Projeto que flexibiliza regras de oscips recebe diversas
críticas
Para a maioria dos convidados que participaram a
audiência pública sobre a mudança nas regras de qualificação e
funcionamento das organizações da sociedade civil de interesse
público (oscips), proposta pelo Projeto de Lei (PL) 1.582/07, do
governador, anexado ao PL 755/07, do deputado Vanderlei Miranda
(PMDB), as alterações serão um retrocesso na relação do Governo do
Estado com as entidades sem fins lucrativos. O assunto foi debatido
em reunião conjunta na Assembléia Legislativa de Minas Gerais, nesta
quarta-feira (5/12/07), das comissões de Administração Pública e de
Participação Popular. As oscips são entidades que não integram o
aparelho burocrático do Estado, mas recebem uma qualificação
estatal, com recursos orçamentários, bens públicos e até mesmo
servidores cedidos pela administração pública.
O deputado André Quintão (PT), que pediu a
audiência, critica alguns pontos do projeto original apresentado
pelo governador, tais como o fim da exigência de um tempo mínimo de
dois anos de atividade para que a instituição seja qualificada como
oscip, a alteração do artigo que prevê o acompanhamento das oscips
pelos conselhos estaduais de políticas públicas, a dispensa do
processo de seleção para credenciamento e a extinção da exigência de
previsão detalhada de receita e despesa. Esses também foram pontos
salientados pela maioria dos convidados. "Fato é que a lei que será
objeto de alteração foi alvo de muitos debates e emendas na época da
tramitação. Tudo para garantir transparência e controle social.
Admitimos a figura da oscip, desde que tenha controle social. Tudo
que conquistamos em 2003 está sendo retirado agora", disse o
deputado.
"Esse projeto vem junto com o modelo de gestão
estadual que quer terceirizar as responsabilidades do Estado. Ele
facilita a entrada do setor privado na prestação do serviço público.
O Estado está sendo privatizado e tal projeto não vai contribuir
para a melhoria do serviço público", falou o deputado Carlin Moura
(PCdoB). Segundo o deputado Domingos Sávio (PSDB), "adequações na
lei são necessárias sem o desvirtuamento do propósito. Caso ocorra,
temos a obrigação de discutir. Esse é um tema que deve ser discutido
sem partidarização, e o debate vai ajudar a aperfeiçoar o projeto",
avaliou. O deputado Elmiro Nascimento (DEM), presidente da Comissão
de Administração Pública, cumprimentou André Quintão pela iniciativa
de realização da audiência.
Projetos - O PL 755/07 faz uma alteração no
caput do artigo 3º da
Lei 14.870, de 2003, em que, para qualificar-se como oscip, a pessoa
jurídica de direito privado sem fins lucrativos tinha que estar
constituída, e em atividade, há pelo menos dois anos. Com a
alteração proposta no projeto, esse tempo seria excluído, desde que
os objetivos sociais e as normas estatuárias atendessem aos
dispositivos da lei.
Já o PL 1.582/07, anexado ao PL 755/07, propõe uma
alteração substancial na referida lei. Além de suprimir a exigência
mínima de dois anos de funcionamento para que a entidade possa se
qualificar como oscip, o projeto continha várias inovações em
relação às normas estatutárias da entidade interessada em obter esse
título, à documentação que deve estar anexada ao pedido de
qualificação, aos requisitos para a celebração de termo de parceria
com o Estado e aos resultados atingidos pelas oscips.
Propósito do governo é flexibilizar aumento da
qualificação das oscips
A superintendente de Modernização Institucional da
Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag), Fernanda de
Siqueira Rezende, defendeu o projeto em sua forma original e disse
que a flexibilização ocorreu somente nos critérios de qualificação,
e não de celebração dos termos de parcerias. "Qualificação não cria
relação com o Estado. Enrijecemos os termos de celebração. Hoje o
Estado tem cerca de 150 organizações qualificadas como oscip e 12
termos de parceria celebrados", informou. Ela também citou que foi
reformulado, de modo a enrijecer os critérios, o trecho do projeto
que altera o artigo 12 da lei, que diz as condições para celebração
do termo de parceria entre o poder público e a entidade qualificada
como oscip.
