Indignação é tônica de palestras sobre sensibilização
social
Mobilizar a sociedade para que cada cidadão assuma
sua responsabilidade pela proteção dos recursos hídricos. Essa foi a
tônica do discurso de todos os palestrantes que participaram do
painel "Escassez de água e sensibilização social", realizado na
tarde desta quarta-feira (21/3/07) no Plenário da Assembléia
Legislativa de Minas Gerais. O painel é parte da programação do 6º
Fórum das Águas, evento que já faz parte do calendário oficial da
Casa e que se estenderá até a próxima sexta-feira (23).
O primeiro a fazer a exposição foi Paulo Célio de
Figueiredo, que representou o coordenador do Fórum Nacional da
Sociedade Civil na Gestão de Bacias Hidrográficas (Fonasc), João
Clímaco Soares de Mendonça Filho. Ele lamentou que o meio ambiente
ainda não seja uma preocupação prioritária dos gestores públicos e
afirmou que a poluição da água gera violência e afeta a saúde das
pessoas. Lembrou que a evasão do homem rural para a cidade, por
exemplo, gera "aviões" (entregadores de drogas) para traficantes e
expande as favelas, que são focos de doenças de veiculação
hídrica.
"Os prefeitos são os últimos que nos atendem e eles
são os primeiros gestores públicos", denunciou, acrescentando que
também as empresas destinam verbas para atividades que atraem mídia,
mas limitam recursos para a proteção, por exemplo, de nascentes ou
mananciais de água. Paulo Figueiredo conclamou a sociedade a cuidar
dos recursos hídricos do Brasil e investir, sobretudo, na educação.
"Só se transforma um povo através da educação", justificou.
A secretária-geral adjunta e porta-voz da
Defensoria da Água, Maria Helena Murta, iniciou sua fala pedindo à
platéia que refletisse sobre o impacto da escassez da água para as
crianças, principalmente as que ainda não nasceram. "Nós já nos
fartamos bastante (da água), mas não temos certeza se elas terão
essa oportunidade". Na opinião dela, é preciso investir nas crianças
para que elas possam defender e velar pela velhice dos atuais
adultos.
Maria Helena afirmou que a Defensoria recebe
milhares de denúncias, de todos os estados do País, de poluição,
desrespeito e falta de compromisso com a natureza, principalmente,
dos administradores públicos e representantes governamentais.
Afirmou que o Aquífero Guarani, o maior manancial subterrâneo de
água doce do mundo e que tem sua maior extensão no Brasil, já está
contaminado com coliformes fecais (bactérias localizadas nas fezes).
Ela também convocou todos a defenderem a água, que é o símbolo da
vida. "Cada um de nós pode mudar a realidade. Só nos falta a
vontade".
Ao lembrar que o corpo humano é formado entre 70% e
75% por água, o professor da PUC-Minas, Ricardo Ferreira Ribeiro,
lançou uma frase numa alusão a uma passagem bíblica: "tu és água e
como água poderás evaporar". Ribeiro citou vários usos da água, como
para consumo humano, higienização, irrigação, transporte entre
tantos outros, e advertiu que é preciso conservar e recuperar as
nascentes de água para reduzir o risco de sua escassez.
Para isso, segundo o professor, é necessário que
sejam preservadas ou regeneradas áreas que abrigam as nascentes,
implantar sistemas agroflorestais que permitam o uso sustentável das
reservas e criar unidades de conservação, com manejo sustentável,
principalmente no Cerrado, região considerada a caixa d´água do
Brasil. Lembrou que as nascentes possibilitam não apenas água de
qualidade, mas também uma oportunidade de renda para as
populações.
Ribeiro revelou que a luta pelas águas já é fator
de conflitos em várias regiões brasileiras e que vêm aumentando a
cada ano. Mostrou dados da Comissão Pastoral da Terra que mostram
que os conflitos por água subiram de oito, em 2002, para 71, em
2005. As famílias envolvidas subiram de 227 para 32.463, envolvendo
mais de 160 mil pessoas, distribuídas por todo o País.
O procurador regional da República, Alexandre
Camanho de Assis, se indignou com a indiferença que ele percebe da
sociedade em relação à natureza. Considerou "cinismo" as datas dos
Dias da Mulher, da Árvore e da Água porque, em sua opinião, os
ocidentais passam o ano inteiro maltratando tanto a mulher quanto a
árvore e a água e tiram apenas um momento para homenagens. "Temos a
mania terrível de trair o que nos é mais caro", desabafou.
Camanho acusou o Estado de ser o maior inimigo do
meio ambiente, porque é indulgente com as empresas predadoras,
omisso com os problemas recorrentes e corrupto, desviando recursos
que seriam importantes para a resolução dos problemas. "Dois milhões
de crianças morrem (anualmente) no mundo por causa da água que
bebem", disse.
Para o procurador, cada cidadão precisa repensar
sua própria ética e assumir o papel pela defesa do ambiente. "Nós
rompemos com a natureza. Depredamos, devastamos e agora estamos
atônitos, impotentes. Cada geração precisa acreditar que pode salvar
o mundo", ponderou.
Defesa da Igreja - Antes
das palestras, durante a abertura da Reunião Especial para a
realização do fórum, o deputado João Leite fez uso da palavra para
solicitar que se inclua na ata da reunião a fala completa do diretor
da Área de Informação da Agência Nacional de Águas (ANA), Dalvino
Troccoli Franca, que participou dos debates realizados na parte da
manhã. João Leite afirmou que o representante do governo Federal
atacou a Igreja Católica, que está se posicionando contra a
transposição do Rio São Francisco.
Segundo o parlamentar, Dalvino Franca teria dito
que a Igreja não tem que interferir na questão e que o Estado é
soberano para essa decisão. "Na democracia, todos somos convocados a
colocar nossas opiniões", reclamou João Leite.
Debates - O deputado Almir
Paraca (PT) foi o coordenador da fase de debates, ao lado do
representante do Movimento Pró-Rio Todos os Santos e Mucuri, Marco
Antônio Fernandes Silva. Paraca agradeceu a presença de todos,
elogiou as palestras, que considerou instigantes, e citou o Frei
Leonardo Boff, ao comentar: "ou nos salvamos todos ou nos perdemos
todos".
Os participantes levantaram questões como a
preservação das nascentes remanescentes nas grandes cidades e nas
regiões rurais e a falta de participação e comprometimento da
comunidade nas discussões ambientais. O autônomo Alexandre Miguel
Rodrigues, que trabalha com limpeza de caixas d'água, comentou o
desperdício de água. Segundo ele, edificações acima de quatro
andares precisam ter uma reserva técnica de água para os casos de
incêndio. "Hoje, durante a limpeza, essa água é descartada e poderia
ser reaproveitada", afirmou.
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