado à agricultura familiar. Isso porque, segundo ele, o
critério criado para grandes empresas alimentícias é adotado para
todas as inspeções. O nutricionista afirmou que a nova lei obriga a
se pensar em um novo padrão de produção e de consumo quanto à
nutrição e à qualidade da alimentação, e também ao modelo de
desenvolvimento local. Bonomo também destacou que o resgate de
hábitos e consumos alimentares saudáveis e a preocupação com o valor
nutritivo dos alimentos permitem um melhor aprendizado pelas
crianças.
A deputada Glaúcia Brandão (PPS), que presidiu a
reunião, salientou a importância de discussão da Lei 11.947 para
garantir sua efetiva aplicação. Ela manifestou preocupação com a
orientação dos produtores e dos municípios para a aplicação da lei e
sugeriu a realização de debates sobre o tema nas regiões do Estado.
A deputada também disse que irá apresentar requerimento solicitando
que o Governo Federal realize campanhas e elabore materiais de
divulgação da lei.
Debates - Na fase de
debates, os participantes da audiência apresentaram suas dúvidas e
preocupações quanto às linhas de crédito e os preços das mercadorias
para a agricultura familiar; sobre a conscientização das cozinheiras
das escolas; e sobre as dificuldades das cidades com poucos e
desorganizados produtores se adequarem à lei.
Presenças - Deputada
Gláucia Brandão (PPS), que presidiu a reunião; e deputado Padre João
(PT). Também participou da reunião o diretor da Coordenação de
Políticas Sociais da Fetraf, Celso Afonso de Moraes.
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