Comissão apura denúncias de corrupção na Saúde Pública em
Januária
A Comissão de Saúde da Assembléia Legislativa de
Minas Gerais deslocou-se, nesta quinta-feira (14/6/07) para
Januária, no Vale do São Francisco, para investigar os graves
problemas de saúde pública que afetam a população daquele pólo
regional. O requerimento foi do deputado Carlos Pimenta (PDT), que
reclamou da falta de recursos para o atendimento e o excessivo rigor
da Vigilância Sanitária, que interditou o único bloco cirúrgico da
cidade, segundo o deputado, com exigências descabidas.
"Januária hoje só atende casos de baixa e média
complexidade, cumprindo um papel muito inferior à sua posição como
pólo regional. O péssimo estado das estradas também pode ser tratado
como problema de saúde pública, por causa da dificuldade para
transferir pacientes", acrescentou o parlamentar. Antes do último
desmembramento, Januária era o maior município mineiro, com 12.750
km². Vereadores e autoridades relataram o grande sacrifício a que se
submetem pacientes que vêm de Chapada Gaúcha, Bonito de Minas,
Miravânia, Manga ou Juvenília em busca de tratamento em Januária,
percorrendo estradas ruins e longas extensões.
Outro deputado médico que representa a região,
Arlen Santiago (PTB), criticou a tabela do SUS, que paga R$ 2,50 por
consulta, e a diária de R$ 7,00 que mal chega para pagar duas
refeições ao paciente internado. "Mais de cem hospitais de Minas já
deixaram de atender pelo SUS, enquanto o governo federal desviou R$
35 bilhões da CPMF para fazer superávit primário. Só para rolar a
dívida pública, o Brasil gasta R$ 140 bilhões por ano", ilustrou.
Santiago revelou ainda que 99% da população da
região depende do SUS, e que apenas 1% têm condições de pagar planos
privados de saúde. Também criticou o estado vergonhoso das estradas:
"Uma mulher prestes a dar a luz sente, além da dor do parto, a dor
da estrada", explicou o deputado.
Jornalista denuncia corrupção em todos os
níveis
As mais graves denúncias foram apresentadas na
reunião pelo jornalista Fábio Oliva, do jornal "Folha do Norte", ao
sustentar a tese de que não faltam recursos para a saúde em
Januária, mas uma teia endêmica de desvios impediria um atendimento
decente à população. "Não adianta os senhores deputados enviarem
dinheiro, porque muito já foi enviado e foi embolsado pela corrupção
na saúde. Grande parte dos R$ 375 mil enviados de uma vez pelo
Pro-Hosp sumiram numa fraude da licitação ganha pela empresa de um
parente do então secretário da Saúde. Nos últimos três anos, tivemos
seis prefeitos. Dois deles foram cassados por fraudes contra o
sistema de Saúde", denunciou.
Fábio Oliva descobriu que, das seis ambulâncias da
Prefeitura, quatro estão recolhidas como inúteis na garagem do
órgão, e que, de janeiro a abril, foram gastos R$ 175 mil em peças.
Na inauguração de uma ala do hospital tinha sido montado um cenário
com colchões e roupas de cama emprestados por uma empresa, que
recolheu o material no dia seguinte.
O jornalista afirma que os mesmos vereadores que
pediram uma CPI da Saúde na Câmara haviam sido comprados para
arquivá-la. "No pronto-socorro tem pacientes que recebem uma sutura
e saem segurando a gaze com a mão, porque falta esparadrapo. Faltam
seringas para aplicar injeções, faltam luvas cirúrgicas e, às vezes,
os médicos operam com sua roupa comum, porque faltam jalecos.
Sabemos de casos de enfermeiras que retiram medicamentos do estoque
do hospital, atravessam a rua e trocam por cosméticos na farmácia da
esquina. Ou seja, a corrupção não está só no alto escalão. Está em
todos os níveis", desabafa o homem de imprensa.
Prefeito herdou administração devastada
O prefeito de Januária, Sílvio Joaquim de Aguiar,
está no cargo há menos de 60 dias, e afirmou que se dedica pelo
menos 15 horas por dia a reconstruir a administração da cidade,
devastada durante o episódio de afastamento do ex-prefeito João
Ferreira Lima, por envolvimento na Máfia dos Sanguessugas.
