Especialistas traçam quadro da agricultura e da produção de
leite
Quatro especialistas em análises sobre o desempenho
da agricultura no País, nas áreas de pesquisa, economia agrícola
estadual, ponto de vista político e classista e o setor leiteiro
trouxeram informações atualizadas para o debate com os deputados da
Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial da Assembléia
Legislativa de Minas Gerais na tarde desta terça-feira
(2/12/08).
O pesquisador da Embrapa Jason de Oliveira Duarte
opinou que a crise gera oportunidades, e o atual panorama mundial
exige que o Brasil fique atento para aproveitar o potencial de
exportação de alimentos. Segundo ele, as oscilações de renda ou
câmbio alteram pouco o consumo de alimentos no mundo ocidental, mas
a ascensão econômica dos chineses representa um mercado de 1,33
bilhão de consumidores, que atualmente comem mais vegetais, mais
cereais e mais proteína.
"O consumo dos chineses hoje é de 3,9 frangos e 33
kg de carne suína por ano. Em 1980, eles consumiam apenas 20 kg de
carne bovina por ano. Hoje já consomem 50 kg", informou Duarte. O
pesquisador contesta como "falas infundadas" as afirmações de que a
agricultura brasileira voltada para a produção de energia afeta a
produção de alimentos, já que os ganhos de produtividade trazidos
pela tecnologia são crescentes. O consumo de fertilizantes, segundo
Duarte, cresceu 178% nos últimos 16 anos.
O especialista fez também um estudo sobre o aumento
dos custos de produção de janeiro a setembro deste ano, concluindo
que, para o trigo, aumentaram 170%. A soja teve um aumento de 65% no
preço das sementes e de 57% no custo dos fertilizantes. As sementes
de milho aumentaram 15% e os fertilizantes, 59%. Duarte concluiu
que, no Brasil, as políticas agrícolas "são capengas" e que é
preciso criar estímulos não só à produção, mas também à
comercialização, antes que o desestímulo ao produtor traga
consequências sérias para o abastecimento. Para reduzir o "custo
Brasil", ele sugere a derrubada das barreiras tarifárias e
não-tarifárias.
Primeiro lugar em produção de café e leite
Da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e
Abastecimento, veio o superintendente de Economia Agrícola, João
Ricardo Albanez, que mapeou as terras agrícolas de Minas, onde 43%
são pastagens, 4,77% são plantadas com grãos, 2,2% com florestas
homogêneas, 1,85% com café, 0,99% com cana-de-açúcar e 0,14% com
frutas. Para ele, é possível remanejar pastagens para outras
atividades agrícolas sem prejudicar a 2ª colocação do Estado em
rebanho bovino e a 1ª em produção leiteira.
"Minas é o maior produtor de café e produz 28% do
leite brasileiro. O PIB do agronegócio mineiro era 9,5% do nacional
há sete anos, mas hoje já corresponde a 11,8%. Seu valor é de R$ 90
bilhões, sendo que, no negócio do leite, 41% ficam dentro da
porteira. Na pecuária de corte, ficam 55%", analisa Albanez, para
concluir que o governo precisa investir na agroindústria de base
animal para agregar valor à pecuária. "Na agricultura, as
destilarias de açúcar, álcool e as fábricas de celulose puxam o
setor para uma indústria vegetal expressiva. A resposta do segmento
tem sido extremamente positiva", afirmou.
'Custo Minas' também desestimula o produtor
O superintendente técnico da Federação da
Agricultura do Estado de Minas Gerais (Faemg), Afonso Damásio
Soares, aproveitou a discussão sobre o "custo Brasil" para criticar
também o que chama de "custo Minas", que colocaria a Secretaria de
Agricultura em confronto com a de Meio Ambiente, já que esta
criminaliza o produtor rural.
"A Polícia Ambiental está completamente equipada
para agir contra o produtor e age com presteza, ao contrário das
outras polícias, que não garantem sua segurança. Temos relatos de
produtores que foram multados de manhã e assaltados à noite",
acusou. Considerando que a legislação ambiental é extremamente
complexa, Soares pede que a multa seja definida por agrônomos com
registro profissional, e que a tônica seja de orientação, e não de
penalização.
A segunda queixa encaminhada pelo representante da
Faemg diz respeito à guerra fiscal, que mantém tributos mais
elevados em relação a São Paulo, que importa o leite produzido aqui.
"Em São Paulo, a tributação do álcool é de 12%. Aqui a alíquota é de
18%. O desemprego já começa a aparecer no setor leiteiro e o
secretário (de Agricultura) Gilman Viana terá que se entender com a
Secretaria da Fazenda", sugeriu. Ele pediu ainda uma compensação
para que os produtores cuidem dos 20% de reserva florestal, como se
faz na Europa.
