Setor produtivo critica regras para o licenciamento em
Minas
Representantes de produtores rurais e da indústria
mineral fizeram duros questionamentos ao processo de licenciamento e
regularização ambiental em Minas Gerais, nesta terça-feira
(11/3/08), segundo e último dia do Ciclo de Debates Licenciamento
Ambiental e Desenvolvimento Sustentável, promovido pela
Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Entre as críticas, estão a
demora e a burocracia do processo e a falta de integração entre
órgãos ambientais. Em resposta, representantes do governo pontuaram
que algumas dificuldades já foram superadas, além de enfatizarem que
todos os interessados devem atuar na etapa de formulação das regras,
aberta à participação.
Evento preparatório do Seminário Legislativo
Minas de Minas, a ser realizado também no primeiro semestre,
o ciclo de debates sobre licenciamento ambiental pretende reunir
propostas para aperfeiçoar o modelo em vigor. Nos dois dias do
evento, o Plenário ficou lotado com a presença de produtores rurais
e de técnicos do Sistema Estadual de Meio Ambiente (Sisema), entre
outros participantes. Nesta terça (11), terminou o prazo para
apresentação de propostas que serão analisadas pela comissão
organizadora do seminário legislativo.
Sindiextra e Faemg fazem críticas; governo
responde
O diretor de Meio Ambiente do Sindicato da
Indústria Mineral (Sindiextra), Vítor Feitosa, afirmou que o
licenciamento foi proposto para viabilizar a atividade econômica,
apontando mecanismos de instalação para reduzir impactos ambientais.
Na prática, no entanto, disse que o licenciamento se transformou num
processo cartorial, tendo se afastado de seu objetivo inicial: ser
um instrumento de planejamento, e não corretivo. Entre as críticas
estão: prazos dilatados; dificuldade para o empreendedor acompanhar
o processo, classificado como sem transparência e oneroso,
principalmente para os pequenos e médios; análise desintegrada e não
sistêmica; alto custo operacional para os órgãos gestores, que
poderiam usar os recursos para melhorar a fiscalização.
"O licenciamento acaba virando um instrumento de
barganha para preencher lacunas vindas do enfraquecimento
institucional e da ausência do Estado em setores essenciais",
acrescentou Feitosa, exemplificando que é uma distorção exigir que
as empresas assumam obrigações de Estado, como construção de escolas
e postos de saúde em áreas afetadas pelos empreendimentos. Na
avaliação do Sindiextra, os estudos de impacto ambiental (EIA/Rima)
não podem inviabilizar as atividades com condicionantes absurdas que
não condizem com o impacto real. Para ele, a concepção da análise
desses estudos é mais política que técnica. Críticas ao Ministério
Público também foram feitas por Feitosa, que classificou a atuação
como desencontrada, sem suporte técnico adequado.
Como sugestões, o Sindiextra destacou que é preciso
fixar prazos e explicitar atribuições e responsabilidades para
empreendedor e licenciador; estabelecer procedimentos transparentes;
informatizar o processo e tratar de forma diferenciada projetos
estratégicos de interesse estadual.
Decreto - O assessor de
Meio Ambiente da Federação da Agricultura e Pecuária (Faemg), Carlos
Alberto Santos Oliveira, engrossou as críticas, fazendo referência
direta ao Decreto 44.309, de 2006, que traz as normas para a
Autorização Ambiental de Funcionamento (AAF) e o licenciamento;
tipifica e classifica as infrações às normas de proteção ao meio
ambiente e aos recursos hídricos; estabelece o procedimento
administrativo de fiscalização e aplicação de penalidades. Ele
reivindicou que esse decreto seja suspenso de imediato até que seja
publicada sua revisão - que ainda está sob análise da
Advocacia-Geral do Estado (AGE). Os produtores rurais reclamam de
fiscalização exacerbada e da aplicação de multas de alto valor, além
de cobraram nova classificação para as penalidades. O deputado
Carlos Pimenta (PDT) reforçou as críticas.
Oliveira também apontou a falta de integração dos
órgãos ambientais. Ele exemplificou que as informações sobre
licenciamento ambiental estão restritas às 10 superintendências
regionais de meio ambiente e desenvolvimento sustentável (Suprams),
mas ponderou que estas não são suficientes para suprir a necessidade
de informação. A Faemg sugere que as equipes dos 150 escritórios do
Instituto Estadual de Florestas (IEF) sejam capacitadas a repassarem
os dados.
A falta de integração na esfera governamental foi
duramente criticada pela presidente da Associação de Usuários da
Bacia Hidrográfica do Rio Pará, Regina Greco. Ela exemplificou a
dificuldade de conseguir uma AAF, processo mais simples e rápido de
regularização ambiental, aplicado a empreendimentos de classes 1 e
2, ou seja, de impacto não significativo. Ela cobrou que essa
autorização seja, de fato, um procedimento simples; que o Sisema
cumpra os prazos determinados em lei para suas análises; e que seja
fixado, também em lei, prazo de 60 dias para avaliação de processos
de outorga de água, por exemplo.
Resposta - Na fase de
debates, o responsável pela fiscalização ambiental integrada no
Estado, Paulo Teodoro de Carvalho, opinou que é preciso que todos os
segmentos interessados saiam do evento da Assembléia com várias
indagações. "A situação exige introspecção profunda de todos os
envolvidos, que precisam agir na formulação das políticas públicas",
ponderou ele, destacando que várias dificuldades listadas pelos
expositores já foram superadas e que há várias instâncias de
participação, como os comitês de bacia, o próprio Copam e suas
unidades regionais colegiadas (URCs).
