Comissão discute como coibir judicialização abusiva da saúde

A regulamentação da Emenda à Constituição Federal no 29, que fixa o investimento mínimo em saúde para Estados e munic...

20/05/2009 - 00:01
Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais
 

Comissão discute como coibir judicialização abusiva da saúde

A regulamentação da Emenda à Constituição Federal no 29, que fixa o investimento mínimo em saúde para Estados e municípios; mais agilidade na atualização das listas de remédios fornecidos pelo SUS com vistas a incorporar avanços da ciência; troca de informações entre Judiciário e Executivo sobre protocolos de tratamento e medicamentos reconhecidos pela Anvisa; responsabilização de todos os entes federados. Essas foram algumas propostas defendidas nesta quarta-feira (20/5/09) para coibir a indústria da judicialização da saúde, tema debatido em audiência pública realizada na Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais a pedido do deputado Adelmo Carneiro Leão (PT).

O objetivo foi discutir o crescente aumento da prática em que os usuários buscam garantir seu direito à saúde por meio de ações judiciais para conseguir, sobretudo, medicamentos junto às prefeituras. "São ações que estão impondo aos municípios uma grande sobrecarga no orçamento, justamente eles, que são os entes que mais têm investido em saúde", afirmou Adelmo Carneiro Leão. Ele disse que só uma ação conjunta de todos os Poderes e de representantes da sociedade poderá solucionar o problema.

O debate reuniu representantes do Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, dos Conselhos Nacional e Estadual da Saúde, do Governo do Estado e ainda dos prefeitos mineiros. Apesar de abordagens às vezes divergentes, houve concordância de que as ações judiciais têm recaído mais sobre os municípios e de que há necessidade de troca de informações sobre o tema e de regulamentação da Emenda 29.

Essa emenda fixa em 15% do orçamento o mínimo que os municípios têm que investir em saúde, e em 12% o mínimo para os Estados. Ela deveria estar regulamentada desde 2005, mas isso não ocorreu, o que abriu brechas a interpretações do que poderia ou não ser considerado investimento em saúde. Foi defendido, no debate na comissão, que a regulamentação inclua a União, para que esta, ausente do texto original, também tenha sua contrapartida mínima de investimentos determinada.

Municípios são os mais penalizados

Segundo Adelmo Carneiro Leão, dados do Conselho Nacional de Saúde revelam que 94% dos municípios brasileiros cumprem a Emenda 29, enquanto dois terços dos Estados descumprem a determinação de investimento mínimo em saúde. "Fazemos um clamor ao Judiciário, para que essas ações judiciais se voltem também para o Estado e para a União, que são concorrentes e parceiros na questão do atendimento à saúde", defendeu o deputado.

A responsabilidade solidária dos entes federados sobre o direito à saúde cobrado pela via judicial também foi um dos destaques da fala do representante da Procuradoria-Geral de Justiça, Gilmar de Assis. "O usuário não tem nada a ver com essa celeuma, cabe a nós criarmos uma regra de compensação para os entes federados", defendeu.

O vice-presidente da Associação Mineira dos Municípios (AMM), Ângelo Roncalli, disse que a judicialização vem dificultando ainda mais a situação das prefeituras, que, além de serem responsáveis pela atenção básica à saúde, estão assumindo também os atendimentos de média e alta complexidade.

"A maioria dos municípios gasta mais do que os 15% em saúde, chegando a 22% ou até 28%, como no caso de minha cidade", informou ele, prefeito de São Gonçalo do Pará (Centro-Oeste de Minas). Ele denunciou que a indústria da judicialização tem produzido casos absurdos. "Há ações envolvendo donos de empresas e gerentes de bancos, que poderiam arcar com o tratamento".

O dirigente da AMM pediu bom senso no trato da questão. "Parece que o Ministério Público tem o entendimento de que ir contra o município é mais fácil e rápido do que ir contra o Estado", apontou.

Riscos e privilégios - Além de problemas de ordem financeira e operacional, o presidente da comissão, deputado Carlos Mosconi (PSDB), frisou que a judicialização pode trazer problemas também para a população, quando determina a oferta de medicamentos chamados excepcionais, de alto custo e prescritos pelos médicos mesmo não estando liberados pela Anvisa. Questionando a segurança desse procedimento, ele lembrou que os protocolos que atestam tratamentos e medicamentos são feitos por autoridades no assunto, e defendeu um debate mais profundo dessa questão complexa.

Já o deputado Fahim Sawan (PSDB) disse que há no Brasil 60 milhões de processos na Justiça, dos quais muitos poderiam ser resolvidos administrativamente. Ele lembrou que o acesso a tratamentos de ponta ainda é privilégio dos que podem pagar. "Muitos hospitais que eram conveniados desistiram de receber R$ 2,50 por uma consulta e R$ 1,80 por um exame para atender os mais pobres".

