Delegados relatam massacre de presos em Ponte Nova

"É uma cena que jamais vou esquecer, em 22 anos de polícia". Essa frase foi dita pelo delegado regional de Polícia Ci...

13/09/2007 - 00:00
 

Delegados relatam massacre de presos em Ponte Nova

"É uma cena que jamais vou esquecer, em 22 anos de polícia". Essa frase foi dita pelo delegado regional de Polícia Civil de Ponte Nova, Luiz Carlos Chartouni, ao relatar, com detalhes, aos deputados da Comissão de Segurança Pública da Assembléia de Minas Gerais, os acontecimentos da chacina que matou 25 presos da cadeia pública da cidade, ocorrida no mês passado. Durante a reunião desta quinta-feira (13/9/07), solicitada pelos deputados Paulo Cesar (PDT) e Luiz Tadeu Leite (PMDB), os parlamentares ouviram ainda o diretor responsável pela cadeia, Wanderley José Miranda, e a assessora da Polícia Civil na Secretaria de Estado de Defesa Social, Cristiane Lima.

Segundo Chartouni, o massacre aos detentos da cadeia, que contava com apenas um policial civil e dois militares na vigília dos 186 presos, ocorreu por volta da 1 hora da manhã do dia 23 de agosto. Ele conta que acordou com estampidos semelhantes a tiros e que quando chegou à detenção, o fogo já consumia a cela 8, onde estavam os presos. A partir desse momento, em que foram recebidos a tiros pelos detentos, ele tomou uma série de providências, tais como convocar peritos e recolher os corpos, assim como fazer a identificação dos mortos e encaminhá-los para a Santa Casa local para facilitar o trabalho dos médicos legistas.

"Conseguimos negociar com os presos e, após uma hora do início do conflito, a situação já estava controlada. Encaminhamos os corpos para o Instituto Médico Legal (IML) de Belo Horizonte e contamos com o apoio da Secretaria de Defesa Social para o atendimento à imprensa e aos familiares", disse. Agora, de acordo com ele, todo o processo ficou à cargo da Corregedoria da Polícia. "Por uma questão ética, não tive acesso aos laudos periciais e nem sei o que já foi decidido", disse. Perguntado pelo deputado Sargento Rodrigues (PDT) sobre como a arma que efetuou os disparos contra os presos e, mais tarde, contra os carcereiros, havia entrado na cadeia, Chartouni disse que ela teria sido levada por presos em regime semi-aberto ou por detentos que auxiliam na faxina do local.

Delegado aponta condições precárias de trabalho na cadeia

O diretor responsável pela cadeia pública de Ponte Nova, Wanderley José Miranda, chamou atenção para as condições subumanas de trabalho dos policiais da carceragem. Segundo ele, já foram feitos diversos pedidos de transferências de presos ao Poder Judiciário e Ministério Público, mas a resposta sempre é a de que não há vagas. "São pouquíssimos agentes para muitos presos. Fizemos tudo o que foi possível para evitar essa situação, mas o problema não ocorre somente em Ponte Nova, mas em todo o Brasil".

Sobre essa declaração, o deputado Sargento Rodrigues lembrou é preciso cuidado para não culpar alguns poucos policiais que estavam trabalhando naquela noite pela falta de políticas de segurança pública para as cadeias do Estado. "É preciso que encontremos os responsáveis pelo massacre, mas após a devida investigação. O problema maior é a falta de projetos do Governo do Estado para o sistema prisional de Minas", alertou. Os deputados Paulo Cesar, Antônio Júlio (PMDB), Délio Malheiros (PV) e Durval Ângelo (PT) fizeram coro às palavras do presidente da comissão. "É preciso que os servidores saiam de trás de suas mesas e conheçam as cadeias públicas do Estado. Acredito que somente assim as autoridades responsáveis tomem alguma atitude", afirmou Antônio Júlio.

Chartouni lembrou ainda que, desde que assumiu a Delegacia Regional, conseguiu transferir 40 presos condenados, mas que é preciso que o Judiciário e o Ministério Público tenham mais sensibilidade pelo caso de Ponte Nova. "Mais que isso, o Governo do Estado deve construir mais penitenciárias para acolher os presos que já existem e os que já estão sofrendo processos por crimes cometidos. O pior é que, infelizmente, esse número deve crescer cada vez mais", concluiu.

Deputados questionam atuação de assessora da Polícia

Os deputados Sargento Rodrigues e Paulo Cesar questionaram ainda a assessora da Polícia Civil na Secretaria de Defesa Social, Cristiane Lima, sobre sua atuação no dia da chacina. De acordo com eles, assim que chegaram ao local, verificaram que ela estava à frente da operação e tomando providências para a transferência dos presos e dos corpos ao IML de Belo Horizonte. Na audiência, eles quiseram saber quem a havia designado para tomar as citadas providências.

Em sua defesa, a assessora disse que estava no local cumprindo uma determinação do secretário de Defesa Social, Maurício Campos Júnior, e que tinha apenas a função de informar seus superiores dos acontecimentos na cadeia. "Fui chamada para receber os deputados e fazer a interlocução entre a Polícia e a Secretaria. Sou uma delegada de nível 2 e, por isso, não tenho autonomia para tomar qualquer providência nesses casos. Os parlamentares questionaram as afirmações da assessora e afirmaram que foram mal recebidos na cadeia. "O trabalho ao qual ela foi designada foi mal feito e ela estava tomando providências sobre transferências de presos e corpos", reforçou o deputado Paulo Cesar.

Ao final da reunião, o deputado Luiz Tadeu Leite pediu aos deputados e autoridades que não deixem a questão esfriar e se perder na morosidade da Justiça. "A sociedade não agüenta mais a impunidade. Precisamos nos solidarizar tanto com os familiares dos presos mortos, quanto dos servidores das polícias que enfrentam tantas dificuldades em seu cotidiano de trabalho", pediu. Os deputados Durval Ângelo e Antônio Júlio também pediram providências, mas recomendaram cuidado com os resultados da investigações. "Não podemos ser levianos na conclusão do caso. Afinal, por trás de tudo isso está o velho problema do sistema prisional", disse Durval Ângelo.

Sobre as investigações, o deputado Sargento Rodrigues disse que já está agendada para o dia 19 de setembro uma reunião com os chefes das Polícias Civil e Militar e com o secretário de Defesa Social para tratar da chacina, assim como das condições do sistema prisional do Estado.

Requerimentos - A comissão aprovou ainda dois requerimentos de moção de aplauso ao presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), desembargador Orlando Adão de Carvalho, extensivo ao juiz da comarca de Taiobeiras, Evandro Kangussu, e ao delegado Marco de Souza Pimenta, sobre a condução do caso que culminou na prisão do ex-prefeito daquele município, Joel da Cruz. Moção também para o chefe da Polícia Civil, Marco Antônio Monteiro, extensivo aos demais policiais da cidade, sobre o mesmo caso.

Presenças - Deputados Sargento Rodrigues (PDT), presidente; Paulo Cesar (PDT), vice; Délio Malheiros (PV), Luiz Tadeu Leite (PMDB), Antônio Júlio (PMDB), Durval Ângelo (PT), Weliton Prado (PT) e Padre João (PT).

 

 

 

Responsável pela informação: Assessoria de Comunicação - 31 - 2108 7715