Sem-terras de Salto da Divisa querem reforma agrária
urgente
Uma centena de manifestantes vestindo camisetas do
Movimento dos Sem-Terra (MST) e de movimentos populares lotaram as
dependências da Câmara Municipal de Salto da Divisa, Vale do
Jequitinhonha, a 820 km de Belo Horizonte, para exigir agilidade no
processo de reforma agrária que vai beneficiar as famílias do
acampamento Dom Luciano Mendes de Almeida. Cantando lemas e palavras
de ordem, eles receberam o presidente da Comissão de Direitos
Humanos da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, deputado Durval
Ângelo (PT), na manhã desta quinta-feira (25/10/07).
A área que os sem-terras reivindicam é a fazenda
Monte Cristo, com 1.368 hectares, pertencente à Fundação Tinoco
Cunha Peixoto. A fazenda foi declarada improdutiva pelo Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e arrecadada para
fins de reforma agrária. Mas os representantes da fundação entraram
na Justiça com o objetivo de desqualificar o laudo do Incra. A
fazenda está ocupada há 14 meses por 100 famílias de sem-terras, que
chegaram a ficar cinco meses sem receber cestas básicas e sofrem
ameaças de representantes da fundação.
Ameaças - A Irmã Geralda
Magela denunciou que até as freiras estão recebendo ameaças de ser
baleadas no rosto e que alguns barracos de lona foram queimados. O
prefeito de Salto da Divisa, José Eduardo Peixoto, confirmou que "as
ameaças partem de meia dúzia de bajuladores do grupo político que
perdeu o comando da cidade". Ênio Bohnenberger, dirigente do MST
nacional, ponderou que o movimento estimula o embate e as ocupações,
mas que não pretende tomar nenhuma propriedade à força. "Até hoje, o
Incra assentou 450 mil famílias no Brasil e nenhuma terra foi tomada
à força, mas desapropriada e indenizada, na forma da lei e da
Constituição".
Em apoio à causa dos sem-terras, compareceu à
reunião o bispo de Almenara, Dom Hugo Steekelenburg. Ele deu seu
testemunho de que o trabalho missionário das freiras dominicanas
realizado nos últimos anos trouxe novo alento e esperança à massa de
excluídos da região. Dom Hugo criticou a chegada das empresas de
eucalipto ligadas à (Veracel) e pediu a Durval Ângelo empenho para
barrar esse avanço. Segundo ele, o eucalipto desagrega todas as
comunidades onde chega e deixa um rastro de miséria e
desertificação.
Itapebi afogou a cachoeira e muitas
esperanças
Boa parte dos manifestantes que foram ao microfone
na reunião apresentou queixas também contra a usina hidrelétrica de
Itapebi, construída em território baiano, mas com inundações
importantes em território mineiro, inclusive do Tombo da Fumaça,
cachoeira símbolo do Vale do Jequitinhonha. Jovecília de Jesus, da
Associação das Lavadeiras, queixou-se de que não tem mais o rio para
lavar roupa. "Agora o lugar é uma lagoa, e nós não somos sapos para
morar na lagoa. Perdemos a alegria de trabalhar para ganhar o pão".
Os pescadores também foram prejudicados e não foram
indenizados, como os da represa de Aimorés. O líder deles disse que
desde 1997 estão encontrando dificuldade para sobreviver, e receia
ainda mais a chegada da Veracel, que vai trazer agrotóxicos e
assoreamento para a região. Líderes dos pedreiros e dos garimpeiros
também relataram seus prejuízos e os afogamentos que ocorrem no lago
que engoliu a cachoeira Tombo da Fumaça. Falaram membros da Pastoral
da Terra e da Pastoral da Criança, vereadores e líderes
comunitários.
Aldenir Vianna Pereira, do Iter-MG, disse que o
órgão acompanha de perto a situação do acampamento Dom Luciano e as
tentativas para invalidar a conquista, o processo de reintegração de
posse, desapropriações e recursos. Ele destaca como positivo o forte
apoio que os sem-terra recebem da comunidade, e vê apenas um
adversário, que é a Fundação. Segundo ele, o juiz federal Wellington
Militão ordenou nova vistoria ao Incra, para decidir sobre a ação.
Promotor pede desapropriação de cenários de
violência no campo
Luis Carlos Martins Costa, promotor de Justiça,
desceu a detalhes do processo que tramita na Vara de Conflitos
Agrários e das ameaças contra os acampados, e introduziu uma nova
preocupação: as ações trabalhistas que estão sendo ajuizadas por
ex-funcionários da Fundação Tinoco Cunha Peixoto, que teriam como
lastro as terras da fazenda. "Nós defendemos a desapropriação não
apenas das terras improdutivas, mas também aquelas que os
proprietários degradam, que usam trabalho escravo e não cumprem sua
função social. Aguardamos com grande expectativa, para breve, a
primeira sentença histórica neste sentido: a desapropriação da
Fazenda Nova Alegria, pelo argumento de violência no campo. Foi a
fazenda do caso Chafik, da chacina de Felisburgo".
O deputado Durval Ângelo realizou um minuto de
silêncio pela morte do militante Valmir Mota de Oliveira por
pistoleiros no Paraná, numa ação que deixou outros cinco baleados, e
pelas vítimas do fazendeiro Chafik. Em seguida anunciou os
desdobramentos que aquela reunião teria. Pediu o envio das notas
taquigráficas ao Incra, ao juiz Militão, ao Ministério Público.
Requereu uma fiscalização do MP sobre a Fundação Tinoco Cunha
Peixoto. Pediu ao Incra que não atrase mais o envio das cestas
básicas aos acampados e incentivou os militantes a apontar outras
fazendas improdutivas na região, para projetos de reforma agrária e
também para barrar o avanço do eucalipto da Veracel.
Durval Ângelo quer visitar o juiz federal
Wellington Mourão para pedir agilidade no processo do acampamento e
pediu documentação das ameaças e agressões para que o Ministério
Público da Comarca possa investigá-las através de inquérito civil
público. Quer também a reimplantação do projeto "Arca das Letras" no
Jequitinhonha. Quanto às queixas relativas à Usina Itapebi, o
deputado vê pouca chance de que possam resultar em algo útil para os
prejudicados, já que não constam do rol das medidas mitigatórias
negociado antes da emissão da licença de funcionamento.
Presenças - Deputado
Durval Ângelo (PT), presidente da comissão; Luis Carlos Martins
Costa, promotor de Justiça de Direitos Humanos; Aldenir Vianna
Pereira, diretor de Promoção e Defesa da Cidadania no Campo, do
Iter-MG.
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