Conselho Nacional denuncia exploração sexual e tortura em
cadeias
Integrantes do Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária (CNPCP) condenaram a situação de algumas
delegacias e unidades prisionais mineira, em reunião realizada nesta
quinta-feira (29/11/07) pela Comissão de Segurança Pública da
Assembléia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O evento foi
solicitado pelo deputado Sargento Rodrigues (PDT), e realizado no
Plenário da Casa. O secretário de Estado de Defesa Social, Maurício
Campos Júnior, afirmou que o governo já reduziu de 19 para duas as
carceragens em Belo Horizonte, admitiu a precariedade de muitas
unidades ainda operantes, mas argumentou que o problema só pode ser
solucionado paulatinamente. Participaram do evento representantes do
Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, diversos órgãos
de segurança do Estado, Organização dos Advogados do Brasil (OAB),
entre outras autoridades.
A inspeção do CNPCP nas delegacias e
estabelecimentos prisionais de Belo Horizonte e Ribeirão das Neves
aconteceu entre 26 e 28 de novembro. As principais críticas feitas
pelo conselheiro Adeildo Nunes, que conduziu a inspeção em Minas,
foram às carceragens da 16ª Delegacia de Polícia, que abriga
mulheres, e da Delegacia de Tóxicos da capital, que o governo
promete desativar até meados do próximo ano. Nesta sexta-feira
(30/11/07), os conselheiros devem visitar a Associação de Proteção e
Assistência aos Condenados (Apac) de Nova Lima.
O conselheiro nacional Adeildo Nunes classificou a
16ª Delegacia de Polícia como o "inferno dos vivos". Segundo ele,
são 100 mulheres presas em um espaço que só poderia abrigar 20.
Estão misturadas presas condenadas ao regime fechado, semi-aberto e
provisório, e até mesmo uma em regime condicional. O mais grave,
segundo ele, é que as presas denunciaram exploração sexual. Adeildo
Nunes afirmou que, segundo as presas, algumas mulheres são mantidas
fora das celas para "servir" a homens indicados pelos agentes de
polícia. Relatou ainda que o delegado responsável não tem qualquer
formação sobre direitos humanos.
Já na Delegacia de Tóxicos, são 84 homens presos
também em péssimas condições, aglomerados em seis celas que
comportam os condenados aos mais diversos regimes prisionais.
"Parece uma pocilga", afirmou Nunes, que disse ter recebido
denúncias de torturas e maus tratos.
Por outro lado, Adeildo Nunes classificou a
penitenciária feminina de Ribeirão das Neves como "um modelo
exemplar, extraordinário", onde as condições de habitação são
adequadas, com atividades de lazer, educação, trabalho e até
berçário para as presas que são mães. Mesmo assim, ele detectou
problemas como a existência de apenas um defensor público e um
advogado contratado para atender as 212 detentas. Disse ainda que no
local há telefones públicos internos, o que é proibido pela Lei
11.466, de março de 2007.
Entre as sugestões apresentadas pelo conselheiro
estão a interdição imediata da 16ª Delegacia e da Delegacia de
Tóxicos; a retirada dos telefones públicos das carceragens; a
inexistência de presos em delegacias ("deveria haver uma ação civil
pública nesse sentido"); a separação de presos por regime; e a
adoção de políticas de reintegração social dos condenados.
Secretário diz que governo pretende extinguir
carceragens
Em entrevista à imprensa, o secretário Maurício
Campos Júnior afirmou que uma eventual interdição das duas
carceragens só agravaria o problema. "O que é preciso é tratar-se de
programar a extinção dessas unidades, construindo novas vagas",
afirmou o secretário. Ele ressalvou que o investimento federal em
segurança no Estado de Minas Gerais, entre 2003 e 2006, caiu 95%,
enquanto o Estado, desde 2006, investiu R$ 455 milhões.
Em pronunciamento durante a reunião, Maurício
Campos ressaltou que, desde 2003, o Estado ampliou de 5,5 mil para
21,5 mil o número de presos sob a responsabilidade do Sistema de
Defesa Social, desativando diversas cadeias e substituindo policiais
por agentes penitenciários. Ele agradeceu às autoridades e
instituições que, neste processo, se comportam como "parceiros" do
Estado, e não como "críticos insensíveis", que só apontam problemas,
sem oferecer soluções.
Já o subsecretário de Administração Penitenciária
de Minas Gerais, Genilson Zeferino, disse que recebia as críticas
feitas pelo conselheiro Adeildo de "coração aberto". Ele reconheceu
que a reversão do quadro atual é um desafio enorme a ser enfrentado
e pontuou ações do governo para mudar a situação. Entre as
iniciativas estão a construção de novas penitenciárias e a retirada
de presos sob a custódia de policiais civis. Ao final do evento,
Zeferino afirmou que o Estado irá tomar providências imediatas para
checar a existência de presos tuberculosos, que serão encaminhados
ao Centro de Perícias Médicas; também acenou com a possibilidade de
transferência de algumas presas da 16ª Delegacia para uma unidade
prisional parcialmente recuperada em Ponte Nova.
O Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária, vinculado ao Ministério da Justiça, é integrado por
13 conselheiros titulares, designados pelo ministro entre
professores e profissionais das áreas de Direito Penal, Processual
Penal e Penitenciário, entre outras, além de representantes da
sociedade civil e de ministérios da área social. Cabe ao CNPCP
propor diretrizes da política criminal quanto à prevenção do delito,
administração da Justiça Criminal e execução das penas e das medidas
de segurança; contribuir na elaboração de planos nacionais de
desenvolvimento, sugerindo metas e prioridade da política criminal e
penitenciária; e promover a avaliação periódica do sistema
criminal.
O presidente do CNPCP, Sérgio Salomão Shecaira,
afirmou que há esforços realizados pelos mineiros na área da
segurança que são reconhecidos nacionalmente, tais como as
experiências das Apacs. Apesar disso, ele afirmou que o problema do
sistema prisional em todo o País não será resolvido enquanto não se
estabelece uma nova mentalidade, que valorize e implemente penas
alternativas que seja eficazes. "Ouso dizer que o problema
penitenciário não tem solução. O problema da cadeia é a cadeia",
afirmou o dirigente do Conselho. Ao final da reunião, ele disse que
o relatório da inspeção em Minas será discutido, votado, e
posteriormente encaminhado às autoridades mineiras, e que o juiz
Herbert Carneiro será o representante do Conselho na fiscalização do
cumprimento de medidas corretivas.
OAB destaca deficiências em Contagem e Santa
Luzia
O representante da OAB mineira, advogado Adilson
Rocha, também criticou a situação do sistema prisional mineiro, mas
destacou a situação de unidades que estão fora da capital, em
especial o 2º Distrito Policial de Contagem e a Delegacia do
Palmital, em Santa Luzia. Ele reconheceu, no entanto, a dificuldade
de o Estado fazer frente a uma demanda que vem crescendo
exponencialmente. "Em pouco mais de um ano, o número de mulheres
presas no Estado cresceu de 928 para 1,6 mil", afirmou o
advogado.
O desembargador Joaquim Alves de Andrade,
coordenador do projeto Novos Rumos da Execução Penal de Minas
Gerais, defendeu a valorização das Apacs como alternativa prisional
mais barata e eficiente. O tenente-coronel Mário César da Silva,
subchefe da Assessoria Institucional da Polícia Militar, ressaltou a
importância e o avanço do programa de substituição de policiais
militares por agentes penitenciários. Já o defensor público geral,
Leopoldo Portela Júnior, cobrou o fortalecimento da Defensoria
Pública em todo o País. "No Pará, se houvesse Defensoria Pública
atuante, o caso da menina presa com 20 homens não teria acontecido",
afirmou ele.
Entre as sugestões feitas pelos participantes do
evento, estão a resolução dos problemas de saúde dos presos,
especialmente os tuberculosos; transferência de presos das cadeias
para penitenciárias; mutirão para análise da situação jurídica dos
internos; medidas de combate à ociosidade; criação de uma vara única
de execução criminal englobando toda a Região Metropolitana de BH;
realização de concurso para contratação de defensores; e
investimentos para formação penitenciária.
O deputado Délio Malheiros (PV), antes de concluir
a reunião, somou sua preocupação às ponderações feitas pelos
participantes do encontro. "Sempre achei estranho que albergados
fossem mantidos junto com presos perigosos, condenados. Isso
favorece que eles sirvam de pombos-correio, que suas famílias sejam
ameaçadas", afirmou o parlamentar.
Presenças - Deputados Délio
Malheiros (PV) - que presidiu a reunião; Leonardo Moreira (DEM) e
Luiz Tadeu Leite (PMDB); secretário de Defesa Social, Maurício
Campos Júnior; presidente do Conselho Nacional de Política Criminal
e Penitenciária, Sérgio Salomão Shecaira, e demais conselheiros;
promotor de Justiça Joaquim Miranda Júnior; desembargador Joaquim
Alves de Andrade; defensor público-geral Leopoldo Portela Júnior;
tenente-coronel Mário César da Silva, subchefe da Assessoria
Institucional da PMMG; delegado Antônio Gama Júnior, subcorregedor
geral de Polícia Civil de Minas Gerais; subsecretário de
Administração Penitenciária de Minas Gerais, Genilson Zeferino;
presidente do Conselho de Criminologia do Estado de Minas Gerais,
Marcos Afonso de Souza; corregedor da Guarda Municipal, coronel PM
Roberto Rezende; ouvidor adjunto do Estado, Agílio Monteiro;
conselheiro da OAB-MG, Adilson Rocha; entre outras autoridades.
|