Setor produtivo e fiscais fazem críticas à reforma
tributária
Críticas à proposta de reforma tributária do
governo federal que tramita no Congresso foram novamente ouvidas
pelos deputados que integram a Comissão Especial da Reforma
Tributária da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, na terceira
reunião com convidados, nesta quarta-feira (14/5/08). Representantes
do setor sucro-alcooleiro e dos fiscais de tributos consideraram a
proposta um remendo, sem mudança substancial do modelo tributário em
vigor. O Executivo estadual classificou como ofensa ao pacto
federativo o fato de as assembléias não poderem mais legislar sobre
o ICMS. Já a Fiemg, federação das indústrias, demonstrou preocupação
com a chamada "tributação por dentro", mas avaliou o momento atual
como ideal para uma reforma inteligente.
A reunião que ouviu sete pessoas foi solicitada
pelos deputados Antônio Júlio (PMDB), relator; Zé Maia (PSDB) e
Lafayette de Andrada (PSDB). Antônio Júlio e Andrada solicitaram que
os convidados encaminhem depois, com detalhes, suas sugestões à
Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 233/08, do presidente Lula -
anexada à PEC 31/07, do deputado Virgílio Guimarães, já ouvido pela
comissão. De acordo com o presidente da comissão especial da ALMG,
deputado Sebastião Helvécio (PDT), a meta é agilizar os trabalhos
para apresentar, até junho, o relatório final à comissão especial
que analisa o tema no Congresso. Caso não haja tempo de encaminhar o
relatório final, as propostas serão levadas a Brasília
antecipadamente.
O deputado Sebastião Helvécio pediu sugestões
concretas para conceituar a não cumulatividade dos impostos. "Esta é
a maior dificuldade jurídica na apreciação do ICMS", destacou,
lembrando que a falta de definição acaba levando conflitos para a
Justiça. O contencioso hoje seria de R$ 28 bilhões. O coordenador de
Política Tributária da Secretaria de Estado de Fazenda (SEF),
Ricardo Luiz Oliveira de Souza, avalia que a não cumulatividade do
ICMS é o ponto nevrálgico da PEC. Ou seja: definir o que gera ou não
crédito referente à operação anterior em relação ao que poderá ser
deduzido da operação subseqüente na venda de produtos e serviços.
Ele sugeriu que sejam admitidos como créditos apenas os produtos e
serviços que têm alguma relação intrínseca, ainda que indireta, com
o processo produtivo ou comercial da empresa.
O deputado Antônio Júlio defendeu que a comissão
apresente ao final do trabalho propostas concretas de mudança. Para
ele, em Minas há "ganância para tributar e dificuldade para
arrecadar". Somando-se às palavras dos convidados, o deputado
Lafayette de Andrada destacou a importância da audiência desta
quarta, realizada para escutar "a voz de quem sofre o problema na
pele".
Fiemg destaca oportunidade; fiscais cobram justiça
tributária e distribuição de renda
O presidente do Conselho de Política Tributária da
Fiemg, Edvaldo Almada de Abreu, fez duras críticas ao sistema
tributário atual, classificando-o como anacrônico e complexo e
destacando que ele gera insegurança jurídica e afugenta
investimentos. Lembrou a elevação da carga tributária - que era de
20%, em 1988, e agora está em 38%. Encarando o momento atual como
ideal para instituir mudanças inteligentes no sistema, a Fiemg
defendeu a redução gradativa da carga, com crescimento da economia,
e a não tributação da exportação, conforme ocorre em outros países.
A entidade também quer a acumulação de créditos de ICMS de forma
ampla e imediata.
Abreu demonstrou preocupação quanto à inserção, na
Constituição Federal, da expressão "tributação por dentro", quando o
tributo incide sobre o próprio tributo. Ele classificou esse
mecanismo como "não transparente e não peculiar no mundo dos
negócios". Elogiou, por outro lado, a intenção do governo federal de
simplificar o sistema.
Os fiscais foram bastante duros nas críticas. Luiz
Sérgio Fonseca Soares, do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais
da Receita Federal (Unafisco Sindical), considerou a PEC 233/08 "um
remendo tributário", afirmando que ela não se preocupa com a justiça
fiscal e com a melhoria da distribuição de renda do País. Ele
reforçou a fala da Fiemg sobre a tributação por dentro, avaliando-a
como "mágica indesejável e de mau gosto", e também disse que não se
pode exportar tributos. O presidente do Sindicato dos Fiscais e
Agentes Fiscais de Tributos de Minas Gerais (Sindfisco), Matias
Bakir, emendou os questionamentos, enfatizando que a preocupação do
governo foi só com a arrecadação. Sugeriu que seja realizada
audiência pública para aprofundar os debates.