Está faltando leite no mundo
O vice-presidente da Faemg, Rodrigo Alvim, também é
presidente da Comissão do Leite da Confederação Nacional da
Agricultura. Ele trouxe dados surpreendentes sobre a atividade, como
a concentração das exportações brasileiras de leite para a
Venezuela, que fica com 58% do total. "É arriscado contar com apenas
um grande comprador. Temos uma centena de outros países que compram
nosso leite, e o governo precisa criar uma campanha de marketing e
convidar delegações estrangeiras para visitar nossas instalações e
aumentar suas encomendas", recomenda.
Alvim revela que, devido à política de subsídios ao
leite europeu, o preço da tonelada de leite em pó foi mantido
durante muitos anos na faixa "irreal" de US$ 2 mil. No ano passado,
o preço subiu repentinamente para US$ 5,2 mil, devido ao interesse
dos especuladores, que logo saíram desse investimento quando surgiu
a crise americana. O consumo, segundo estimativa da Organização das
Nações Unidas (ONU), cresce anualmente de 3,5% a 4%, e a Europa
ficou sem estoques reguladores e sem manteiga.
Rodrigo Alvim revelou ainda que a China tem
potencial para se tornar um grande mercado de leite, já que a ONU
recomenda 180 litros por habitante/ano, e atualmente só os mais
ricos consomem 50 litros, e os mais pobres bebem apenas 8 litros por
ano. "Falta leite no mundo", concluiu. Ele acrescentou que houve
redução na produção e caíram os subsídios às exportações do oeste da
Europa, bancados pela União Européia.
O especialista considera que os preços do leite
foram bons em 2007, permitindo um rápido aumento na produção, já que
as vacas bem alimentadas produzem mais. Entre abril de 2007 e abril
de 2008 houve um aumento de 27% na produção brasileira, mas em
setembro último já havia caído abaixo do desempenho de setembro do
ano passado. Alvim citou um estudo preparado pelo deputado Antônio
Carlos Arantes (PSC) segundo o qual, desde 1994, o preço do leite
teve um reajuste de apenas 48%, enquanto o salário mínimo subiu
641%, o diesel subiu 553%, e outros insumos como o calcário, a
energia, o adubo e o milho subiram mais de 100%.
"Fomos estimulados a aumentar a produção e agora
precisamos de políticas para nos mantermos no negócio", cobrou o
vice-presidente da Faemg. A produção fiscalizada foi de 17,9 bilhões
de litros em 2007 e será de 20,6 bilhões em 2008. Há outros 10
bilhões não fiscalizados. Seria preciso direcionar o excedente para
as compras do Programa de Aquisição de Alimentos do Governo Federal,
desonerar do PIS e da Cofins produtos como ração, sal mineral e
ordenha mecânica, e criar linhas de crédito adequadas para sustentar
a atividade.
Riscos de desapropriação devido à baixa
produtividade
Alvim também lançou outro débito no chamado "custo
Brasil". Segundo ele, é preciso rever os índices de produtividade
adotados no País, que estariam superestimados em prejuízo da grande
maioria dos produtores. "A Embrapa, que é empresa do governo, refez
os estudos e o governo não acatou, de modo que quase todos os
produtores estão classificados como improdutivos. Isso se reflete em
mais impostos e no risco de desapropriação para fins de reforma
agrária", desabafou.
O presidente da comissão, deputado Vanderlei
Jangrossi (PP), relatou os protestos mais recentes dos produtores de
leite, que distribuíram 20 mil litros de leite gratuitamente em
Pompéu. Jangrossi desaprova o desperdício de entornar o leite nas
ruas, feito pelos produtores do Sul do País, e disse que estaria
melhor empregado se fosse doado às vítimas das enchentes de Santa
Catarina. Pediu aos especialistas que passassem à assessoria da
comissão cópias de suas apresentações e a Rodrigo Alvim pediu a
lista de suas recomendações e reivindicações.
O deputado Padre João (PT) queixou-se de que muitos
produtores não têm condições de resfriar o leite nos tanques
adequados por lhes faltar até mesmo energia elétrica nas
propriedades. "Falta energia para 115 mil famílias rurais mineiras.
Há dois anos a Cemig não faz uma única ligação de eletricidade nos
programas subsidiados para consumidores rurais", revelou.
Padre João discutiu também os critérios de
aquisição do Programa de Aquisição de Alimentos, já que Alvim havia
informado que o Governo Federal compra leite apenas no Nordeste e na
área mineira da Sudene. Segundo o parlamentar, o programa
inicialmente não podia comprar leite, que não constava da cesta
básica, mas agora pode comprar de qualquer produtor, com a exigência
de que haja inspeção municipal. Padre João é favorável à compra de
leite para a merenda escolar, para sua inclusão nos programas
sociais e também para que seja feita uma ampla campanha de marketing
voltada para os países que importam o produto do Brasil.
Presenças - Deputados
Vanderlei Jangrossi (PP), presidente; Padre João (PT),
vice-presidente; Chico Uejo (PSB) e Getúlio Neiva (PMDB).
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