Polêmica marca debate sobre delimitação de áreas de
preservação
Opiniões divergentes marcaram a audiência da
Comissão de Meio Ambiente e Recursos Naturais da Assembléia
Legislativa de Minas Gerais que discutiu, nesta quarta-feira
(26/11/08), o projeto que dispõe sobre a abrangência e delimitação
de áreas de preservação permanente (APPs) de represas hidrelétricas.
De um lado, produtores rurais e alguns parlamentares defenderam o
Projeto de Lei (PL) 2.307/08, afirmando que ele vai possibilitar o
desenvolvimento com sustentabilidade. De outro, Ministério Público e
Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda) afirmaram que o
projeto esbarra em norma federal sobre o assunto.
Segundo a Resolução 302, de 2002, do Conselho
Nacional de Política Ambiental (Conama), a APP no entorno de
reservatórios artificiais em área rural deverá ser de 100 metros a
partir do nível máximo do lago criado pela usina hidrelétrica. Nas
áreas urbanas, a exigência é de 30 metros. Já o PL 2.307/08
determina que as APPs terão largura de 30 metros. Segundo a
resolução do Conama, os limites em vigor poderão ser aumentados ou
reduzidos, observando-se o patamar mínimo de 30 metros. Ainda
segundo essa norma federal, se houver a redução do limite, esta
deverá ser tecnicamente justificada e estar estabelecida no
licenciamento ambiental do empreendimento, além de precisar seguir
as determinações do plano de recursos hídricos da bacia.
Vários produtores rurais participaram da reunião,
entre eles lideranças de algumas das 34 cidades que integram a
Associação dos Municípios do Lago de Furnas (Alago), entre elas
Capitólio, Fama, Alfenas, Cássia, Carmo do Rio Claro, Ibiraci e
Passos. Dois dos três autores do projeto, deputados Domingos Sávio
(PSDB) e Antônio Carlos Arantes (PSC), defenderam que a ALMG tem
competência para legislar sobre o tema, dar um fim à insegurança
jurídica e fixar limite viável para as APPs. Já o deputado Almir
Paraca (PT), relator na comissão e autor do requerimento da reunião,
defendeu que se aprofunde o debate, com a análise das sugestões
feitas nesta quarta (26). Ele informou que apresentará emenda ao
projeto, cujo terceiro autor é o deputado José Henrique
(PMDB).
Tramitação - O PL 2.307/08
foi distribuído às Comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de
Meio Ambiente. Na primeira comissão, recebeu parecer pela
constitucionalidade, sem emendas. Ele não será apreciado agora pela
Comissão de Meio Ambiente, pois requerimento deferido em Plenário,
apresentado pelos autores, determina sua inclusão na pauta de
Plenário para análise em 1º turno. Isto porque não foi apreciado
pela segunda comissão no prazo estipulado.
Convidados fazem sugestões e produtores rurais
pedem intervenção da ALMG
Os autores do PL 2.307/08, deputados Antônio Carlos
Arantes e Domingos Sávio, afirmaram que a situação atual é de
restrição à atividade rural e ao desenvolvimento turístico de
regiões como a do Lago de Furnas, com a aplicação reiterada de
multas pelo Ministério Público sob a alegação de descumprimento da
legislação. Para eles, o produtor vive um dilema, pois quer
preservar o meio ambiente mas é instigado a arrancar sua lavoura,
dados os limites impostos hoje para as APPs. Para Sávio, a ALMG
precisa dar uma solução urgente para o problema. Na avaliação de
Arantes, mesmo o projeto não tendo sido apreciado nessa fase pela
Comissão de Meio Ambiente, a audiência pública foi de fundamental
importância para reunir as sugestões dos segmentos interessados.
Entre as sugestões está a do Instituto Estadual de
Florestas (IEF), apresentada pelo técnico Luiz Carlos Cardoso Vale e
apoiada pelo diretor-geral, Humberto Candeias Cavalcanti, presente
ao debate. A proposta é de que seja adotada a faixa de 30 metros
para a APP até que o plano de recursos hídricos da bacia seja
aprovado; e que seja recuperada essa área de preservação permanente,
que é imune de corte e de qualquer intervenção. Segundo Vale, isso
significaria, nos 3,5 mil quilômetros do perímetro do Lago de
Furnas, recuperar mais de 15 mil hectares de áreas hoje
desprotegidas.
A sugestão da assessora jurídica da Amda, Cristina
Chioddi, é de que seja criado um grupo de trabalho com todos os
segmentos, a fim de buscar uma solução eficaz. Ela enfatizou que a
resolução do Conama não engessa a atividade produtiva e seria um
grave equívoco criar uma nova lei com uma determinação única para
todos os reservatórios. Na avaliação de Chioddi, ficou claro que o
projeto foi apresentado para resolver um problema concreto, que é a
criação do Lago de Furnas. A sugestão da Amda é que seja buscado o
licenciamento de Furnas, pois na época da construção da hidrelétrica
não havia esse instituto. "Houve uma socialização do ônus pela
criação do lago e os bônus ficaram restritos ao empreendedor",
lamentou ela, em solidariedade aos produtores.
Reivindicações - Vários
produtores buscaram o apoio dos parlamentares e elogiaram o PL
2.307/08, entre eles o prefeito de Fama e presidente da Alago,
Ângelo Henrique Saksida. Ele relatou o passivo ambiental e social
provocado pela construção da hidrelétrica e afirmou ser impossível
cumprir a resolução do Conama. "Como iremos demolir loteamentos
aprovados há anos à beira do lago?", questionou. O prefeito de
Alfenas, Pompílio Canavez, fez coro às queixas, enfatizando que o
rigor da fiscalização impõe pesadas multas aos produtores rurais.
