Povos indígenas pedem mudanças na Funai e acesso à terra

A reestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e a garantia de terra, saúde e educação foram algumas das reiv...

17/04/2009 - 00:01
Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais
 

Povos indígenas pedem mudanças na Funai e acesso à terra

A reestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e a garantia de terra, saúde e educação foram algumas das reivindicações apresentadas por representantes de comunidades indígenas no Debate Público Os Povos Indígenas de Minas Gerais e o Acesso às Políticas Públicas, no Plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, na manhã desta sexta-feira (17/4/09). O evento é promovido pelas Comissões de Participação Popular e de Direitos Humanos e encerra a programação do seminário Abril Indígena em Minas Gerais: por Terra, Direitos e Autonomia, realizado durante a semana no Instituto Metodista Izabela Hendrix. Representantes de dez comunidades indígenas estiveram presentes, além do povo Catu Awá, que está em processo de reconhecimento.

Na abertura do debate público, o presidente da Comissão de Participação Popular, deputado André Quintão (PT), questionou por que uma população relativamente pequena no Estado concentra tantos problemas. Minas Gerais tem cerca de 14,5 mil índios, distribuídos em dez tribos. Estima-se que outros 90 povos que viviam no Estado tenham desaparecido. "A sociedade brasileira e a sociedade mineira têm uma enorme dívida com os povos indígenas, acumulando-se ao longo de séculos", afirmou Quintão. Ele fez um apelo aos representantes de órgãos públicos presentes para que as discussões resultem numa transformação dessa realidade.

Quintão é autor do requerimento para a realização do debate, junto com os deputados Carlin Moura (PCdoB) e Eros Biondini (PHS), a pedido do Conselho dos Povos Indígenas de Minas Gerais e do Instituto Dom Luciano de Apoio às Causas Indígenas.

Massacre - A abertura do debate público teve apresentações rituais das tribos Pataxó e Xucuru. O cacique xucuru José Sátiro Nascimento pediu a palavra e reivindicou mudanças na Funai. Ele disse, ainda, que os índios do Estado passam por uma crise no que diz respeito à alimentação e apelou por tempos melhores. "São 509 anos de massacre, de 'judiança', de sangue derramado. Nós precisamos viver mais 509 anos com direitos e com liberdade", afirmou.

Painel discute acesso à terra

O coordenador do Conselho dos Povos Indígenas, o cacique pataxó Mezaque Silva de Jesus, abriu o painel "Acesso Sustentável à Terra". Ele disse que há, no Estado, comunidades de índios sem território próprio e algumas com poucas terras para viver. Segundo o cacique, mesmo aquelas que tiveram a terra demarcada não têm real autonomia sobre ela. "A terra para o índio é quase tudo. Significa sustento, soberania e uma forma de viver sua cultura e as tradições dos antepassados", afirmou Mezaque. Ele também reclamou das condições de saúde a que os povos indígenas são submetidos.

A necessidade de ampliação do território indígena e de demarcação das terras também foi ressaltada pelo administrador regional da Funai em Governador Valadares, Waldemar Adilson Krenak. O representante da Funai também defendeu um aumento do teto orçamentário para as questões indígenas e pediu apoio técnico para os pedidos de demarcação de terra.

Waldemar Krenak informou que foi assinado um protocolo de intenções entre Funai, Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional e Política Urbana, no valor de R$ 44 milhões, para a habitação indígena. No entanto, de acordo com o administrador da Funai, ainda falta a celebração de um convênio nesse sentido. Ele ainda acrescentou que a realidade indígena deve ser considerada para a realização dos projetos e políticas públicas. O deputado André Quintão sugeriu a realização de uma audiência em Brasília, com o presidente da Funai, para apresentação de todas as demandas das comunidades indígenas.

Secretário afirma que não há soberania alimentar sem terra

O secretário nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, Crispim Moreira, citou o documento "Terra: direitos patrimonais e territoriais", elaborado por grupo de trabalho do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) que afirma: "Sem terra, definitivamente, não há como garantir a soberania alimentar dos mais de 220 povos, falando 180 línguas indígenas, que habitam o Brasil".

Crispim Moreira apresentou as ações do Ministério de Desenvolvimento Social (MDS) que atingem os povos indígenas, em especial a Carteira Indígena. Esse programa repassa recursos diretamente para as associações indígenas para que elas possam desenvolver seus projetos, além de contribuir para a segurança alimentar e nutricional das comunidades indígenas em todo o Brasil. De acordo com o secretário, ainda existem R$ 10 milhões para serem investidos em projetos neste ano. Em Minas Gerais, existem seis projetos em andamento, com investimento total de R$ 326,5 mil, beneficiando 2.450 indígenas de 493 famílias.

O representante do MDS afirmou que as comunidades indígenas também podem ser beneficiadas por meio de outras ações que destinam recursos aos municípios que têm aldeias indígenas e reconhecem essas terras como essenciais para a garantia da soberania alimentar. Há ainda o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) da agricultura familiar e camponesa para abastecer a rede de proteção social, que tem recursos de cerca de R$ 600 milhões.

