Debate sobre Serra da Calçada reúne 200 pessoas em Comissão
Especial
Em sua primeira reunião com convidados, nesta
terça-feira (4/11/08), a Comissão Especial das Serras da Calçada e
da Moeda ouviu moradores da região e representantes da indústria
mineral, entidades ambientalistas e órgãos oficiais em busca de
compatibilizar projetos econômicos e de conservação para a região,
localizada ao sul de Belo Horizonte, estendendo-se até o município
de Belo Vale. A presença de 200 moradores, estudantes e outros
interessados que lotaram o Teatro da Assembléia Legislativa de Minas
Gerais foi saudada pelo presidente da comissão, deputado Sávio Souza
Cruz (PMDB), como testemunho da importância do tema, que hoje é
tratado por três proposições no Legislativo mineiro.
Na reunião desta terça (4), um dos destaques foi a
apresentação da Associação para Recuperação e Conservação Ambiental
da Serra da Calçada (Arca Amaserra), que descreveu o patrimônio
natural, cultural, turístico, paisagístico e arqueológico desta
área, que é uma ramificação da Serra da Moeda, situada nos
municípios de Brumadinho e Nova Lima, nas proximidades do condomínio
Retiro das Pedras e do distrito de Casa Branca. A presidente da
entidade, Jeanine Baraillon, defende a preservação integral da Serra
da Calçada, que abriga, entre outras riquezas, vestígios
arqueológicos da exploração de ouro no século 19.
Por outro lado, o presidente do Sindicato da
Indústria Mineral (Sindiextra), José Fernando Coura, apresentou à
comissão oficialmente o trabalho "Patrimônio natural-cultural e
zoneamento ecológico-econômico da Serra da Moeda". O relatório, que
também abrange a Serra da Calçada, é o ponto de partida para uma
proposta de conciliar a exploração do potencial econômico e mineral
da região e a preservação de seu patrimônio natural e histórico.
As diferentes propostas para a região se refletem
em três proposições legislativas apresentadas na ALMG, com impacto
potencial nas Serras da Calçada e da Moeda. O Projeto de Lei (PL)
124/07, de autoria do deputado Ivair Nogueira (PMDB), reduz em 6,5%
a área do Parque Estadual da Serra do Rola-Moça; o PL 1.304/07, de
autoria do deputado Délio Malheiros (PV) - anexado ao projeto do
deputado Ivair Nogueira -, integra a Serra da Calçada à área do
Parque do Rola-Moça; e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC)
16/07, de autoria do deputado Dalmo Ribeiro (PSDB), propõe o
tombamento de toda a Serra da Moeda, cadeia de montanhas de
aproximadamente 70 quilômetros que vai do sul de Belo Horizonte a
Belo Vale.
Serra da Calçada está em processo de
tombamento
O tombamento provisório da Serra da Calçada pelo
Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha), em
junho de 2008, foi o episódio que intensificou o debate a respeito
do destino da região. De acordo com a vice-presidente do Iepha,
Maria Marta Araújo, o tombamento é resultado de um levantamento
iniciado em 1985, de inventário do patrimônio cultural da área. A
expectativa, segundo ela, é de que o processo de tombamento, hoje
provisório, seja concluído em 2009.
Boa parte da área tombada é de propriedade da
empresa mineradora Vale, que já realizou sondagens na área que
revelaram grande potencial para a exploração de minério de ferro. Ao
mesmo tempo que confirma o interesse econômico do setor na região, o
presidente do Sindiextra, José Fernando Coura, afirmou que as
empresas interessadas têm compromisso com a preservação do
patrimônio natural e histórico. Ele argumentou que o Forte de
Brumadinho, um dos principais vestígios arqueológicos da área, só
existe ainda porque está em área de propriedade das empresas. "75%
da área é de propriedade da indústria mineral. Só por isso está
preservada", afirmou Coura.
A importância natural e histórica da Serra da
Calçada foi resumida por Marco Aurélio Costa, representante da
entidade Arca Amaserra. O Forte de Brumadinho, segundo ele, era uma
fazenda cercada de vestígios de lavra de ouro e calçadas de pedra,
que tinham o objetivo de facilitar o trânsito entre as bacias dos
rios Paraopeba e Velhas na época colonial. O patrimônio histórico
também inclui vestígios pré-coloniais, tais como pinturas rupestres
em vários pontos da serra. Do ponto de vista do patrimônio natural,
o destaque é para a vegetação dos campos ferruginosos, com uma
biodiversidade comparável à da Mata Atlântica, com espécies
endêmicas e em risco de extinção.
