Trabalhadores rurais se mobilizam em protesto por
assassinato
Em clima de revolta e consternação, cerca de 100
pessoas, entre trabalhadores rurais, vereadores, servidores públicos
da área de segurança e líderes comunitários acompanharam nesta
quarta-feira (7/3/07), audiência pública da Comissão de Direitos
Humanos, realizada na Câmara Municipal de Minas Novas, no Vale do
Jequitinhonha.
A reunião, requerida pelo presidente da comissão,
deputado Durval Ângelo (PT), teve por objetivo esclarecer a morte do
trabalhador rural Antônio de Jesus Santos, 32 anos, assassinado em
24 de dezembro do ano passado pelo gerente-capataz da Fazenda
Alagadiço, João Antônio da Silva, no distrito de Córrego Varão.
Alguns dos presentes exibiam cartazes e faixas de protesto contra o
crime e a empresa Acesita, uma das acusadas de fomentar o conflito
na região.
A vítima era um dos moradores sem-terra que ocupam
a fazenda, desde fevereiro de 2000. Conforme depoimentos prestados
na Delegacia local, depois de beberem cerveja e cachaça, Antônio
Santos e seu irmão, Luciano, se dirigiram para um local na
propriedade, onde há um hospital abandonado. Luciano jogou uma
garrafa e quebrou um vidro de uma das janelas. Ao saber do ato, o
capataz, conhecido por "João do Alagadiço" se dirigiu ao local e
começou uma discussão. Quando Antônio afirmou que não pagaria o
prejuízo foi baleado. O assassino ainda correu atrás do irmão, sem
conseguir alcançar. Ao voltar e perceber que o trabalhador rural
continuava vivo deu o segundo e fatal tiro. Antônio deixou esposa e
dois filhos - de um ano e três meses e de seis meses.
Impunidade conhecida
Na opinião de Durval Ângelo, o crime é mais uma
conseqüência do quadro de impunidade vivida em Minas Gerais. Ele
citou vários assassinatos de trabalhadores rurais ocorridos no
Estado nos últimos anos e disse que eles são cometidos em função da
"ação tardia e omissão do próprio Estado".
O deputado explicou que aquela região vive, há mais
de 20 anos, em grave clima de conflitos agrários, sobretudo por
causa da presença da Acesita em latifúndios que mantêm monoculturas
de eucalipto, que acabaram por expulsar posseiros e trabalhadores
que cultivavam as áreas.
Sobre a Fazenda Alagadiço, o deputado afirmou que a
área é dividida entre dois grandes grupos: um formado por delegados,
entre eles Osman Canela, que é acusado de vários crimes como tráfico
de drogas e ameaças de morte, e que comprou algumas glebas de terra
da siderúrgica, de forma irregular. Outra área, de 25 mil hectares,
dos quais 3 mil estão cercados, é de propriedade da Fundação Pietro
Salini que, de acordo com os moradores, foi abandonada por italianos
que trabalharam ali no passado. A área possui construções
abandonadas, como o hospital que gerou a discussão que envolveu o
assassinato de Antônio Santos.
O pai do assassinado, Geraldo Martimiano Santos,
disse que o capataz faz ameaças às famílias acampadas desde o
primeiro dia da ocupação. "A gente vinha agüentando firme todo tipo
de agressão", lamentou. A presidente do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais de Capelinha e Angelândia, Maria da Conceição Moreira,
reclamou que já havia encaminhado um pedido de providência ao
Ministério Público em 4 de dezembro, antes, portanto, do crime. Ela
confirmou as pressões sofridas pelos trabalhadores considerando que
isso é "fruto de desespero de grileiros de terra".
O promotor de Justiça de Minas Novas, Adriano Dutra
Gomes de Faria, admitiu a história de opressão sobre os
trabalhadores e o delegado da comarca, Daniel de Carvalho Isidório,
afirmou que o assassino já foi indiciado anteriormente por violência
e ameaças.
Vários participantes fizeram depoimentos reforçando
o conflito agrário da área. Segundo o assessor técnico jurídico de
Conflitos Agrários do Instituto de Terras do Estado de Minas Gerais
(Iter), Élcio Pacheco, a área comprada pelos delegados foi
indeferida por várias irregularidades.
Outro trabalhador, Antônio Luiz de Azevedo,
apresentou outra denúncia contra a Acesita que, de acordo com ele,
teria adquirido suas terras por coação. Para o procurador de
Justiça, da Coordenadoria de Conflitos Agrários (CAO), desembargador
Afonso Henrique de Miranda Teixeira, não há dúvidas de que o crime
foi decorrente do conflito agrário, assunto que transcende o âmbito
do município e que deve ser analisado pelo Ministério Público
Estadual.
Providências - Diante das
denúncias, o deputado Durval Ângelo apresentou 12 requerimentos para
apurar melhor o caso. O parlamentar solicita informações e
providências de órgãos envolvidos com o assunto, como o Iter, o
Tribunal de Justiça, Corregedoria de Polícia Civil, Comissão
Interamericana de Direitos Humanos, Secrataria Nacional de Direitos
Humanos, Conselho Nacional de Direitos Humanos e Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Pediu, também, que cópia
de uma reportagem feita pelo Estado de Minas em agosto de 2004,
abordando o problema dos conflitos agrários, fosse encaminhada para
órgãos de meio ambiente de Minas para avaliar a legalidade das
propriedades.
Presenças - Deputado Durval
Ângelo (PT), presidente; tenentes PMs Gilmar Pereira Gomes e
Edivaldo Sebastião Pinto, da 37ª Companhia do 3º Batalhão; Lauricéia
Pereira, esposa da vítima; o presidente da Subseção da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) de Minas Novas, José Coelho; os vereadores
Tim Vieira, presidente da Câmara; Alcides Guedes Filho, Antônio Lima
Ferreira, José Alberto Fernandes, Luiz Carlos Barbosa, Mércio
Fernando Nepomuceno, Orelino Teixeira de Sousa, Vadionor Silva Matos
e Waldemar Costa Santos Filho, além dos citados na matéria.
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