Comissão da Crise colhe subsídios do setor
agropecuário
Os impactos da crise econômica mundial sobre o
setor agropecuário mineiro mostram fragilidades do modelo
macroeconômico exportador adotado em Minas Gerais. Cada uma dessas
fragilidades e as dificuldades de cada área da agricultura foram
detalhadas por autoridades e deputados durante a reunião da Comissão
Extraordinária para o Enfrentamento da Crise Econômico-Financeira
Internacional, realizada na tarde desta terça-feira (19/5/09).
Também foram apresentadas sugestões para superá-las. O trabalho da
comissão é um desdobramento do Ciclo de Debates Minas Combate a
Crise, organizado em abril pela Assembleia Legislativa de Minas
Gerais.
A reunião, coordenada pelo deputado Sebastião
Helvécio (PDT), começou com uma exposição do desempenho da
Agropecuária mineira, feita pelo secretário de Agricultura e
Pecuária, Gilman Viana Rodrigues. Segundo os dados apresentados,
está previsto para 2009 um crescimento negativo para os países ricos
(EUA: -1,6%, Japão: -2,6%, União Européia: -2%), ao passo que os
países emergentes crescerão em conjunto 3,3%, puxados pela China.
Nos últimos dez anos, o PIB dos países emergentes cresceu de 37%
para 45% do PIB mundial, e 140 milhões de pessoas saíram da linha da
miséria para a do consumo.
Mesmo assim, segundo Viana Rodrigues, a situação do
agronegócio exportador mineiro é ruim, porque os preços dos nossos
principais produtos caíram no mercado internacional. A carne bovina
caiu de US$ 4 mil para US$ 3,083 mil a tonelada; a suína de US$ 2,4
mil para US$ 2 mil; a de frango, de US$ 1,6 mil para US$ 1 mil. O
café caiu de US$ 2,7 mil para US$ 2,2 mil, e o leite em pó, de US$
3,9 mil para US$ 2,8 mil. Ao mesmo tempo, os preços dos insumos
importados dispararam.
A interpretação do secretário é de que "a lâmina do
trator foi colocada baixa e está passando por cima de todos. Tivemos
casos de carne embarcada que foi devolvida no porto de destino. A
boa notícia de hoje é que a China passou a comprar frango do Brasil.
Há sinais de melhores negócios, mas nada espetacular. Nossos custos
precisam conviver com os novos preços da economia", disse ele.
Entre as medidas adotadas pelo Estado para conviver
com a crise, Gilman Rodrigues destaca a inauguração de um trecho
ferroviário de 160 km entre Pirapora e Corinto, para facilitar os
embarques de grãos do Noroeste através de transporte intermodal até
o porto de Vitória (ES). Também incentivos à certificação de
produtos e à melhoria genética de rebanhos foram citados, bem como o
novo papel de produtor de sementes assumido pelo Projeto
Jaíba.
Faemg preparou sugestões para o plano da próxima
safra
Afonso Damázio Soares, da Faemg, falou sobre
paradoxo do leite, cujo aumento de produção foi incentivado,
enquanto os produtores foram colhidos pela crise. Segundo ele, Minas
responde por quase 30% da produção nacional, e o setor está
endividado. Soares entregou ao deputado Sebastião Helvécio um
documento que foi preparado pela entidade para o ministro da
Agricultura, Reinhold Stephanes, contendo sugestões para o
financiamento da próxima safra e para que o setor possa deslanchar
no pós-crise. Entre as propostas, recursos de R$ 120 bilhões para
financiamento da produção, queda nas taxas de juros de 6,75% para
5%, expansão do seguro rural e criação de um fundo contra os riscos
do crédito rural, para limitar o endividamento do setor.
Falando em nome dos trabalhadores rurais, Rômulo
Luiz Chaves, da Fetaemg, disse que o trabalhador nada tem a ver com
a crise, mas sofre seus efeitos. Segundo ele, o setor de
reflorestamento está fazendo demissões em massa, pela desativação do
fornecimento de carvão para as siderúrgicas. "Esta não é uma crise
interna da produção agrícola, não pode ser resolvida com reforma
agrária ou com boas estradas, como sempre reivindicamos. É uma crise
da exportação, e o trabalhador destituído nada pode fazer para
resolvê-la", resumiu. No entanto, a Fetaemg defende a criação de
programas de agregação de valor à produção, que gerariam mais
empregos na área agroindustrial. "É um absurdo vender café verde.
