Toxicidade de hortifrutigranjeiros aumenta no
País
O Brasil é o 2º maior consumidor de agrotóxicos do
mundo. Substâncias químicas de alta toxicidade proibidas na Europa,
Estados Unidos e recentemente na China e Índia tiveram seu consumo
triplicado no Brasil, no ano passado. Essas foram algumas
informações prestadas pela gerente de Normatização e Avaliação da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Letícia Rodrigues
da Silva, à Comissão de Saúde da Assembléia Legislativa de Minas
Gerais, nesta quarta-feira (9/7/08). A comissão realizou audiência
pública em conjunto com as Comissões de Defesa do Consumidor e do
Contribuinte e de Política Agropecuária e Agroindustrial, a pedido
dos deputados Carlos Mosconi (PSDB), presidente da primeira; Délio
Malheiros (PV) e Vanderlei Jangrossi (PP), presidentes da segunda e
da terceira comissões, respectivamente.
O objetivo da audiência foi discutir os resultados
apresentados pelo Programa de Análise de Resíduos Agrotóxicos em
Alimentos (Para-2007) da Anvisa, publicados em abril. Os resultados
apontam para números alarmantes no que se refere às amostras de
tomate, morango e alface, alimentos campeões em resíduos
agrotóxicos. De acordo com o Para, que é realizado nacionalmente
desde 2002 em colaboração com secretarias de saúde dos Estados, os
problemas detectados na análise das amostras foram teores de
agrotóxicos acima do permitido, bem como presença de substâncias não
autorizados para essas culturas.
A gerente da Anvisa, Letícia Rodrigues, destacou
que o tomate foi o que mais apresentou toxicidade. Das 123 amostras
analisadas, 55 apresentaram resíduos tóxicos acima do permitido, o
equivalente a 44% das amostras. Nas .94 amostras de morango foi constatada toxicidade em
41, ou 43% delas. Nas 135 amostras de alface, foram encontrados
resíduos tóxicos em 54, ou 40% delas. O Para avaliou também outros
alimentos, como batata, maçã, banana, mamão, cenoura e laranja. A
batata e a maçã tiveram redução no número de amostras com resíduos
de agrotóxicos.
Enquanto a pesquisa nacional mostrou o aumento de
toxicidade nas três culturas, produtos analisados em Minas Gerais
apresentaram diminuição de toxicidade, de acordo com a gerente de
Vigilância Sanitária de Alimentos da Secretaria de Estado de Saúde
(SES), Cláudia Parma Machado. Segundo ela, enquanto no caso do
tomate na pesquisa nacional houve a presença de resíduos em 44% das
amostras, no Estado essa porcentagem foi de 34%. No morango foi de
33%, e na alface, de 22%.
Brasil virou cemitério de agrotóxicos com
colaboração da Justiça
De acordo com a representante da Anvisa, o mercado
de agrotóxicos no Brasil movimentou no ano passado R$ 5,3 bilhões.
"Houve um salto decorrente da invasão do mercado brasileiro em
função do endurecimento da legislação em outros países", declarou
Letícia Rodrigues. Esses valores, segundo ela, referem-se à entrada
legal, fora o que entra ilegalmente, estimado em 10% desse valor. A
situação levou o deputado Délio Malheiros a classificar o Brasil
como o "cemitério dos agrotóxicos". "Tudo que é lixo lá fora vem
para cá, como acontecia em décadas passadas com outros produtos",
disse Malheiros.
Letícia Rodrigues criticou a ação de juízes que vêm
liberando o uso de produtos em reavaliação na Anvisa, mediante ações
judiciais das empresas. Ela explicou que mesmo produtos autorizados
pela agência devem ser reavaliados periodicamente quanto à
toxicidade, segundo prevê a legislação sobre o assunto. "Só que
estamos impedidos de fazer a reavaliação que poderia retirar do
mercado muitos produtos com toxicidade comprovada por novos estudos,
porque a Justiça concede liminares impedindo o procedimento e ainda
mantendo o caso sob desconhecimento da população, pela decretação de
segredo de justiça".
Délio Malheiros lembrou que o juiz não pode ser
culpado se a legislação é frágil. E disse que as multas aplicadas
por diversos órgãos não são aceitas no Judiciário porque são
amparadas em decretos e portarias, enquanto deveriam ser amparadas
em leis. Mas a gerente da Anvisa contestou o deputado, afirmando que
os instrumentos usados por advogados das empresas são muito novos,
como o direito de imagem. "As liminares são concedidas pelos juízes
sob a alegação das empresas de que a reavaliação de tal produto fere
sua imagem", lamentou Letícia Rodrigues.