Costa lembrou ainda a importância da serra como
manancial de água para abastecimento da Região Metropolitana de Belo
Horizonte. Segundo ele, o Instituto Estadual de Florestas (IEF) tem
um projeto de criação de uma unidade de conservação que transforme
toda a Serra da Calçada em monumento natural de Minas Gerais. O
representante da Arca também elogiou uma proposta, que segundo ele
partiu da Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, de
implantação do Geosítio, que implicaria na criação de um museu a céu
aberto na área e organização de um laboratório de pesquisas em
parceria com a UFMG e PUC Minas.
Justiça proibiu sondagens minerais na área
O promotor Marcus Paulo de Souza Miranda,
coordenador da Promotoria Estadual de Defesa do Patrimônio Cultural
e Turístico, contestou o argumento de que a indústria mineral tem
contribuído para a conservação da Serra da Calçada. Segundo ele, a
mineradora MBR, hoje de propriedade da Vale, atuou no sentido de
revogar decreto do município de Brumadinho que constituiu área de
conservação na região, em 2000.
Desde o 1º semestre de 2007, o Ministério Público
começou a apurar denúncias de que mineradoras estavam fazendo
sondagens clandestinas na região, que também seria alvo de
depredações de motoqueiros. "De fato, constatamos 93 perfurações com
até 200 metros de profundidade, abertura de estradas e retirada de
vegetação", afirmou. Por meio de ação cautelar, o Ministério Público
conseguiu liminar da 7ª Vara da Fazenda Pública Estadual que proibiu
a realização de sondagens minerais. A liminar foi depois confirmada
pelo Tribunal de Justiça e hoje o Ministério Público já reivindica,
por meio de ação civil pública, a recuperação das áreas afetadas e
pagamento de indenização pelos danos gerados.
O deputado Dinis Pinheiro (PSDB) defendeu a
conciliação entre os objetivos de preservação das riquezas naturais
e históricas, a geração de empregos e o crescimento econômico. "Nada
melhor do que uma reunião como esta, uma oportunidade para, sem
radicalismos, defendermos o desenvolvimento sustentável", afirmou
Pinheiro. Dalmo Ribeiro Silva elogiou a iniciativa do deputado Fábio
Avelar (PSC), autor do requerimento para criação da Comissão
Especial. Ele ressaltou a participação intensa da população no
debate, em especial dos jovens, como um exemplo de exercício da
cidadania. Como relator da matéria, ele garantiu que seus estudos
serão bastante profundos.
O deputado Fábio Avelar (PSC) lembrou que três
integrantes da comissão também são membros da Comissão de Meio
Ambiente e Recursos Naturais da ALMG: ele próprio, Sávio Souza Cruz
e Almir Paraca (PT), pessoas que têm muita vivência nas questões
ambientais e já debateram o tema da Serra da Calçada. Ele ficou
satisfeito por perceber, na reunião, a vontade de todos os setores
envolvidos de debater a questão. Avelar elogiou também a proposta
apresentada pelo Sindiextra. Para o deputado Délio Malheiros (PV), o
relatório final da comissão vai culminar na aprovação da proposta
apresentada por ele, no PL 1.304/07, que foi anexado.
Ao finalizar a reunião, o deputado Sávio Souza Cruz
disse que a participação ativa das pessoas interessadas deve ser uma
regra nas reuniões da comissão, e não uma exceção. Por isso,
acredita que agiu corretamente ao transformar a reunião ordinária em
uma audiência pública. Segundo ele, o estudo oferecido pelo
Sindiextra está disponível a todos os interessados.
Outra documentação apresentada na reunião desta
terça-feira (4) foi um abaixo-assinado de 40 mil pessoas em favor do
tombamento da Serra da Moeda, proposta pela PEC de autoria de Dalmo
Ribeiro. O documento foi apresentado pelo diretor de Meio Ambiente
da Associação dos Condomínios Horizontais, Renato Rossi, que também
apresentou estudo sobre o potencial turístico da região, realizado
pelo Senac.
Na próxima terça-feira (11), a comissão realiza um
debate sobre a Serra da Moeda. No dia 18 de novembro, haverá uma
discussão sobre as três proposições (PLs 124/07 e 1.304/07 e PEC
16/07) que tramitam na Assembléia.
Presenças - Deputados Sávio
Souza Cruz (PMDB), presidente da comissão; Dalmo Ribeiro Silva
(PSDB), Fábio Avelar (PSC), Dinis Pinheiro (PSDB), Célio Moreira
(PSDB), Délio Malheiros (PV), Sebastião Costa (PPS) e Gil Pereira
(PP). Também participaram da reunião o diretor de Mineração da
Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Newton Reis de
Oliveira Luz; a assessora jurídica da Associação Mineira de Defesa
do Meio Ambiente (Amda), Cristina Chiodi; a coordenadora do Centro
de Apoio Operacional do Meio Ambiente, promotora Shirley Fenzi
Bertão; o gerente-geral do Parque Estadual da Serra do Rola-Moça,
Edmar Monteiro; e o professor José Eustáquio Machado de Paiva,
representante da Associação dos Condomínios Horizontais.
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