Seria como vender cana para fazerem açúcar e álcool no exterior",
comparou.
Todos os setores reclamam das crescentes exigências
ambientais
O presidente do movimento SOS Cafeicultura, Eric
Miranda Abreu, disse que o movimento pôs recentemente 25 mil pessoas
em uma manifestação realizada em Varginha, mas que isso não mereceu
menção no Jornal Nacional. Disse que não há crise de emprego na
cafeicultura, porque é o início da colheita e o café não espera no
pé. Acrescentou que a crise é econômico-financeira, mas também
social e ambiental, já que a quebra dos produtores gera dificuldades
para as prefeituras e impossibilita o atendimento à legislação
ambiental. Apelou ao Governo de Minas que contenha o ímpeto dos
fiscais. "Todo dia aparecem novas normas e novos custos, como se
Minas ainda fosse a terra dos barões do café". Dos 300 mil
produtores de café do Brasil, 80% possuem até 10 hectares,
lembrou.
Uma análise da gravidade da crise em Minas foi
feita por Luiz Custódio Cotta Martins, presidente dos sindicatos do
açúcar e do álcool de Minas. Segundo ele, o Estado foi mais afetado
em sua área porque foi o que mais cresceu nos últimos seis anos. No
início do governo Aécio, Minas produzia 15 milhões de toneladas de
cana. Hoje são mais de 48 milhões. Minas passou do quinto para o
segundo lugar entre os estados produtores de açúcar e álcool. No
entanto, a crise interrompeu esse crescimento. "Dos mais de 30
projetos de usinas para o Estado, 16 foram suspensos e outros foram
adiados. Contratos em dólar provocaram grande endividamento do
setor. Acresce que a carga tributária sobre o álcool em São Paulo é
de 12%. Em Minas, é de 25%. Por essa razão, em São Paulo vende-se
mais álcool que gasolina, ao passo que em Minas a proporção é de
três litros de gasolina por um de álcool", disse ele.
O diretor-executivo do Sindicato da Indústria de
Laticínios (Silemg), Celso Costa Moreira, traçou um panorama mais
ameno que o do representante da Faemg no que diz respeito ao leite,
cujos preços vêm apresentando pequena recuperação depois que houve
diminuição da oferta e redução dos custos tributários por parte do
Governo do Estado. Criticou o Estado de São Paulo por estabelecer
alíquota zero de ICMS para o leite produzido em seu solo e 18% para
o leite de outros estados. Também no Rio de Janeiro teria sido
adotada alíquota zero para todos os laticínios. Entre outras
propostas, sugeriu dificultar ou impedir a entrada de soro no país,
que seria de 3 bilhões de litros. "Estamos resolvendo os problemas
de outros países e criando um problema ambiental no nosso",
atacou.
Deputados fazem questionamentos e tomam
posição
Encerradas as exposições dos convidados, o
coordenador Sebastião Helvécio passou a palavra aos deputados, mas
antes apresentou questões às autoridades. Admitindo que o
agronegócio é fundamental para a economia mineira e que desempenha
importante papel social, indagou ao secretário Gilman Rodrigues como
é possível consolidar o papel de Minas como Estado exportador.
Ao representante da Faemg, o coordenador pediu uma
reflexão sobre as políticas anticíclicas adotadas no Brasil, como a
redução da taxa de juros em plena crise. Também perguntou à Faemg
qual é a parcela do custo ambiental no custo total dos produtos.
Vanderlei Jangrossi (PP), que preside a Comissão de
Política Agropecuária, relatou a luta travada em Brasília para a
garantia do preço mínimo de R$ 320 para o café, que permitiria ao
produtor saldar suas dívidas e pagar salários dignos a seus
trabalhadores, e a decepção que teve ao ver a fixação do preço em R$
261, quando os produtores esperavam no mínimo os R$ 282 anunciados
previamente. Disse também que o grande vilão no custo da produção é
o fertilizante, devido ao monopólio existente. Propôs uma política
pública para reduzir essa dependência de insumos.