Domingos Inácio Salgado, do Sindicato Rural de Cássia, condenou a
definição arbitrária dos limites na resolução do Conama, além de
cobrar que todos os segmentos interessados se empenhem para resolver
o problema.
Já o assessor jurídico do Centro de Apoio
Operacional das Promotorias de Defesa do Meio Ambiente, Patrimônio
Cultural, Habitação e Urbanismo, Luciano José Alvarenga, reiterou as
palavras da representante da Amda. Apesar de destacar o mérito do
projeto de visar ao desenvolvimento sustentável, acentuou que a
resolução do Conama já se encarrega de promover o equilíbrio entre
esse desenvolvimento e a conservação ecológica. A cobrança por
segurança jurídica foi enfatizada pelo diretor-geral do IEF, que
defendeu o cumprimento da Lei 14.309, de 2002, que instituiu a
política florestal em Minas.
Deputados têm diferentes opiniões sobre o
projeto
Os parlamentares tiveram opiniões divergentes sobre
o PL 2.307/08. Além dos autores, os deputados Neider Moreira (PPS) e
Antônio Júlio (PMDB) apoiaram a iniciativa. Para Moreira, o projeto
resgata a prerrogativa do Parlamento de legislar, que na opinião
dele tem sido exercida por conselhos e pela Justiça. Com severas
críticas ao rigor da fiscalização tanto do governo quanto do
Ministério Público, o deputado Antônio Júlio apoiou as palavras de
Moreira e defendeu ampla mobilização para aprovar o projeto.
Os deputados Almir Paraca e Fábio Avelar (PSC),
vice-presidente da comissão, cobraram cautela na análise da
proposição e enfatizaram a importância da audiência, que reuniu
sugestões e pode ajudar os parlamentares a formar uma opinião sobre
o tema. "A questão não é simples, por mais que compreendamos a visão
do produtor, que teme a ação do IEF, do Ministério Público e da
Polícia Florestal", acentuou Paraca. O deputado Fábio Avelar
destacou que não é contra o projeto, mas sim a favor de buscar
segurança jurídica para resolver o problema. Um de seus
questionamentos diz respeito à fixação do limite de 30 metros para a
APP, conforme determina o PL 2.307/08. "E as regiões que precisam de
uma área de preservação maior que essa?", pontuou.
O presidente da comissão, deputado Sávio Souza Cruz
(PMDB), avaliou que uma solução para o caso é forçar, com o peso
político de Minas, um licenciamento corretivo dos lagos artificiais,
com a delimitação de APPs que não precisam ter a mesma extensão. Ele
lembrou que os entornos dos lagos são heterogêneos e que essas
diferenças devem ser tratadas na fase do licenciamento ambiental de
cada empreendimento. Na avaliação de Souza Cruz, uma nova lei seria
trocar um problema por outro e poderia ensejar novas ações na
Justiça e argüições de constitucionalidade.
Polêmica - O presidente da
CCJ, deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), que relatou a proposição
naquela comissão em junho, explicou que deu seu parecer sem a
resposta do governo a informações solicitadas formalmente em
diligência. Informado nesta quarta (26) de que a resposta chegou
agora à Assembléia, ele pediu, por meio de requerimento aprovado,
que o PL 2.307/08 retorne à comissão.
A resposta da Secretaria de Estado de Meio Ambiente
e Desenvolvimento Sustentável (Semad) também gerou polêmica na
reunião. O posicionamento do governo, em resposta à diligência, foi
contrário ao projeto. No entanto, nota técnica interna do IEF teria
posição favorável à matéria, apesar de fazer menção à norma federal.
Para o deputado Domingos Sávio, a resposta à diligência não teria
validade, tendo em vista a posição do IEF. Já o deputado Fábio
Avelar declarou-se preocupado com o fato e cobrou explicações.
O deputado Dalmo Ribeiro Silva sugeriu ainda a
criação de uma frente parlamentar em defesa do Lago de Furnas,
informando que já apresentou à Presidência da ALMG requerimento
nesse sentido. Também apresentou nesta quarta (26) requerimento
cobrando da Mesa a instalação da frente, que foi aprovado.
Outros requerimentos aprovados - A comissão aprovou requerimentos dos deputados: Dalmo Ribeiro
Silva, para que o PL 1.654/07 seja colocado na pauta do Plenário;
Délio Malheiros (PV), de audiência para discutir decreto federal que
altera outro que dispõe sobre a proteção das cavidades naturais
subterrâneas existentes no território nacional; Gilberto Abramo
(PMDB), de audiência com a CCJ para discutir o projeto que altera a
área da Estação Ecológica do Cercadinho; Sávio Souza Cruz (PMDB), de
informações à Semad quanto à indenização ou realocação de produtores
rurais cujas propriedades sejam marginais ao Rio Doce e situadas
entre o barramento e a casa de força, no trecho de vazão reduzida da
Usina Hidrelétrica Eliezer Batista, em Aimorés, tendo em vista
denúncia de Edward Vasconcellos.
Presenças - Deputados
Sávio Souza Cruz (PMDB), presidente; Fábio Avelar (PSC), vice; Almir
Paraca (PT), Inácio Franco (PV), Antônio Carlos Arantes (PSC),
Neider Moreira (PPS), Domingos Sávio (PSDB), Luiz Humberto Carneiro
(PSDB) e Dalmo Ribeiro Silva (PSDB).
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