Especialista considera que Brasil vive epidemia de
obesidade
O presidente da Federação Latino-Americana de
Sociedades de Obesidade (Flaso), Walmir Ferreira Coutinho, abriu
nesta quinta-feira (6/7/06) a série de palestras do fórum técnico
Obesidade: desafios e perspectivas, no Plenário da
Assembléia. O médico endocrinologista trata a obesidade no Brasil
como uma "epidemia" e diz que as perspectivas para o país são
sombrias, se não forem adotadas medidas eficazes de controle o mais
rápido possível. Em sua exposição, ele chamou a atenção para o
aumento do sobrepeso entre adolescentes do sexo masculino e para a
influência do que os especialistas chamam de "Ambiente obesogênico",
ou seja, uma série de condições externas e hábitos da sociedade
moderna que só agravam o problema.
Para Walmir Coutinho, a tendência genética é só um
dos itens que podem levar a pessoa à obesidade, mas os fatores
ambientais como alimentação inadequada e inatividade física são os
mais importantes hoje. "Nosso patrimônio genético não mudou nas
últimas décadas, mesmo assim, o número de obesos aumenta a uma
velocidade alarmante", afirmou. Ele citou o exemplo do Rio de
Janeiro, onde o sedentarismo atinge 77% das mulheres e 59% dos
homens, segundo pesquisa recente. O hábito de comer fora de casa e
passar horas diante da televisão são outros vilões apontados pelo
médico. "As comidas e bebidas compradas prontas são cada vez mais
calóricas e artificiais. Precisamos mudar nossa cultura alimentar",
alertou.
Mudança de hábito - Um dos
dados mais preocupantes, na opinião do médico, é que os maus hábitos
alimentares passam de pai para filho, o que faz com que a obesidade
cresça muito entre as crianças e adolescentes, e que o surgimento de
doenças relacionadas a ela se dê cada vez mais cedo. "Pesquisas
indicam que até os cães e gatos que têm donos obesos tendem a ser
obesos também", ilustrou.
Walmir Coutinho garante que a mudança de hábitos
sempre deve ser almejada, em primeiro lugar; se mesmo assim a pessoa
não conseguir emagrecer, aí então devem ser administrados
medicamentos, mas "com muito controle e prudência". Segundo o
endocrinologista, existem hoje cerca de 200 medicamentos sendo
utilizados em "verdadeiras bombas para emagrecer", mas apenas sete
têm eficácia comprovada cientificamente e podem ser usados com
segurança. Intervenções radicais como a cirurgia de redução de
estômago só em último caso, acredita Walmir Coutinho.
Consumidores não sabem ler rótulos
Entre as ações legislativas já adotadas para o
combate a obesidade, o presidente da Flaso destacou como avanço a
rotulagem dos produtos alimentícios. O problema, segundo ele, é que
a maioria das pessoas não sabem o que significam as informações que
estão nas embalagens. Uma das idéias que têm sido discutidas no
Brasil é a possibilidade de adoção de rótulos de cores diferentes
para os produtos: vermelho para indicar alimentos que seriam
prejudiciais à saúde, e verde para os benéficos ou protetores do
organismo.
Na opinião de Walmir Coutinho, a estratégia,
adotada recentemente pela Suécia, pode ser de difícil implantação no
Brasil, mas tem se mostrado eficiente para alertar as pessoas sobre
os perigos da ingestão de certos alimentos. "Esta é uma decisão
política bastante complexa, mas a epidemia que vivemos pede medidas
mais drásticas mesmo", finalizou. O palestrante destacou, ainda, as
leis que já estão em vigor no Rio de Janeiro e em Santa Catarina,
proibindo a presença de guloseimas nas cantinas das escolas; embora
no Rio, segundo o próprio Walmir, a regra só funciona bem nas
escolas públicas.
