Superlotação em centro de internação de menores preocupa
deputados
Com capacidade para 67 internos, o Centro de
Internação Provisória (Ceip) Dom Bosco, localizado em Santa Tereza,
em Belo Horizonte, abriga hoje 140 adolescentes entre 12 e 17 anos.
A superlotação, conforme admitem os próprios dirigentes do órgão,
está inviabilizando as atividades de reeducação dos menores e
aumentando o risco de violência. A situação do Ceip foi conferida
pessoalmente pelos deputados que integram a Comissão de Participação
Popular da Assembléia Legislativa de Minas Gerais nesta quinta-feira
(17/4/08). Também foi visitada a Delegacia de Orientação e Proteção
à Criança e ao Adolescente (Dopcad), na Sagrada Família.
O assassinato de um menor em fevereiro de 2008 foi
a última ocorrência mais grave no Ceip, onde os internos precisam
ser divididos conforme as gangues em que se organizam. Os conflitos
que acontecem ali reproduzem as rivalidades de fora das grades.
Segundos dados do Estado, 20% dos internos são provenientes da Zona
Oeste da Capital e outros 12% são da Noroeste. Atualmente, 64% dos
menores são reincidentes.
Dentro do Ceip, o ambiente é pouco diferente de uma
prisão comum. Os alojamentos têm a aparência de celas, que teriam
capacidade para três pessoas. Cada uma abriga, no entanto, de cinco
a sete. Algumas salas de atividade reeducacional tiveram que ser
transformadas em celas por causa da superlotação. Também por esse
motivo, as atividades remanescentes foram reduzidas, e a única
atividade diária que todos os internos têm é meia hora de futebol
por dia. O tempo restante eles permanecem trancados em suas celas.
Alguns se queixam que não têm sequer um colchão. O motivo, segundo
explicou a diretora-geral Maria Gleide Souza, é que alguns internos
põem fogo em seus colchões, e nem todos podem ser substituídos. Por
isso, quem põe fogo pode ficar sem.
Não há refeitório no Ceip, e as refeições são
feitas nas celas. A principal reivindicação ouvida pelos deputados
André Quintão (PT) e João Leite (PSDB) é de maiores alternativas de
recreação. Os adolescentes pedem uma televisão ou pelo menos um
rádio de pilha. Dentro das celas, eles passam o tempo fumando. A
sala de televisão está sendo reformada para criação de duas novas
celas. As condições dos prédios também são precárias, e as
instalações passam agora por uma reforma elétrica e hidráulica, que
casa dificuldades adicionais.
Dificuldade para transferência agrava
superlotação
A Dopcad e o Ceip são os órgãos de entrada dos
menores infratores no sistema estadual de reeducação. Na delegacia,
esses menores permanecem por no máximo 24 horas, período em que a
maioria é liberada por não ser caso de internação. Os demais são
transferidos para o Ceip, onde devem ficar por até 45 dias, prazo
para a Justiça decidir se é caso de privação de liberdade ou não.
Segundo os dirigentes do Ceip, a decisão vem saindo no prazo. O
problema é que não há vagas suficientes em estabelecimentos para
cumprimento de medida socioeducativa, e os menores acabam
permanecendo no Ceip superlotado por 120 dias, em média.
Os parlamentares foram recebidos no Ceip Dom Bosco
pelo subsecretário de Estado de Atendimento às Medidas
Socioeducativas, Ronaldo Araújo Pedron. Segundo ele, o governo
reconhece a situação crítica do local, e se esforça para melhorar a
situação. Ele afirmou que hoje existem no Estado 1.026 vagas para
reeducação de menores infratores. Em 2003, eram 420. Outras três
unidades estão sendo construídas, uma delas na Capital. O problema
de superlotação estaria restrito ao Ceip Dom Bosco e, em menor grau,
à unidade destinada ao internamento provisório das meninas
infratoras.
De acordo com depoimento de garoto ouvido pelo
deputado André Quintão, a violência é uma forma que alguns garotos
utilizam para escapar do Ceip. Isso porque os internos com problemas
mais graves são transferidos rapidamente. E é isso que todos querem:
"pegar o bonde", ou seja, ser transferido. A superlotação no Dom
Bosco já foi pior. Em 2006, chegou-se a 220 internos. Em 2007, o
recorde foi 160. O problema se agrava, segundo o subsecretário, no
período de férias forenses, ainda que exista um plantão judiciário,
que não consegue atender a demanda.
A situação encontrada alarmou os parlamentares. "A
superlotação está clara, o que prejudica o projeto pedagógico e o
fluxo no estabelecimento. Também há uma permanência longa dos
internos, apesar da boa vontade da equipe, que testemunhamos. Só que
essa situação traz um problema de segurança até para a própria
equipe", avaliou André Quintão. O Dom Bosco conta com 105 agentes e
mais nove servidores de equipe técnica.
A Comissão de Participação Popular irá cobrar,
segundo Quintão, providências urgentes do Estado para enfrentar a
superlotação. "Vamos buscar, junto ao governo, uma saída de curto
prazo para aumentar o número de vagas. O Ceip é a porta de entrada.
Se ela é ruim, tudo fica muito mais difícil", afirmou Quintão. O
deputado João Leite afirmou que a comissão também irá atuar no
sentido de buscar verbas orçamentárias para apoiar políticas que
dêem suporte às famílias em situação de risco. "Temos que ter uma
atuação forte de proteção à família", afirmou o deputado.
Plantão interinstitucional poderia aliviar
situação
Outra cobrança dos deputados é a criação de um
plantão interinstitucional, que reunisse Polícia Civil, Defensoria,
Promotoria e Justiça. Isso agilizaria a liberação dos menores que
não estivessem envolvidos em delitos graves, reduziria a impunidade
e reincidência. Hoje, muitos menores menos perigosos são liberados
sob o compromisso de comparecer a uma audiência, mas a maioria
jamais retorna. O subsecretário Ronaldo Pedron disse que o Estado é
totalmente favorável ao plantão, até porque a Polícia Civil já o
realiza.
A visita dos deputados ao Ceip foi acompanhada pela
presidente da Associação dos Usuários, Consumidores e Contribuintes
(Aducon), Ilma Arruda Abreu, que havia solicitado providências da
Comissão de Participação Popular. O motivo, segundo Ilma, foi
relatório do Ministério Público que revelou a grave situação do
Ceip. "A gente espera que tanto o Executivo quanto o Legislativo e o
Judiciário priorizem a questão da criança e do adolescente",
afirmou.
Também vistoriada pelos deputados, a Dopcad mostrou
uma situação mais traqüila, até porque os menores não estão
permanecendo ali por mais que 24 horas. O lugar possui apenas quatro
celas, que já chegaram a abrigar, no passado, até 100 menores.
Segundo o delegado Dagoberto Alves Batista, passam pela delegacia
uma média de 30 menores por dia. No interior, o governo admite que
há o problema de permanência de menores em delegacias. De acordo com
Ronaldo Pedron, eram 300 em 2006 e 250 em 2007.
Presenças - Deputados
André Quintão (PT), presidente da comissão; e João Leite (PSDB).
Além das autoridades citadas na matéria, também reuniram-se com os
parlamentares durante as visitas o chefe do Departamento de
Investigação, Orientação e Proteção à Família, Weliton Peres, e a
superintendente de Gestão das Medidas de Privação de Liberdade da
Subsecretaria de Atendimento às Medidas Socioeducativas, Arlinda
Guimarães.
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