Milhões de brasileiros são obesos mórbidos e aguardam
cirurgia
Segundo levantamento do IBGE de 2003, 10 milhões de
brasileiros são obesos. Dados extra-oficiais, de ONGs que lidam com
o assunto, afirmam que pelo menos 2 milhões são obesos mórbidos e já
têm indicação para fazer cirurgia de redução de estômago, ou
gastroplastia. Cerca 80% deles dependeriam do Sistema Único de Saúde
(SUS) para fazer o tratamento. A fila é considerada imensa, porque a
média de cirurgias feitas pelo SUS é de apenas 2 mil por ano. O
assunto foi tema de palestras nesta sexta-feira (7/7/06) no Fórum
Técnico "Obesidade: Desafios e perspectivas", que a Assembléia
Legislativa de Minas Gerais realiza no Plenário.
Segundo um dos palestrantes, o membro titular do
Colégio Brasileiro de Cirurgiões e Cirurgiões-gerais dos Hospitais
Life Center e Baleia, Marcos Reis, depois que a obesidade chega ao
nível grave - em que o Índice de Massa Corporal (IMC) é igual ou
superior a 40 - a intervenção cirúrgica é praticamente a única
alternativa. Ele alertou, no entanto, que apesar de ser o tratamento
mais indicado, o índice de sucesso das cirurgias é considerado
baixo, mesmo em países desenvolvidos que dispõem dos recursos
médico-hospitalares mais modernos. "A saúde pública não consegue
lidar com o problema ainda. A melhor opção, sem nenhuma dúvida, é a
prevenção", afirmou.
Marcos Reis listou uma série de doenças
relacionadas com a obesidade, entre elas a osteoartrite, a
hipertensão arterial, a depressão, o colesterol alto e o refluxo
gastro-esofágico. Segundo ele, os Estados Unidos continuam sendo o
país com maior número de obesos, mas esse é um problema que cresce
no mundo inteiro, independentemente da cultura local. De acordo com
o médico, mesmo que tenha acesso à cirurgia, a expectativa de vida
de um obeso mórbido que chega à idade adulta é dez anos menor que a
de um não-obeso.
Cirurgias pedem acompanhamento rigoroso
Ainda segundo Marcos Reis, a complexidade da
cirurgia e a baixa remuneração das equipes médicas que a realizam
contribui para aumentar a fila de espera. "O SUS paga pouco mais de
300 reais por cirurgia, para ser dividido entre todos os
profissionais que participam", disse ele. A fase de preparação para
uma gastroplastia dura de três a quatro meses, se a pessoa não tiver
nenhuma outra doença grave. São necessárias consultas com vários
especialistas diferentes e uma série de exames detalhados. De acordo
com o médico, o pós-operatório é delicado e o risco de complicações,
que vão desde a infecção da ferida até embolia pulmonar e morte, é
grande. Por isso, o paciente deve continuar sendo acompanhado
durante alguns anos depois da cirurgia.
Belo Horizonte possui, hoje, dois hospitais
credenciados pelo SUS para realizar a cirurgia: a Santa Casa e o
Hospital das Clínicas. Cada um realiza apenas oito por mês. A
secretária adjunta da Secretaria Municipal de Saúde de Belo
Horizonte, Maria do Carmo, afirmou que a maior dificuldade dessas
instituições não é o leito que o paciente ocupa ou os equipamentos
utilizados, mas sim formar equipes de profissionais especializados
para trabalhar no pré e no pós-operatório. Ela reconheceu que além
da fila conhecida dos já cadastrados para fazer a cirurgia, ainda
existe uma outra não conhecida. "A partir de um determinado momento,
nós começamos a não cadastrar mais pessoas, porque sabemos que não
temos condições de atender a todos", admitiu.
De acordo com o doutor em saúde pública e consultor
técnico da Unimed/BH, Henrique Leonardo Guerra, a obesidade e as
doenças decorrentes dela são um problema hoje não só para o SUS, mas
para todos os operadores de saúde. Segundo ele, a Unimed realiza, em
média, 60 gastroplastias por mês em Belo Horizonte. A empresa
estaria começando a investir também na prevenção, tentando
identificar entre seus clientes crianças e adolescentes com
sobrepeso, para evitar que se tornem adultos obesos graves.
Preocupação recente - A
secretária adjunta de saúde de Belo Horizonte, Maria do Carmo, disse
que a saúde pública está se esforçando hoje para corrigir um erro do
passado, que foi não cuidar da prevenção à obesidade. "A obesidade
só entrou na agenda da saúde pública do Brasil nos últimos dez anos.
Agora temos que correr para reverter o quadro alarmante que temos".
Há dez anos, segundo ela, a principal preocupação ainda era combater
a desnutrição.
Falta de profissionais dificulta prevenção
Durante a fase de debates do fórum, convidados e
participantes concordaram que a obesidade mórbida é um dos problemas
mais críticos no Brasil. Segundo o representante do Colégio
Brasileiro de Cirurgiões dos Hospitais Life Center e Baleia, Marcos
Reis, a prevenção é complexa, mas possível. "Atividades físicas
regulares e alimentação adequada são modos simples de se evitar a
obesidade mórbida. A dificuldade é fazer com que esta simplicidade
seja posta em prática em uma sociedade complexa como a nossa",
ponderou.
A falta de nutricionistas e psicólogos nas redes
públicas hospitalares também foi apontada como entrave na prevenção
e tratamento dos obesos no País. Questionada pelas nutricionistas
Márcia Freitas e Cassiara Nunes, a secretária adjunta de saúde de
Belo Horizonte, Maria do Carmo, concordou que o problema deve ser
tratado de forma multidisciplinar e por isso as equipes de saúde da
família devem estar mais capacitadas. "A ausência de profissionais
especializados atrapalha muito o tratamento da obesidade. É preciso
que isso seja feito o mais breve possível", disse.
Belo Horizonte tem hoje 506 equipes do Programa
Saúde da Família (PSF), que fazem a chamada atenção básica à saúde,
em que entram a prevenção e os primeiros cuidados. A secretária
adjunta Maria do Carmo informou que o número de nutricionistas nas
equipes do PSF ainda é bem pequeno, mas que todo o esforço está
sendo feito pela prefeitura para formar adequadamente as equipes, de
modo a enfatizar a prevenção. "A prevenção depende de mudança de
hábitos alimentares, e essa mudança esbarra em questões culturais e
socioeconômicas", explicou.
Foram debatidos ainda temas como cirurgias de
redução de estômago, atuação dos planos de saúde, programas de
prevenção nas escolas, morte precoce de idosos, custos da obesidade
para os cofres públicos e a dificuldade da criação de modelos e
políticas públicas que auxiliem no trabalho de combate à obesidade.
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