Clínicas odontológicas populares podem oferecer risco à
saúde
Clínicas odontológicas ditas "populares", que
chegam a cobrar R$ 10 por uma extração de dente, foram alvo de
críticas durante audiência pública da Comissão de Saúde da
Assembleia Legislativa de Minas Gerais, realizada na manhã desta
quarta-feira (3/6/09). Deputados e representantes do setor
discutiram o que fazer diante do risco que elas representam para a
saúde pública. A reunião foi requerida pelo deputado Délio Malheiros
(PV).
Uma das constatações foi a dificuldade da
fiscalização. A Vigilância Sanitária estadual conta com 150 fiscais
para atuar nos mais de 800 municípios mineiros. Porém, além de
visitar essas clínicas, o órgão precisa fazer inspeções em dezenas
de outros tipos de estabelecimentos, como frigoríficos, hospitais,
clubes, fábricas de alimentos e outros. Na Vigilância Sanitária de
Belo Horizonte, são 170 profissionais e ainda assim o número é
insuficiente, diz a gerente do órgão, Mara Machado Guimarães
Corradi.
Segundo o deputado Délio Malheiros, menos de 10%
das clínicas odontológicas sofrem algum tipo de fiscalização. Isso
representa um risco enorme para a população, que fica vulnerável às
condições sanitárias desses estabelecimentos. Ele ressaltou que não
é contra a existência dessas clínicas, mas considera importante que
os serviços sejam prestados de forma segura.
Uma proposta para amenizar o problema foi
apresentada pela gerente de Vigilância Sanitária estadual, Adriana
Cacciari Zapaterra. Ela sugeriu a municipalização do serviço, mas
isso depende da vontade política dos prefeitos. Ao admitir que o
órgão não é capaz de oferecer a devida cobertura nos
estabelecimentos, ela propôs também que o poder público atue na
prevenção das doenças bucais. Ela disse que a Secretaria de Estado
de Saúde pretende incluir a assistência odontológica no Programa de
Saúde da Família (PSF). "Se não investirmos em prevenção, não haverá
como controlar o problema", disse ela.
Usuários e profissionais são vítimas
A maior vítima dessas clínicas populares é
exatamente a população de baixa renda, afirmou o presidente do
Conselho Regional de Odontologia (CRO-MG), Arnaldo de Almeida
Garrocho. O profissional recém-formado também foi classificado como
vítima nesse contexto. Segundo o deputado Carlos Pimenta (PDT),
enquanto no interior um médico chega a receber R$ 14 mil por mês, o
salário de um dentista que presta serviço à prefeitura é de R$
1.200. Ele pediu maior valorização dos profissionais de
odontologia.
Para o diretor do Sindicato dos Odontologistas de
Minas Gerais, Edwin Fialho Despinoy, esses dentistas na maioria das
vezes não têm como montar um consultório próprio, orçado em mais de
R$ 50 mil, nem condições de passar em um concurso público. "Na
necessidade de sobreviver, eles acabam caindo nas mãos de
empresários inescrupulosos que usam a saúde como um negócio",
alertou. Com isso, completou, submetem-se a salários aviltantes, sem
qualquer direito trabalhista.
Mas, para o deputado Adelmo Carneiro Leão (PT), não
é bem assim. Ele sustenta que os profissionais, ao contrário, são
protagonistas da ação de curar e prevenir doenças bucais. O
parlamentar não aceita que um dentista não tenha consciência dos
riscos sanitários oferecidos por essas clínicas. "Trata-se de uma
concepção ética", afirmou. Ele também defendeu a prevenção, que,
segundo ele, "é na odontologia que apresenta seus resultados mais
espetaculares, que se expressam no sorriso". Adelmo concordou que o
número de fiscais é insuficiente, mas fez críticas ao poder público.
"A falta de uma política de Estado provoca um constrangedor
contingente de desdentados no Brasil", afirmou.
Investimento público é insuficiente
Arnaldo Garrocho, do CRO-MG, reclamou que o Estado
investiu apenas R$ 80 mil na saúde bucal em 2008 e disse duvidar que
os R$ 400 mil previstos para esse ano sejam de fato aplicados. "A
Secretaria de Estado de Saúde divulgou recentemente que o câncer
bucal está crescendo em Minas, mas não tomou nenhuma providência. E
em Belo Horizonte, o descaso com a saúde bucal já dura 25 anos",
disparou o dirigente. Adelmo Carneiro Leão afirmou ainda que os
deputados precisam garantir no Orçamento do Estado recursos
suficientes para as ações na saúde. "Mas é preciso ter projetos
também, porque já vi muito dinheiro ser devolvido ao Estado por
falta de projeto", alertou.
Após ouvir as falas dos convidados e de ler
reportagem do jornal Estado de Minas sobre o tema, publicada
no dia 10 de maio, o deputado Juarez Távora (PV) se disse
"horrorizado". Ele sugeriu uma campanha alertando a população sobre
os riscos apresentados pelas clínicas populares. O deputado Doutor
Rinaldo (PSB), visando proteger o público, pediu que a fiscalização
dê prioridade a esses estabelecimentos. Quanto a isso, a gerente da
Vigilância Sanitária de Belo Horizonte, Mara Machado, ressalvou que
há clínicas populares que prestam bons serviços e, da mesma forma,
estabelecimentos sofisticados com serviço de péssima qualidade.
Outra ressalva em relação às clínicas populares foi
feita pelo presidente da comissão, deputado Carlos Mosconi (PSDB).
Segundo ele, o SUS, apesar de todos os seus problemas, conseguiu
incluir a população carente no sistema de saúde. Já a odontologia
fez isso sem o auxílio do poder público. Mosconi disse que essa é
uma questão complicada, mas precisa ser analisada sob esse aspecto
também.
Ao final da reunião, o deputado Délio Malheiros
sugeriu que os dentistas e outros profissionais que têm dívidas com
o município poderiam pagá-las não com dinheiro, mas com prestação de
serviços à comunidade. No caso dos odontólogos, por exemplo, eles
teriam condições de atender em escolas públicas, quitando seus
débitos com trabalho.
Outra sugestão dada na reunião foi feita por
Arnaldo Garrocho, do CRO-MG. Ele propôs uma fiscalização integrada
das clínicas, numa espécie de força-tarefa envolvendo as entidades
representativas da classe, o Ministério Público, a Vigilância
Sanitária e o Ministério do Trabalho. Segundo o presidente da
Associação Brasileira de Odontologia (ABO-MG), Carlos Augusto Jayme
Machado, o CRO e a ABO não têm poder de polícia, mas nessa ação
conjunta a Vigilância Sanitária poderia fechar as clínicas
irregulares. Mas Mara Machado esclareceu que, nas inspeções, a
Vigilância Sanitária não está autorizada a levar outras pessoas.
"Podemos fazer um trabalho conjunto, mas não uma fiscalização
conjunta", disse ela.
Presenças - Deputados
Carlos Mosconi (PSDB), presidente da comissão; Carlos Pimenta (PDT),
vice; Doutor Rinaldo (PSB), Adelmo Carneiro Leão (PT), Délio
Malheiros (PV) e Juarez Távora (PV). Também participou da reunião a
oficial do Ministério Público Anadeje do Carmo Diniz
Araújo.
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