Sonegação - Os
representantes dos fiscais enfatizaram que é preciso combater a
sonegação e a corrupção, caso contrário qualquer proposta de reforma
tributária será letra morta. O Sindfisco defende que seja inserido
no texto da PEC um capítulo específico sobre administração
tributária, fortalecendo o aparato de controle, fiscalização e
vigilância, bem como imprimindo competência no combate ao crime
organizado. "Os agentes econômicos e a administração tributária
devem funcionar bem, senão a nova lei poderá ficar na prateleira",
enfatizou Bakir.
Luiz Sérgio Fonseca Soares também ressaltou que é
preciso um fisco eficiente. Nesse sentido, declarou-se preocupado
com o risco de politização do fisco, "colocando-o a serviço do
governante do dia". Ele denunciou a transferência de atribuições do
fiscal para gestores, ocupantes de cargos em comissão. A denúncia
foi reforçada por Bakir, do Sindfisco.
Setor sucro-alcooleiro e SEF também encaminham
sugestões
A comissão também ouviu dois representantes do
Sindicato das Indústrias de Álcool e Açúcar (Siamig/Sindaçúcar). O
superintendente, Luciano Rogério de Castro Martins, e o advogado
José Eustáquio Passarini de Resende apresentaram sugestões. Martins
enfatizou que a concorrência predatória prejudica o setor e defendeu
um tratamento semelhante ao dos outros estados para a alíquota de
ICMS sobre o álcool. Para a entidade, a alíquota deve ser igual ou
inferior à menor alíquota aplicada aos combustíveis fósseis. "É
preciso um tratamento diferente", reivindicou.
Repetindo as palavras dos fiscais, o advogado do
sindicato enfatizou que a reforma foi produzida sob a ótica do
agente arrecadador, com premissas equivocadas e confusão de
conceitos. Um deles é o da simplificação. "Unificar a arrecadação
não é simplificar", criticou. Ele lembrou outros pontos
problemáticos: como se dará a aplicação do princípio do destino na
cobrança do ICMS; e o período de transição de sete anos para
implantação do novo ICMS. "Parece que, na reforma, o contribuinte é
um mero detalhe", concluiu Passarini.
Ricardo de Souza e Sara Costa Félix Teixeira,
técnicos da SEF que foram ouvidos na primeira reunião com
convidados, também apresentaram sugestões. Souza voltou a lembrar
que a PEC do governo é omissa quanto a aspectos como justiça fiscal
e distribuição de renda. Por isso, sugeriu que a tributação seja
mais efetiva e progressiva sobre o patrimônio. Também apresentou
como proposta a ampliação do aporte de recursos, via Fundo de
Equalização de Receitas (FER), para o ressarcimento das perdas que
os Estados venham a ter com a reforma tributária. Segundo ele, os
índices atuais são insuficientes para cobrir as perdas já calculadas
e outras. Já Sara Teixeira lembrou que as preocupações de todos são
coincidentes, o que facilita as soluções.
Saiba mais sobre a proposta
A proposta em tramitação no Congresso cria o
Imposto sobre Valor Agregado (IVA), um imposto federal; extingue
PIS/Pasep, Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social
(Cofins), Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide),
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e o
Salário-Educação, entre outros pontos. O IVA federal é um imposto da
União, que reunirá contribuições e incidirá sobre operações com bens
e serviços.
Segundo informações da SEF, também haverá um novo
ICMS, cujas alíquotas passarão a ser fixadas pelo Senado, em lei
complementar. Em seguida, o Colegiado dos Estados (grupo semelhante
ao Conselho de Política Fazendária, o Confaz, que reúne os
secretários estaduais de Fazenda) vai propor o enquadramento dos
produtos e serviços nas alíquotas. Caberia, então, ao próprio Senado
aprovar ou rejeitar essa proposta de enquadramento. Aos Legislativos
dos Estados restaria a atribuição de aumentar ou reduzir alíquotas
em alguns casos. E isto apenas depois que lei complementar definisse
quais produtos e serviços seriam passíveis de terem alíquotas
alteradas em nível estadual.
Agenda - No dia 21, a
comissão ouvirá o prefeito de Mariana, Celso Cotta Neto, que falará
à comissão sobre a realidade dos municípios e, em particular, dos
municípios mineradores. Também deverá ser ouvida nesta data a
Associação Nacional dos Municípios Mineradores.
Presenças - Deputados
Sebastião Helvécio (PDT), presidente; Antônio Júlio (PMDB), relator;
Lafayette de Andrada (PSDB), Weliton Prado (PT) e Almir Paraca (PT),
além dos convidados.
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