Cobrança deve ser responsável, diz desembargadora

A desembargadora Vanessa Verdolin Wudson fez aos deputados um balanço da atuação da Justiça na questão ao longo dos últimos anos. Segundo ela, inicialmente, por desconhecimento da população quanto aos seus direitos, poucos pedidos ligados à saúde chegavam à Justiça, com decisões judiciais que, segundo ela, não refletiam a realidade. Num segundo momento, as ações aumentaram e passaram a ser deferidas de forma absoluta.

Hoje, a partir de estudos e discussões, ela informou que o direto à saúde permanece absoluto no julgamento das ações, mas dentro de um contexto que não inviabilize as políticas públicas ou trate de forma igual prefeituras pouco dedicadas ao sistema público e aquelas que se esmeram para fazer o que podem. "A judicialização deve ser vista de maneira responsável para não atender pedidos abusivos ou feitos só para pular filas e beneficiar alguém antes de outro que precisa mais", defendeu.

Já o defensor público Marco Paulo Denucci frisou que a ciência não é estática, mas está em constante aprimoramento, o que segundo ele não estaria sendo levando em consideração pelo sistema público de saúde. Como exemplos, citou a situação dos remédios considerados excepcionais, como o Anel de Ferrara, recurso para tratamento na área de oftalmologia consagrado em boa parte do mundo há pelo menos cinco anos e fora da lista do SUS. "Nosso alerta é para quem a questão não seja vista de forma estanque".

Maior controle - Para Geraldo Adão Santos, do Conselho Nacional de Saúde, é preciso que o SUS avance para que ações judiciais não favoreçam indivíduos em detrimento da coletividade, enquanto Renato Barros, do Conselho Estadual, destacou sobretudo a importância do controle social do SUS, com a mobilização da sociedade, que deve estar atenta aos interesses das indústrias farmacêuticas.

Ações contra o Estado se multiplicaram em seis anos

Apesar de recair sobretudo nos municípios, a judicialização do setor elevou as despesas do Estado de R$ 164 mil em 2002 para cerca de R$ 43 milhões em 2008, somente para atender ações judiciais relacionadas à saúde, segundo dados apresentados pela subsecretária de Estado de Inovação e Logística em Saúde, Jomara Alves da Silva.

Segundo Jomara, o cidadão está mais atuante e vai recorrer à Justiça sempre que achar necessário. Lembrou, contudo, que muitas ações individuais quebram a lógica dos princípios da universalidade e da integralidade que norteiam o SUS. Ela criticou as ações que impõem a oferta de produtos sem registro ou de produtos de marca que têm similares na listagem do SUS, embora reconhecendo, durante a fase de debates na comissão, que a atualização dessa listagem ainda é demorada.

"Ainda há falhas", disse ela, citando que o ministro da Saúde assumiu, em recente debate no Supremo Tribunal Federal sobre o mesmo assunto, que a lista será atualizada. Ela argumentou, contudo, que um protocolo clínico para a liberação de um novo medicamento tem regras próprias, devendo ser um processo longo e cuidadoso para a segurança da saúde da população. Em 2008, frisou, a indústria farmacêutica faturou quase R$ 30 bilhões no Brasil, investindo desse montante mais em publicidade do que em pesquisas.

Requerimento favorece troca de informações sobre medicamentos

O debate na comissão levou à aprovação de requerimento do deputado Ruy Muniz (DEM) para que a Secretaria de Estado da Saúde envie ao Ministério Público, à Defensoria Pública e ao Tribunal de Justiça os protocolos de tratamento das doenças para as quais há o maior número de demandas judiciais por tratamento, bem como informações sobre quais são as alternativas terapêuticas fornecidas pelo SUS. O objetivo, segundo o deputado, é democratizar informações que podem auxiliar as decisões judiciais.

Outros requerimentos - Também foram aprovados outros dois requerimentos. Um, também do deputado Ruy Muniz, para realização de audiência pública em Teófilo Otoni para discutir o aumento da ocorrência de casos de dengue. O segundo, do deputado Adalclever Lopes, para realização de reunião conjunta com a Comissão de Defesa do Consumidor e Contribuinte em Caratinga, para discutir a instalação de uma unidade do Hemominas naquela cidade.

Presenças - Deputados Carlos Mosconi (PSDB), presidente; Carlos Pimenta, vice (PDT); Doutor Rinaldo (PSB), Fahim Sawan (PSDB), Ruy Muniz (DEM), Adelmo Carneiro Leão (PT) e Domingos Sávio (PSDB). Também participaram da reunião Paulo Roberto Venânico de Carvalho, do Conselho Nacional de Saúde; Rogério Moreira, superintendente da AMM; e José Oscar Júnior, secretário municipal de Saúde de Itaúna.

 

 

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