Paulo Teodoro ponderou que a Semad tem discutido o
Decreto 44.309 desde o ano passado, inclusive na ALMG, e que é
preciso aguardar a resposta da AGE sobre a proposta de reformulação
da norma. Ele informou que, desde que começou o estudo para mudança
das regras, a Polícia Ambiental foi orientada a valorizar a
advertência e não a infração, nas abordagens ao produtor.
O subsecretário de Gestão Ambiental da Semad, Ilmar
Bastos Santos, avaliou que, em breve, haverá um novo decreto em
vigor, que contribuirá para aliviar as angústias dos produtores. Um
dos objetivos das mudanças é valorizar as infrações leves, que serão
punidas apenas com advertência, mas podem resultar em multas nos
casos de não cumprimento ou reincidência. Entre as modificações,
está a ampliação de 6 para 10 circunstâncias atenuantes que podem
reduzir as penalidades de multa. Respondendo a Regina Greco, o
subsecretário disse que hoje o momento é de transição de um modelo
arcaico para outro, mais ágil e eficaz, e que mudanças operacionais
deverão ser implementadas até o final deste ano para facilitar
processos como o da outorga de água.
Conselheiro do Copam propõe reflexão sobre
fragilidades do sistema
O assessor da Federação dos Trabalhadores na
Agricultura (Fetaemg), Eduardo Antônio Arantes do Nascimento, que é
conselheiro do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam),
propôs uma reflexão sobre as carências do sistema. Ele ponderou que
o processo de licenciamento ambiental tem suas limitações, mas
precisa ser analisado de forma global e não tomado de forma isolada.
Ele rechaçou a tese de politização na análise dos estudos de impacto
ambiental (EIA/Rima) e considerou que as fragilidades do sistema
acabam fragilizando o licenciamento.
Nascimento defendeu a alteração do formato e do
conteúdo das audiências públicas destinadas ao licenciamento dos
grandes empreendimentos. Segundo ele, essa reivindicação foi levada
há três anos pela Fetaemg à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável (Semad). "Esse mecanismo serve apenas
para fazer propaganda do empreendimento e justificá-lo; a audiência
não subsidia os analistas ambientais dos órgãos públicos e não
comporta a participação social", apontou. Quanto à proposta de fixar
prazos para empreendedor e licenciador, Nascimento defende que haja
possibilidade de apenas um pedido de complementação de informações,
pelos órgãos ambientais, ao EIA/Rima. Isto porque, analisou, hoje as
informações apresentadas nos estudos são tão frágeis que o órgão
público precisa solicitar dados complementares durante meses.
Outro problema apontado pela Fetaemg foi o que
classificou de "empurra-empurra" de condicionantes, quando
determinações não cumpridas pelos empreendedores são postergadas
para a próxima fase do licenciamento. A falta de técnicos e
deficiências na fiscalização pós-licenciamento também foram listadas
por Nascimento. Ele exemplificou que a unidade regional colegiada
(URC) do Copam do Jequitinhonha, com sede em Diamantina, tem meia
dúzia de técnicos para atender a área que vai de Diamantina a Salto
da Divisa. "A fiscalização é impossível", acentuou. Para a
agricultura familiar, a Fetaemg defende que a regularização
ambiental seja feita sob a forma de AAF.
Minas de Minas - Ao fazer referência ao
Seminário Legislativo Minas de Minas, Nascimento destacou que a
identidade de um Estado e de um país não pode ser determinada pelo
mercado nem se vincular a qualquer produto, mas ser construída a
partir do povo, das relações sociais, cultura e história. "O mais
adequado seria que o seminário se chamasse Minas de minas e de
gente", destacou ele, que aponta a necessidade não de colocar o meio
ambiente no centro das políticas públicas, mas sim o ser humano no
centro da construção do desenvolvimento com sustentabilidade.
Atingidos por barragens - O
deputado Padre João (PT) e Eduardo do Nascimento, da Fetaemg,
abordaram ainda o problema das populações atingidas por barragens. O
deputado leu nota da Via Campesina, destacando que foi pacífica e
sem reféns a ocupação de trilhos de ferrovia da Vale, em Resplendor,
no Rio Doce. A ocupação foi uma forma de denunciar os impactos da
barragem de Aimorés, segundo a nota. O deputado enfatizou que há
milhares de atingidos por barragens em Minas que estão "reprimidos e
encurralados", sem as indenizações que deveriam receber.
A situação dos atingidos havia sido abordada antes
por Nascimento. Ele destacou que as indenizações monetárias não
significam reconstituição de direitos e que é necessário cobrar que
empreendedores públicos e privados tenham responsabilidade com a
compensação socioambiental da atividade. "É preciso realizar obras
mínimas, como assentamento, escola, energia elétrica. Não
reivindicamos nada exorbitante", afirmou.
Mesa - Além dos
expositores, compuseram a Mesa o 1º-vice-presidente da ALMG,
deputado Doutor Viana (DEM), que abriu os trabalhos; Neider Moreira
(PPS), que coordenou os debates da manhã; Sávio Souza Cruz (PMDB),
presidente da Comissão de Meio Ambiente e Recursos Naturais; Getúlio
Neiva (PMDB), Carlos Pimenta (PDT), Padre João (PT), Tiago Ulisses
(PV) e Inácio Franco (PV).
Ata e reprise - Os interessados em rever o que
foi discutido no evento ambiental podem consultar as atas do ciclo
de debates no Minas Gerais/Diário do Legislativo do dia 29
de março. A TV Assembléia (canal 11 do sistema a cabo) reprisará o
evento nos seguintes dias e horários: no dia 20 de março, às 9 horas
serão exibidos a abertura e os debates da manhã do dia 10 e, às 14
horas, os debates da tarde. No dia 21 de março, às 9 horas será
exibida a programação da manhã do dia 11 e, às 14 horas, a
programação da tarde.
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