Manipuladores do agrotóxico são os principais
prejudicados
A representante da Anvisa, a da Secretaria de Saúde
e os deputados reconheceram que os trabalhadores na agricultura são
os mais prejudicados pelo uso de agrotóxicos. "Eles são os mais
expostos a doenças como câncer de vários tipos, doenças neurológicas
e taratogênicas (deformação de fetos)", afirmou Cláudia Parma, da
SES.
Mas há prejuízo também para a população e para o
meio ambiente, conforme destacou o gerente da Defesa Sanitária
Vegetal do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), Nataniel Diniz
Nogueira. "O comprometimento da segurança alimentar e do meio
ambiente, além da segurança do trabalhador, só pode diminuir com a
mudança de comportamento dos agricultores". Ele disse que o IMA já
vem fazendo sua parte com o programa de recebimento de embalagens de
agrotóxicos, que coloca Minas no 4º lugar no ranking
brasileiro de retorno de embalagens.
O presidente da Associação dos Produtores de
Hortifrutigranjeiros de Minas Gerais, Antônio Lopes Rodrigues,
garantiu que o produtor é um dos mais prejudicados, pois além de
sofrer com a contaminação, ainda vê seu produto desvalorizado quando
são divulgadas as pesquisas sobre toxicidade. Ele garantiu que os
produtores usam somente o que é recomendado pelo agrônomo, conforme
exige a legislação. Já a bioquímica do IMA, Eliane Hooper Amaral,
chamou atenção para o problema das pequenas culturas, como pepino,
que não têm uma substância autorizada em seu cultivo, levando ao uso
de substâncias de outros produtos, o que gera novos problemas. O
mesmo ponto de vista foi manifestado por Nataniel Diniz em relação
ao cultivo de jiló, cebolinha, chuchu e salsa.
Convidados e deputados fazem recomendações
A representante da
Secretaria de Saúde disse que o consumidor não pode fazer nada para
diminuir a toxicidade dos alimentos, apesar de recomendar a
higienização com água e sabão e água sanitária. "Mas isso só resolve
em parte o problema, pois é uma ação que não atinge agrotóxicos que
têm ação direta na molécula do alimento".
A Anvisa sugere e incentiva programas de
rastreamento de origem dos produtos nos Estados. "Pernambuco fez
isso com o morango que importava do Espírito Santo, onde havia alta
concentração de agrotóxicos", disse Letícia Rodrigues. Em Minas, a
SES se prepara para desenvolver esse rastreamento, mudando a coleta
de amostras do Para dos supermercados de Belo Horizonte, como é
feito hoje, para a Ceasa, onde se concentra a produção de todas as
cidades mineiras e de outros Estados.
Para o deputado Carlos Mosconi, a solução é a
conscientização do produtor. Ele criticou a coleta de amostras só em
Belo Horizonte e apresentou um requerimento, não votado, para pedir
à Secretaria de Saúde que a amostragem seja feita com produtos
coletados também em supermercados do interior. O deputado Antônio
Carlos Arantes (PSC) disse que a realidade do agrotóxico é muito
diferente do que exige a lei. "Só quem nunca trabalhou numa lavoura
sabe o desconforto daquela roupa de aplicação sob um sol de 35
graus". Para ele, é preciso investimentos em educação rural e
fortalecimento de órgãos técnicos como Emater e IMA.
Délio Malheiros recomendou mudanças na legislação,
por exemplo no capítulo de penalidades, enquanto Vanderlei Jangrossi
pediu que a divulgação sobre os malefícios dos agrotóxicos seja
permanente, num projeto de capacitação constante de produtores e
trabalhadores.
Presenças - Deputados
Carlos Mosconi (PSDB), presidente da Comissão de Saúde e que
conduziu a reunião; deputados Vanderlei Jangrossi (PP) e Délio
Malheiros (PV), presidentes das Comissões de Política Agropecuária e
de Defesa do Consumidor, respectivamente; deputados Hely Tarqüínio
(PV), Carlos Pimenta (PDT), Doutor Rinaldo (PSB), Antônio Carlos
Arantes (PSC) e Getúlio Neiva (PMDB).
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