Especialistas mineiros criticam lei federal
antidrogas
Críticas à legislação federal de combate ao consumo
de drogas e a cobrança de mais investimentos em campanhas educativas
marcaram debate realizado nesta terça-feira (2/6/09) pela Comissão
Extraordinária de Políticas Públicas de Enfrentamento à Aids, às
DSTs, ao Alcoolismo, às Drogas e Entorpecentes. Criada pela
Assembleia Legislativa de Minas Gerais, a comissão recebeu
convidados para discutir a prevenção ao uso de drogas e álcool em
Minas Gerais. Os convidados também admitiram a dificuldade para se
obter dados confiáveis que indiquem se o consumo de drogas cresceu
ou diminuiu no Estado, ou que comprovem a eficácia dos programas
implantados pelo Estado ou entidades da sociedade civil.
A Lei Federal 11.343, de 2006, foi um dos pontos
polêmicos da reunião realizada nesta terça. A lei institui o Sistema
Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad); prescreve
medidas para prevenção do uso indevido de drogas, para atenção e
reinserção social de usuários e dependentes; e estabelece normas
para repressão à produção e ao tráfico ilícitos. O principal ponto
criticado por convidados e por deputados foi a diferenciação rígida
que a lei estabelece entre usuário e traficante.
Para o superintendente de Articulação e
Descentralização de Políticas Antidrogas do Estado, José Geraldo de
Oliveira Silva, que representou a Subsecretaria de Políticas
Antidrogas, esta separação entre usuário e traficante não reflete a
realidade atual, uma vez que os papéis, hoje, se misturam. Para ele,
essa diferenciação exagerada acabou por incentivar o consumo.
Opinião semelhante mostrou o presidente da Associação de Assistência
Judiciária (Aajud), Stanley Ramos Gusman. "Esta lei é terrível. O
usuário recebe apenas uma admoestação verbal do juiz", criticou o
dirigente da entidade.
Apesar de todos admitirem a necessidade de
aprimoramento da lei, que tem apenas três anos, houve quem
advertisse contra um endurecimento do tratamento ao usuário. A
assessora do Conselho Estadual Antidrogas, Dilma Rocha, ressaltou
que seria um retrocesso voltar a tratar o usuário como um
delinquente. "Se não fosse essa lei, o uso hoje não seria tratado
como doença", afirmou ela.
Educação - Bem mais
consensual foi a necessidade de investir mais em campanhas
educacionais de prevenção ao uso de drogas. "Hoje temos campanhas
pontuais duas vezes por ano e não há a vivência da questão no
dia-a-dia. É como se estivesse sob controle algo sobre o qual
perdemos todo o controle", afirmou o coordenador da comissão
extraordinária, deputado Fahim Sawan (PSDB).
Quem mais enfatizou a necessidade de investimentos
em conscientização, no entanto, foi o médico e assessor técnico do
Conselho Estadual Antidrogas, Charles Carvalho Castro. "A Coca-Cola
gasta US$ 5 milhões por mês com propaganda", comparou o médico.
Segundo ele, é a forma mais inteligente de se investir em prevenção,
uma vez que a conscientização evita gastos maiores com tratamento do
vício, que traz resultados piores. Fahim Sawan, por exemplo,
ressaltou que apenas cerca de 30% dos viciados em drogas conseguem
se recuperar com o tratamento.
Ainda assim, também se cobrou mais investimentos na
área do tratamento, principalmente com a regionalização dos centros
de referência de atenção e reinserção social dos dependentes, hoje
muito concentrados na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O
deputado Eros Biondini (PHS) elogiou as iniciativas de parceria
entre o Estado e entidades do terceiro setor. "Acho que estamos no
caminho certo", declarou.
O deputado Célio Moreira (PSDB) cobrou também a
criação de um fundo estadual para financiar políticas antidrogas.
"Há mais de 20 anos esse fundo não sai", afirmou. Também destacou a
vulnerabilidade das escolas em relação ao tráfico e criticou a
ausência de representantes da Secretaria de Estado de Educação nas
reuniões convocadas pela Assembleia para discutir o tema.
Estado não tem dados sobre o consumo de
drogas
Uma carência que ficou clara durante a reunião foi
de pesquisas e números que indiquem o crescimento ou queda do
consumo de drogas no Estado, assim como a efetividade dos programas
de prevenção. O deputado Célio Moreira disse estar certo que, apesar
dos investimentos já feitos pelo Estado, o consumo vem
crescendo.
Já o major PM Weltom José da Silva Baião, um dos
coordenadores do Programa Educacional de Resistência às Drogas
(Proerd), da Polícia Militar, disse desconhecer qualquer pesquisa
com base científica sobre o assunto em Minas, a não ser em
circunstâncias e ambientes mais restritos, como as universidades.
"Eu não sei responder se o consumo cresceu ou não. Sei que cresceu o
número de prisão de traficantes", afirmou.
A representante da Secretaria de Estado de Saúde,
Ana Regina Machado, disse que a criação de métodos de avaliação dos
programas hoje implantados pelo Estado, tais como o Saúde na Escola,
o Papo Legal e o Proerd, é algo indispensável. Weltom Baião afirmou
que, pelo menos com relação ao Proerd, está em andamento uma
pesquisa de avaliação de resultados feita pela Secretaria de Estado
de Defesa Social. Ele também ressaltou a recente implantação de um
segundo programa, o Jovens Construindo a Cidadania (JCC), dirigido à
prevenção ao uso de drogas e violência.
Assembleia fará debate público
O coordenador da comissão extraordinária, deputado
Fahim Sawan, aproveitou a reunião desta terça para solicitar a
participação de todos no 1º Debate Público sobre Aids e Drogas da
Região Metropolitana de Belo Horizonte, que a ALMG realizará no dia
15 de junho, no Plenário. Já o superintendente José Geraldo Silva
pediu o apoio dos parlamentares para divulgar as conferências
municipais e regionais de políticas sobre drogas, que estarão
acontecendo até 15 de agosto. Os eventos precedem a 4ª Conferência
Estadual de Políticas sobre Drogas, entre os dias 10 e 12 de
setembro.
Presenças - Deputados Fahim
Sawan (PSDB), coordenador da comissão; Célio Moreira (PSDB), Eros
Biondini (PHS) e Adelmo Carneiro Leão (PT). Além das autoridades
citadas no texto, também participaram o superintendente de
Reinserção do Jovem da Coordenadoria da Juventude do Estado, Cleiton
Camilo Dutra.
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