Agricultura familiar provoca aumento da mão-de-obra
infantil
Desde 2004 o Brasil voltou a apresentar aumento da
mão-de-obra de crianças e adolescentes entre cinco e 16 anos,
sobretudo nas atividades agrícolas e da economia familiar. Minas
Gerais foi o Estado do Sudeste com o maior índice de exploração de
trabalhadores menores de idade, neste período. Além desse quadro, há
o temor de que com os recursos que serão disponibilizados para os
agricultores familiares, no programa de biocombustíveis, haja um
aumento do trabalho infantil nessa área. As informações foram
prestadas nesta terça-feira (12/6/07), na audiência pública
realizada pela Comissão de Participação Popular da Assembléia
Legislativa de Minas Gerais, que discutiu o tema, em comemoração ao
Dia Internacional de Combate ao Trabalho Infantil.
A audiência foi requerida pelo deputado André
Quintão (PT), presidente da Comissão, a pedido do Fórum Estadual de
Combate ao Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente (Fectipa). Os
dados apresentados na reunião são da Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios (PNAD), do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), de 2005. Eles mostram que, de 1995 a 2003, o
trabalho infantil apresentou queda e que a partir de 2004 houve
reversão dessa tendência.
A preocupação com a possibilidade de aumento do
trabalho infantil nos programas de biocombustível foi manifestada
pelo auditor fiscal do Ministério do Trabalho, Tadeu de Medeiros
Lima, para quem, com os recursos que serão colocados à disposição
dos agricultores familiares, a tendência é o uso da mão-de-obra
disponível, ou seja, a da própria família, incluindo os filhos
menores. Ele destacou ainda a questão cultural, muito presente na
área rural, de utilização do trabalho infantil e adolescente como
forma de educação. Tadeu Lima enfatizou a necessidade de as
autoridades desenvolverem estratégias para evitar o trabalho
infantil nesse novo programa governamental.
O deputado André Quintão defendeu a
necessidade de integração das políticas públicas, que devem abranger
outros setores como educação e esportes. Para ele, a educação tem um
papel fundamental no combate ao trabalho infantil, sendo necessária
a adoção da escola integral, especialmente nas regiões de maior
vulnerabilidade. André Quintão também considerou importante o papel
desempenhado pelo Bolsa Família, "que ao transferir renda para as
famílias carentes contribui para que as crianças e adolescentes não
precisem trabalhar". E falou da necessidade de uma conscientização
das famílias para que elas compreendam que a renda gerada pelo
trabalho infantil é temporária e que o melhor para a família é
investir na educação da criança.
Trabalho infantil é maior no campo e na economia
informal
Segundo pesquisas de universidades, ongs e do
PNAD mais de 56% dos trabalhadores infantis estão na agricultura. A
maior proporção de crianças envolvidas nestas atividades
concentra-se na faixa etária dos cinco aos nove anos. Nesta faixa há
300 mil meninos e meninas trabalhando na atividade agrícola. Em
números absolutos, os trabalhadores de 15 a 17 anos subiram de 5,3
milhões para 5,4 milhões de 2004 a 2005. Os dados foram apresentados
pela coordenadora do Fectipa, Elvira Cosendy.
Segundo ela, o crescimento maior se deu entre as
meninas, embora os meninos ainda respondam por dois terços do total
de crianças empregadas em 2005. Em relação às regiões brasileiras,
apenas o Nordeste e o Sudeste apresentaram aumento no trabalho
infantil. No Sudeste houve aumento da taxa de trabalho infantil de
7,9% para 8,6%, o que representa um aumento de 1,38 milhão para 1,49
milhão em números absolutos.
O auditor do Ministério do Trabalho, Tadeu Lima,
enfatizou a necessidade de combate às formas "invisíveis" do
trabalho infantil, como o trabalho doméstico. Para ele, o grande
problema enfrentado pelos órgãos de fiscalização é a falta de
instrumentos legais para combater estas atividades. "O trabalho
doméstico está protegido pela inviolabilidade do lar, como a
exploração sexual e a presença de crianças no narcotráfico, duas
atividades que passam para a alçada da polícia, já que são crimes e
o ministério pode apenas denunciar".
Outra dificuldade no campo da fiscalização foi
levantada pela representante da Federação dos Trabalhadores em
Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), Aparecida Penha
Vieira. Segundo ela, a ação da Fetaemg é vista pelos próprios
trabalhadores rurais como uma interferência indevida. "Somos
encarados como inimigos".
Soluções estão na educação e integração de
ações
Para a deputada Elisa Costa (PT) e o deputado
Carlin Moura (PCdoB), a solução do trabalho infantil passa pela
educação, com a melhoria do ensino e a implantação de escolas no
meio rural. Eros Biondini (PHS) destacou que a Assembléia quer ser
protagonista de uma mudança na justiça social e que a audiência
representou a busca desse caminho. O deputado João Leite (PSDB)
disse que a discussão ajudará os parlamentares na elaboração dos
documentos que irão tratar das políticas estaduais, como o PMDI e o
PPAG. A deputada Rosângela Reis (PV), presidente da Comissão do
Trabalho, da Previdência e da Ação Social, disse que o trabalho
infantil é um problema social gerado pelas desigualdades econômicas
do capitalismo, "mas isto não é motivo para nos acomodarmos".
O auditor Tadeu Lima defendeu uma campanha junto ao
Superior Tribunal de Justiça para o julgamento de uma ação direta de
inconstitucionalidade (Adin), que questiona artigo da Emenda à
Constituição nº 20, que estendeu a permissão de trabalho infantil
até 14 anos, na condição de aprendiz. Para ele, somente após o
julgamento da ação haverá uma regulamentação do que pode ou não pode
ser feito.
Ao lado das iniciativas da sociedade civil, como a
criação do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho
Infantil, em 1994, e dos fóruns estaduais; da Rede Nacional de
Combate ao Trabalho Infantil, em 2000; e da Rede de Monitoramento
Amiga da Criança, em 2003, Elvira Consedy destacou as iniciativas
oficiais, como a criação do Programa de Erradicação do Trabalho
Infantil (Peti), em 1996; do Plano Nacional de Prevenção e
Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente
Trabalhador, em 2003.
Ela destacou como desafios desses organismos, a
luta pela mudança de valores culturais e a construção de uma cultura
de direitos; a garantia de escola de qualidade e inclusiva; a
integração das ações e articulação das políticas púbicas; o apoio, a
promoção e inclusão produtiva das famílias, finalização do trabalho
infantil na informalidade e a capacitação para o exercício do
controle social.
A representante da Secretaria de Estado de
Desenvolvimento Social (Sedese), Albanita Roberta de Lima, defendeu
a integração de ações entre os diversos órgãos que tratam do
assunto, lembrando que o Peti não consegue erradicar o trabalho
infantil. E o fortalecimento dos municípios como forma de
desburocratizar os programas federais. Albanita disse que o Estado
está empenhado em fazer um diagnóstico preciso sobre o trabalho
infantil e suas formas nas diversas regiões mineiras.
Presenças: Deputados André Quintão (PT),
presidente; Eros Biondini (PHS), vice; Carlin Moura (PCdoB); João
Leite (PSDB); e as deputadas Elisa Costa (PT) e Rosângela Reis (PV);
vereadora em Belo Horizonte Neila Batista (PT); Dagoberto Alves
Batista, do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do
Adolescente; Antônio Lambertucci, delegado Regional do Trabalho,
além das personalidades citadas na matéria.
|