Jornalista José Cleves diz que vai cobrar reparação moral e
material
A Comissão de Direitos Humanos da Assembléia
Legislativa de Minas Gerais ouviu, nesta quarta-feira (17/9/08), o
jornalista José Cleves, absolvido em agosto pelo Superior Tribunal
de Justiça da acusação do assassinato da esposa, em 2000. Num
depoimento contundente, o jornalista mostrou como foram produzidas
provas fraudulentas que o levaram a ser processado e perder o
emprego no jornal Estado de Minas. Ele disse que vai pleitear
reparação por danos morais e materiais e reafirmou que o
indiciamento teve o objetivo de calar sua voz. "Vou cobrar por uma
questão de dignidade, para que o Estado cuide melhor de suas
instituições", disse ele, conhecido por denunciar a banda podre da
polícia, o comércio ilegal de armas e as máfias dos caça-níqueis e
do garimpo.
Acompanhado de um dos filhos, Cleves Henrique, o
jornalista teve o apoio do presidente da comissão, deputado Durval
Ângelo (PT), e do deputado João Leite (PSDB), que fizeram duras
críticas à imprensa pela cobertura do caso. "Cleves foi vítima de
perseguição policial, e a Justiça provou sua inocência em todas as
instâncias. A imprensa fez um pré-julgamento, com a divulgação
sensacionalista do fato. Foi uma cobertura anti-democrática e que
não se pautou pela ética", disse Durval Ângelo. Para o deputado João
Leite, a experiência e o sofrimento do jornalista demonstram que não
temos, efetivamente, uma imprensa livre. "Sempre imaginamos que
aquilo era uma perseguição; queriam calar uma voz competente e
vocacionada para a investigação", opinou ele.
Para José Cleves, várias instituições e segmentos
falharam no processo, como a Polícia Civil, o Ministério Público e a
imprensa. Assim como os parlamentares, ele criticou a mídia por ter
adotado a prática do jornalismo declaratório e denuncista, sem o
exercício do contraditório. O Ministério Público foi bastante
questionado. Na opinião de Cleves, o promotor Guilherme Pereira
Vale, que formulou a denúncia, baseou-se tão somente em reportagem
veiculada pela Rede Globo, também criticada pela ausência do
contraditório. "Será que o promotor leu o processo?", indagou José
Cleves, para quem não falharam a Justiça, as comissões de Direitos
Humanos da ALMG e do Congresso Nacional, a Ordem dos Advogados do
Brasil e o Sindicato dos Jornalistas.
Para entender - José
Cleves foi acusado de matar a tiros sua mulher, Fátima Aparecida de
Abreu Silva, em 10 de dezembro de 2000. Segundo carta enviada pelo
jornalista à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados,
no dia do crime dois homens abordaram o carro do casal no bairro
Camargos, em Belo Horizonte, e os obrigaram a ir para um local ermo.
Ali, roubaram R$ 500 em dinheiro e executaram Fátima com três
tiros.
Poucos dias depois, Cleves foi indiciado pelo
delegado Édson Moreira, então chefe da Divisão de Crimes contra a
Vida, como autor do crime. O indiciamento se baseou na localização
de um revólver calibre 38 que pertencia ao cabo Natalício Ramos, do
Serviço Secreto da Polícia Militar. O delegado argumentou que Cleves
teria comprado a arma do militar, mas nenhuma prova dessa negociação
foi apresentada. Além disso, Cleves - que sempre foi apoiado pelos
filhos e pela família da mulher - relatou vários outros erros
grosseiros na apuração do fato, cometidos com a intenção de
incriminá-lo.
Na reunião desta quarta (17), o jornalista
classificou de fraude grotesca do inquérito policial a menção à
arma. Segundo o auto de apreensão, ela foi encontrada em cima de uma
pedra. Mas a foto que deveria acompanhar o laudo de levantamento do
local do crime foi rasgada, segundo Cleves, sendo colocada outra,
que mostra a arma sobre um pano preto, com o intuito de insinuar o
uso de uma luva pelo jornalista. "Lia-se uma coisa e se via outra",
denunciou. Na opinião dele, se o Ministério Público e a imprensa
tivessem folheado o processo, teriam constatado todas as provas de
sua inocência, conforme foi explicitado por sua defesa no
julgamento.
Parceria - Os deputados
Durval Ângelo e João Leite destacaram que reportagens de José Cleves
inspiraram ações da Assembléia de Minas. Entre elas, a denúncia da
existência de máfia que facilitava a liberação de carteiras de
habilitação em Minas e que motivou a instauração de uma comissão
parlamentar de inquérito. Sobre esse assunto, o jornalista destacou
que sempre pautou sua atuação pela parceria com o Legislativo e o
Ministério Público, entre outras instituições. Para ele, um deputado
ou promotor sozinhos, sem a mídia, conseguem pouco. "É preciso
conjugar esforços, dividir responsabilidades", opinou.
Protesto - A diretora do
Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais, Vera Godoy,
pediu a mobilização de toda a sociedade a favor do diploma e da
formação específica para o exercício da profissão. Várias cidades
promovem, nesta quarta (17), manifestações em defesa da
regulamentação profissional do jornalista, a fim de sensibilizar o
Supremo Tribunal Federal (STF), que votará em breve ação que
questiona a exigência do diploma. Também nesta quarta (17), os
abaixo-assinados coletados em todo o País serão entregues aos
ministros do Supremo.
Fazendo referência ao caso de José Cleves, Vera
Godoy disse que, com a ação que tramita no STF, querem "calar a boca
de todos os jornalistas". Ela informou que a ação é encabeçada pelo
jornal Folha de S.Paulo e conta com o apoio de outros grupos
de mídia.
Presenças - Participaram
da reunião os deputados Durval Ângelo (PT), que a presidiu
inicialmente; e João Leite (PSDB), que também conduziu os
trabalhos.
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