Outros programas, como o Bolsa Família e a distribuição de cestas de alimentos para casos emergenciais, também podem ser acessados pelos índios. Crispim Moreira enfatizou que as lideranças indígenas devem exigir recursos dos governos estadual e municipais para garantir que as comunidades sejam contempladas na rede de assistência social. Além disso, ele informou aos participantes sobre a agenda de capacitação dos índios para as formas de acesso a esses recursos, o acompanhamento dos editais e a elaboração de projetos.

As dificuldades encontradas pelas comunidades indígenas para garantirem o direito aos recursos do Governo Federal foram levantadas pelo coordenador do Conselho dos Povos Indígenas, Douglas Krenak. Ele fez vários questionamentos ao secretário do MDS e quis saber ainda como os índios podem promover audiências nos municípios sobre esses programas. Douglas Krenak disse que os índios encontram dificuldade em conseguir o documento das terras onde vivem, uma vez que o território é de usufruto das comunidades. "O direito às vezes é negado na base. Precisamos trabalhar nossa relação com os municípios", explicou. O deputado André Quintão disse que vai enviar correspondência aos municípios que possuem aldeias indígenas alertando para a abertura de editais de interesse das comunidades. "Os prefeitos podem ajudar nessas articulações para se conseguir recursos", acrescentou.

Douglas Krenak também informou sobre a ocorrência de conflitos em função da criação de unidades de conservação ambiental dentro das reservas indígenas e questionou sobre a participação dos índios nos conselhos. "As prefeituras é que escolhem os representantes e nunca somos indicados", justificou.

Debates - Respondendo ao temor do cacique Ivan Pankararu de que as reivindicações dos povos indígenas permaneçam engavetadas, o deputado André Quintão esclareceu o papel do Parlamento na concretização das ações. Ele lembrou que a Assembleia produz as leis e fiscaliza sua implementação, além de mobilizar sociedade e governos por meio de debates como o desta sexta (17). Mas acentuou que é necessária uma ação integrada dos povos, das entidades e do Legislativo para cobrar do Executivo, nos diferentes níveis, políticas públicas. "É fundamental sairmos do evento com uma agenda de trabalho", pontuou.

O parlamentar convidou os representantes indígenas a participarem do processo de revisão do Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG) 2008-2011, que acontece anualmente em outubro e novembro. Ele ponderou que essa é uma oportunidade de interferir diretamente no planejamento orçamentário governamental. Ao avaliar o PPAG, André Quintão opinou que as ações para os índios permanecem dispersas em áreas como saúde, regularização fundiária e melhoria das unidades habitacionais. O deputado comprometeu-se, ainda, a promover novo debate público em 2010, mas desta vez para verificar se foram cumpridos os compromissos firmados no evento desta sexta (17).

Conselhos - O presidente da Comissão de Participação Popular esclareceu o líder Douglas Krenak sobre a representação da sociedade no Conselho Estadual de Segurança Alimentar (Consea), do qual ele participa em nome da Assembleia. Segundo ele, a participação hoje se dá por meio dos conselhos regionais. "Um caminho seria buscar uma representação setorial", ponderou, dizendo que levará o assunto ao grupo. Também respondendo a Douglas Krenak, Crispim Moreira informou que a carteira indígena do Governo Federal tem projetos definidos em uma instância colegiada com representação dos povos, assim como ocorre no Conselho de Segurança Alimentar nacional.

Luiz Chaves, do Instituto Dom Helder Câmara, reforçou que a questão primordial dos índios é o direito à terra. Sobre esse tema, ele lembrou à Assembleia que é possível legislar em nível estadual, mesmo a demarcação cabendo à União. "As terras tradicionais estão a cargo da União, mas há as terras reservadas e de domínio. A Assembleia pode solicitar do governador a desapropriação de áreas por interesse público", opinou.

Chaves fez ainda um alerta sobre a retirada de direitos indígenas garantidos na Constituição Federal, citando o exemplo da demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo ele, ao estabelecer 19 condicionantes, o órgão determinou que a demarcação terá que ter a participação dos Estados. "E sabemos que todos os governantes são contrários", disse. Sobre esse assunto, o padre Henrique sugeriu que os participantes do debate público aprovem uma moção de protesto contra os governos do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul, considerados por ele os "piores com relação à causa indígena". Ele informou que o governo do Mato Grosso do Sul apresentou requerimento formal ao Ministério da Justiça para paralisar todos os processos de demarcação em curso.

Críticas - O cacique Mezaque Silva e o líder Douglas Krenak fizeram duras críticas à atuação do assessor especial do governador para Assuntos Indígenas, Ailton Krenak. Para eles, sua nomeação não contribuiu para facilitar o diálogo com o Executivo estadual. "Nós não o consideramos representante dos povos, mas sim do governo", resumiu Mezaque.

 

 

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