Quanto à suspeita da possibilidade de transformar
as oscips em uma forma de dar salários maiores aos servidores
públicos cedidos, ela explicou que o artigo 20 da lei determina, no
parágrafo 2º, que não é permitido o "pagamento de vantagem
pecuniária permanente por oscip a servidor cedido com recursos
provenientes do termo de parceria, ressalvada a hipótese de
adicional relativo ao exercício de função temporária de direção e
assessoramento". "O propósito da lei é aprimorar o processo. O foco
são as condições dos termos de parceria celebrados", garantiu.
"Há uma necessidade urgente de um marco legal
definidor de qual terceiro setor precisa de mais atenção do Estado.
Hoje time de futebol, igreja, faculdade, sindicato e muitos outros
são terceiro setor. A única diferença é a pessoa jurídica, que só
podem ser duas, ou associação ou fundação", explicou o
procurador-geral de Justiça e coordenador do Centro de Apoio
Operacional ao 3º Setor, Tomás Aquino Rezende. Ele defendeu o prazo
mínimo de dois anos de existência da oscip, conforme dispõe a Lei
14.870, de 2003, e declarou que o Ministério Público está apto a
analisar as prestações de contas dos termos de parceria entre oscips
e Estado e sugeriu que esse mecanismo seja incluído no projeto de
lei proposto. Outra sugestão do procurador foi a elaboração de leis
diferentes para organização social (OS) e para oscip.
Para representante da prefeitura, "alterações estão
na contramão da história"
A presidente do Conselho Municipal de Assistência
Social, Lea Lúcia Braga, declarou que "as medidas do projeto não
contribuem para o fortalecimento de políticas públicas e
desqualificam o controle social". Ela questionou o motivo de se
abrir mão de um processo já construído de fiscalização e
acompanhamento. "A discussão tem que passar pela responsabilidade do
Estado", afirmou. Foi também o que defendeu o diretor da Coordenação
Intersindical, Renato Barros. "O Estado vai recompor sua
responsabilidade ou vai transferi-la?", perguntou. O membro do
Sindisaúde, Paulo Venâncio de Carvalho, também questionou o papel do
Estado. "Que interesse público existe nisso? Não dá para acabar com
esse tempo mínimo de existência da oscip", avaliou.
Paulo, assim como Léa, Renato e o deputado André
Quintão, questionaram também a alteração do artigo 14, que trata do
acompanhamento e fiscalização dos resultados do termo de parceria.
Originalmente, o artigo diz que "a execução do objeto do termo de
parceria será acompanhada e fiscalizada pelo órgão do poder público
afeto à área de atuação relativa à atividade fomentada e pelos
conselhos de políticas públicas das áreas correspondentes de
atuação". Já o projeto de lei apresentado prevê que "os resultados
atingidos com a execução do termo de parceria serão analisados
semestralmente, no mínimo, por comissão de avaliação".
A comissão prevista seria integrada por um membro
indicado pela Seplag, um supervisor indicado pelo órgão estatal
parceiro, um membro indicado pela oscip, um membro indicado pelo
conselho de políticas públicas da área correspondente de atuação,
quando houver; um membro indicado por cada interveniente, quando
houver; e um especialista da área que constituir objeto do termo de
parceria, indicado pelo órgão estatal parceiro e não integrante da
administração estadual. "Isso, para nós, não caracteriza controle
social", enfatizou Renato Barros.
Tramitação - Em reunião
realizada em 21 de novembro, a Comissão de Administração Pública
aprovou parecer de 1º turno favorável ao PL 755/07, na forma do
substitutivo nº 1, apresentado pelo relator, deputado Ademir Lucas
(PSDB). O substitutivo absorveu o texto do PL 1.582/07, de autoria
do governador. Pronto para ser apreciado em Plenário, a discussão do
projeto em audiência pública conjunta foi solicitada por André
Quintão. O deputado afirmou que, a partir do debate, serão
apresentadas emendas ao projeto. "Caso não sejam acatadas, o
processo de discussão desse projeto vai se alongar", avisou.
Presenças - Deputados
Elmiro Nascimento (DEM), presidente da Comissão de Administração
Pública; Ademir Lucas (PSDB), vice; Domingos Sávio (PSDB), Inácio
Franco (PV) e André Quintão (PT), presidente da Comissão de
Participação Popular. Além dos convidados citados acima, também
participou a especialista em políticas públicas e gestão
governamental da Seplag, Renata Anicio.
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