Aguiar disse ter compreendido que a saúde é
prioridade e por isso retomou a obra de construção da maternidade e
da lavanderia no hospital municipal, que custarão cerca de R$ 500
mil. Assegurou aos deputados que está empenhado em fazer uma gestão
transparente e não permitir que sua administração se envolva em
falcatruas. Disse que se envergonha também do lixão da cidade, onde
trabalham até crianças, mas que atualmente não tem condições de
enfrentar a enorme despesa que é a construção de um aterro
sanitário.
Por outro lado, os representantes de Manga
sustentaram que o hospital da cidade, apesar de possuir uma
administração irrepreensível, vive na maior penúria e está prestes a
fechar as portas, já que seu único convênio é o do SUS, que cobre
apenas 18% de seus custos. "Na região, 70 mil pessoas recorrem ao
nosso hospital, e os administradores vivem enforcados com essas
despesas", afirmou Débora de Fátima Ramos Costa, presidente da
Fundação de Amparo ao Homem do Campo de Manga. Ela quer também
compromisso dos que trabalham no hospital.
Também o hospital de Itacarambi enfrenta
dificuldades, segundo Marisa Dias, secretária municipal de Saúde.
"Atendemos baixa e média complexidade, mas temos dificuldade para
dar uma assistência digna a uma gestante, por exemplo. Um pequeno
hospital como o nosso custa R$ 100 mil por mês, e arrecadamos apenas
R$ 20 mil com as AIHs. Nosso sonho é um PSF bem estruturado no
município, mas os médicos querem R$ 10 mil por mês para trabalhar em
Itacarambi", queixou-se.
Requerimento de investigação do MP é
prioridade
Ao final da reunião, o deputado Carlos Pimenta
disse que regressava a Belo Horizonte com grande preocupação, porque
esperava levantar uma situação ruim, mas constatou que era pior.
Arlen Santiago insurgiu-se contra os maus médicos da cidade e disse
que, se necessário, propunha-se a trazer para Januária médicos de
Montes Claros, com prioridade para cirurgiões e anestesistas.
O presidente da comissão, deputado Carlos Mosconi,
também manifestou grande preocupação com a situação de descalabro em
que caiu a saúde pública em Januária. "O retrato final da história é
a carência da população, a quem falta o que não pode faltar. Não
deixaremos esta situação assim de maneira alguma. Estamos
interessados em ajudar a solucionar os problemas de vocês",
comprometeu-se o presidente.
Nove requerimentos foram apresentados na reunião.
Antes de lê-los, Mosconi disse que o primeiro e mais importante era
subscrito por todos os deputados, encaminhando as denúncias do
jornalista Fábio Oliva para apuração do Ministério Público e do
Tribunal de Contas do Estado. Carlos Pimenta e Arlen Santiago
pediram a inclusão do Hospital de Manga na 3ª etapa do Pro-Hosp;
recursos emergenciais para Manga; centro de Hemodiálise em Januária;
veículos do transporte sanitário para Januária; recursos para
conclusão da Maternidade de Januária; construção de mais centros
Viva Vida, com recursos para mantê-los; reabertura do bloco
cirúrgico do Hospital de Januária; atualização dos pagamentos do
Pro-Hosp em Januária.
Esses requerimentos foram dirigidos ao secretário
de Estado de Saúde, Marcus Pestana, e ao chefe da Vigilância
Sanitária, José Geraldo Castro. Ao ministro da Integração Nacional,
Gedel Vieira Lima, e ao presidente da Codevasf os deputados pediram
recursos para aterros sanitários em Januária e nas cidades vizinhas,
como parte do programa de revitalização do rio São Francisco.
Depois da reunião, os deputados visitaram o
pronto-socorro do Hospital Municipal, onde ouviram queixas dos
usuários, conheceram as obras da maternidade, verificaram as
condições do bloco cirúrgico interditado e depois visitaram a
construção do centro Viva Vida.
Presenças - Deputados
Carlos Mosconi (PSDB), presidente da Comissão; Carlos Pimenta (PDT)
e Doutor Rinaldo (PSB) e Arlen Santiago (PTB). Além dos citados,
compuseram a mesa ainda o prefeito de Bonito de Minas, José Raimundo
Viana; o gerente regional de Saúde de Januária,Carlos Emanuel
Pereira da Costa; o secretário municipal de Saúde, João Lourenço
Normanha Neto. Cinco vereadores de Januária participaram da
reunião.
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