Aumentam doenças relacionadas com a
obesidade
De acordo com dados do Ministério da Saúde, as
chamadas Doenças Crônicas não Transmissíveis (DNCT), entre as quais
estão as doenças cardiovasculares, diretamente ligadas à obesidade,
hoje superam, em muito, as infecciosas, que já foram o grande vilão
da saúde pública no Brasil. Entre as causas das DNCT estão o
tabagismo, o álcool, a alimentação inadequada e a falta de atividade
física. Se analisadas as causas de mortes em toda a América, o
sobrepeso e suas consequências só perdem para o tabagismo.
Desafios - A
coordenadora-geral da Política de Alimentação e Nutrição do
Ministério da Saúde, Ana Beatriz Vasconcellos, foi a segunda
palestrante da manhã desta quinta-feira (6). Ainda segundo o
Ministério, o consumo de gordura animal, açúcar e refrigerantes
aumentou em 400% nos últimos 30 anos, no Brasil. Este seria um dos
principais desafios do governo brasileiro, segundo Ana Beatriz:
mudar os hábitos alimentares dos brasileiros, incentivando o consumo
de frutas, verduras e legumes.
Ela citou várias ações que já vem sendo
desenvolvidas, como a edição da Portaria nº 1010, de 2006, pelos
Ministérios da Saúde e da Educação. A norma define critérios para
promoção da alimentação saudável nas escolas do país, incluindo a
realização de campanhas educativas e o estímulo à criação de hortas
escolares.
Outro desafio, na opinião de Ana Beatriz, é regular
a propaganda de alimentos no país, por causa da resistência da
indústria alimentícia. "Os programas de TV infantis, por exemplo,
estão cheios de produtos nocivos à saúde", afirmou. O Ministério
estuda formas de obrigar as empresas a colocarem frases de
advertência nas propagandas, além de definir parâmetros para
publicidade de produtos ricos em sódio, gordura e açúcar. "A
promoção da saúde deve ter prevalência sobre as questões
mercadológicas", defendeu a coordenadora.
Minas têm 40% com excesso de peso, contra 4% de
desnutridos
O coordenador-geral da Política de Segurança
Alimentar e Nutricional de Minas Gerais, José Divino Lopes Filho,
trouxe para o fórum uma informação considerada alarmante:
levantamento recente mostrou que a população mineira tem 4% de
indivíduos desnutridos e 40% com excesso de peso. Para o
coordenador, esses números mostram a importância das políticas
públicas voltadas para combate da obesidade. Ele enfatizou, no
entanto, a necessidade do envolvimento direto dos municípios para
que as ações surtam efeito.
Debates - Durante a fase
de debates, representantes de ONG's e secretarias municipais de
saúde do interior questionaram os palestrantes sobre a rotulagem de
informações nutricionais nas embalagens de alimentos
industrializados. A professora da Uni-BH, Sônia Figueiredo, acusou a
falta de dados aos consumidores sobre teor calórico dos alimentos e
ausência da concentração de minerais, como sódio, que potencializam
a hipertensão arterial.
Para Ana Beatriz Vasconcelos, é importante a
criação de um grupo de trabalho que trate da divulgação e
fiscalização da rotulagem. Ela acredita, no entanto, que a sociedade
ainda precisa amadurecer e cobrar ações dos agentes públicos.
"Precisamos avançar na lei de rotulagem, tornando-a mais objetiva,
de modo a advertir os consumidores sobre os riscos de determinados
alimentos à saúde das pessoas", disse.
O ex-vereador de Belo Horizonte, Betinho Duarte,
apontou responsáveis para o problema da obesidade. Segundo ele, além
das empresas alimentícias, as lanchonetes, restaurantes, meios de
comunicação de massa e pais são coniventes com a situação. "Os maus
hábitos começam em casa. As crianças não têm sido devidamente
orientadas sobre hábitos de alimentação e saúde adequados",
afirmou.
Foram debatidos ainda os temas má alimentação nas
populações de baixa renda, ausência de nutricionistas nas escolas
públicas e postos de saúde, critérios para as cirurgias de redução
de estômago, tratamentos de pacientes com sobrepeso e necessidade de
melhoria na articulação entre os órgãos de saúde e educação no
Estado.
|