Municípios precisam ter visão global na gestão das águas

Pensar globalmente e agir localmente. Essa premissa da gestão ambiental foi salientada pelo coordenador-geral do Proj...

22/03/2007 - 00:01
 

Municípios precisam ter visão global na gestão das águas

Pensar globalmente e agir localmente. Essa premissa da gestão ambiental foi salientada pelo coordenador-geral do Projeto Manuelzão, Apolo Heringer Lisboa, no debate sobre "O papel dos usuários e dos municípios na gestão das águas", realizado nesta quinta-feira (22/3/07) durante o 6º Fórum das Águas, na Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Segundo Lisboa, o tema remete aos comitês de bacias hidrográficas (CBHs), nos quais a visão municipalista de alguns prefeitos entra em choque com a visão de bacia ou de ecossistema que orienta a gestão compartilhada e descentralizada nesses comitês.

"De que adianta um prefeito proteger um curso d'água, se ele é poluído acima do seu município? Alguns acidentes recentes em Minas, como o de Miraí, afetaram a água no Rio de Janeiro. Isso derruba até a visão estadual de gestão das águas", argumenta o ambientalista. Presidente do CBH do rio das Velhas, Apolo Lisboa argumenta que muitos prefeitos consideram a questão ambiental um luxo ou frescura, mas que até o Plano Diretor do município deve se adequar à bacia hidrográfica. "Com o projeto do Rodoanel, várias cidades da região do Córrego da Mata estão correndo para fazer planos diretores, mas o Plano Diretor da bacia não pode ser a soma deles, sem levar em conta toda a região cárstica", reforça. Regiões cársticas são caracterizadas por uma topografia característica, oriunda da dissolução de rochas calcárias ou dolomíticas.

Os grandes usuários, segundo Lisboa, também têm um choque nos comitês, onde não se resolve o problema direto com o governo, mas discutindo e votando junto com o povo. Essa relação, porém, de acordo com o ambientalista, têm avançado, em função da exigência legal e da visão mais moderna de que a poluição da água atinge os negócios da empresa. "A gestão de conflitos torna o comitê interessante. E temos conseguido aprofundar debates e votar de forma unânime. Mas os atores ainda estão acanhados na participação. É uma questão de tempo", avalia.

Secretários abordam experiências dos municípios

Problemas vividos pelos municípios, como a ocupação desordenada, a impermeabilização dos solos e a coleta inadequada de esgotos foram citados pela secretária de Meio Ambiente de Belo Horizonte, Flávia Mourão Parreira do Amaral. Segundo ela, a capital mineira tem usado de instrumentos de controle - como licenciamento e fiscalização - e de recuperação, como a transferência de potencial construtivo, para enfrentar esses desafios. "O Orçamento Participativo também tem garantido a manutenção das populações residentes, amenizando o problema da periferização", acrescenta.

Já o secretário de Meio Ambiente de Montes Claros, Paulo Ribeiro, apresentou o "Ecocrédito", mecanismo que dá incentivo financeiro, baseado na renúncia fiscal, a produtores rurais que preservem áreas privadas definidas como prioritárias pelo município. "A prefeitura paga R$ 110,10 por hectare/ano para a preservação, por exemplo, de nascentes, mata ciliar e áreas cársticas. Em três anos, teremos 3 mil hectares dessas áreas, com grande potencial para o ecoturismo e para o extrativismo", prevê. Para Ribeiro, o Ecocrédito rompe o paradigma da punição e passa a orientar o homem do campo, aliado indispensável em qualquer política de recursos hídricos.

O secretário de Montes Claros fez ainda uma crítica ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos, do qual é conselheiro, por não estipular normas para a construção de estradas. Ele cita estudos que apontam que a locação inadequada e a má conservação das estradas respondem por 70% do assoreamento dos rios. "Temos barrancos em Minas que chegam a 50 metros de altura. Para onde vai a terra? Segundo a Emater, 56 córregos secaram em Montes Claros nos últimos anos em função do assoreamento. No Norte de Minas são 600, e ninguém é punido. Eu falo para surdos porque quem banca as campanhas políticas são as empreiteiras", afirmou.

Ribeiro também se manifestou contra a reserva legal de 20% da propriedade, nos moldes como funciona atualmente. Essas áreas, segundo ele, deveriam ser, prioritariamente, as áreas de preservação permanente, como córregos e nascentes, que totalizam cerca de 40% do território nacional. Para isso, o produtor deveria receber orientação e incentivo. "Está sobrando técnica e faltando utopia na área ambiental", finalizou.

Homem será responsável pelo consumo de toda água doce do planeta

A perspectiva de que daqui a 10 ou 15 anos toda a água doce disponível no planeta será consumida pelo ser humano, sem sobrar para a biodiversidade e o ecossistema, foi uma das informações apresentadas pelo professor do curso de Engenharia Sanitária e Ambiental do Centro Universitário do Leste de Minas Gerais (Unileste/MG), Millôr Godoy Sabará. Segundo o professor, no ano de 2000, o consumo de água doce já era de 5 mil km³/ano, enquanto o volume disponível no planeta é de 15 mil km³/ano. "Estamos numa equação sem solução", afirmou.

Millôr Sabará, também consultor da V&M Tubes do Brasil, explicou que a água doce é consumida principalmente na agricultura, que responde por 70% do consumo, seguida da indústria, das cidades e das represas. Como exemplo ele citou que, para produzir um litro de etanol, são necessários 500 litros de água. Neste sentido, o professor sugeriu campanhas de extensão técnica para focar o uso racional do recurso.

Ao destacar a gravidade do momento atual em relação à degradação ambiental, o professor do Unileste apresentou três grandes lições do século XX: a incapacidade dos modelos econômicos em diminuir as diferenças entre os países pobres e ricos; a constatação que esses modelos são insustentáveis social e ambientalmente; e a de que estamos destruindo os sistemas de suporte de vida no planeta. " O aquecimento global, por exemplo, é conhecido no meio científico há 50 anos e nada foi feito. Estamos vivendo um momento castastrófico", completou. O professor acredita que o reconhecimento do uso natural do solo é necessário para a criação de macro-estratégias para reabilitação, conservação e manejo da água. Ele recomendou ainda a adoção de mecanismos legais e fiscais para incentivar proprietários rurais a realizar o manejo ambiental de suas propriedades.

Coordenadora dos debates, a deputada Maria Lúcia Mendonça (PFL) lembrou que os municípios são decisivos na gestão dos recursos hídricos, por ser o local onde as pessoas vivem e exercem a cidadania. Ela salientou a necessidade da educação ambiental, do básico à universidade; da fiscalização e punição a quem degrada; e ainda do estímulo financeiro a quem protege o meio ambiente. "O homem moderno empobreceu a natureza. É urgente uma política integrada por poder público, sociedade e usuários para a utilização nacional dos recursos hídricos. E é preciso sair das leis para a ação", sintetizou.

O presidente da Fundação Estadual do Meio Ambiente, Ilmar Bastos Santos, também coordenador dos debates, defendeu um maior engajamento da sociedade nos comitês de bacia, frutos da Lei 9.433, de 1997, a Lei das Águas, que comemora dez anos. "Há espaços abertos para a participação. Poder público e setor produtivo devem estar atentos à participação mais democrática na gestão dos recursos hídricos", defendeu.

 

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