Crise deve fortalecer o papel do Estado
"A crise é do neoliberalismo, do Estado mínimo, do
mercado como bezerro de ouro da economia", disse o deputado André
Quintão (PT). Para ele, a crise traz a perspectiva de fortalecimento
do Estado, e a situação em Minas já era de dificuldades em vários
setores estratégicos, antes da crise. "O sentimento que adquiri nas
várias reuniões desta comissão é de que é necessário diversificar a
economia e agregar valor a produtos como leite, café, fruticultura.
É preciso repensar as políticas macroeconômicas para Minas, mas
encontrar um equilíbrio. Não se trata apenas de conceder isenções e
reduções tributárias. Para sustentar programas de tecnologia, linhas
de crédito subsidiado, socorrer setores e categorias, é preciso
arrecadar", ponderou.
O deputado Antônio Carlos Arantes (PSC) fez coro às
queixas dos vários setores contra as exigências ambientais que
considera descabidas e inoportunas. E disse mais, que "o Sul de
Minas está em crise antes da crise, pelo empobrecimento do produtor
rural, particularmente o de café. Em 14 anos nossos custos subiram
500%, e o preço apenas 20%. Estamos tomando calote das empresas que
compravam nosso milho e quebraram, como quebraram também duas
cooperativas de café da região. Basta voar de avião sobre as
fazendas da região para ver a desolação: cercas e benfeitorias estão
caindo", frisou.
Dalmo Ribeiro Silva (PSDB) revelou sua preocupação
com a desaceleração do ritmo de empresas de alguns setores do Estado
como o têxtil, afetado por importações chinesas. Considerou
importante discutir a reforma tributária e o pacto federativo. "É
necessário que continuemos ouvindo todos os setores e segmentos para
construir e apresentar sugestões equilibradas e precisas."
Antônio Júlio (PMDB) disse que os problemas ali
discutidos são antigos, como a questão do preço do leite e dos
fertilizantes, que era para ser autossuficiente, mas 80% dos
produtos ainda são importados. Fez coro às vozes descontentes com a
atuação da Secretaria de Meio Ambiente, que, segundo ele, "não se
preocupa com o meio ambiente, mas em arrecadar, inviabilizando o
agronegócio em Minas".
Chico Uejo (PSB) falou que a liberação de crédito
deve ser diferenciada para a produção de alimentos. De uma forma
para os alimentos da mesa dos brasileiros, e outra para os produtos
destinados à exportação. O biocombustível, segundo ele, não é visto
como solução para médio e longo prazo para países como o Japão, que
investem em carros elétricos. Uejo questionou se o Brasil está no
rumo certo.
Secretário discorda da concessão de subsídios
agrícolas
Em suas considerações finais, o secretário Gilman
esclareceu que a viabilidade de subsídio agrícola no Brasil é muito
questionável por se tratar de país que não conseguiu ainda oferecer
saúde e educação adequada. "A percepção da crise está muito mais
qualificada hoje do que foi no passado. Isto está ajudando a
superá-la", observou.
Para Afonso Damázio, da Faemg, o setor agropecuário
brasileiro vive um paradoxo. Segundo ele, o produtor rural reclama
dos seus custos de produção, mas continua produzindo muito, gerando
sucessivos recordes de safra, o que, por sua vez, faz com que os
preços dos produtos baixem ainda mais. Sobre uma política agrícola
de longo prazo para o País, ele se mostrou descrente: "não dá para
formatar uma política de longo prazo no setor sem falar em subsídios
e com o produtor rural continuando refém da legislação ambiental".
Na opinião de Damázio, o que é possível esboçar é uma política para
o setor agropecuário de curto prazo, a qual deve priorizar a
ampliação de instrumentos de crédito para os produtores e a redução
dos juros.
No encerramento, Sebastião Helvécio elogiou a
qualidade dos depoimentos e a convergência de pensamento para a
superação da crise. "Foi uma tarde/noite de grandeza para a
Assembleia, um momento de exercitar o parlamento, viver o
encantamento da possibilidade", disse o deputado.
Presenças - Deputados
Sebastião Helvécio (PDT), coordenador; André Quintão (PT), Antônio
Júlio (PMDB), Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), Jayro Lessa (DEM), Antônio
Carlos Arantes (PSC), Vanderlei Jangrossi (PP), Chico Uejo (PSB),
Carlos Gomes (PT) e Domingos Sávio (PSDB).
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