Pais de autistas exigem tratamento adequado e inclusão
social
A definição de autismo como um transtorno mental
específico tem apenas 60 anos. Durante muito tempo, não havia nenhum
atendimento público a esses 14 mil pacientes, que ficavam
exclusivamente a cargo da família. A luta por sua inclusão na rede
pública de saúde começou em 1983, quando Marisa Furia Silva, que tem
um filho autista hoje com 28 anos, fundou a Associação Brasileira de
Autismo. Hoje Marisa luta para que a inclusão desses pacientes seja
específica, com uma programação de trabalho para cada um.
O depoimento de Marisa Furia foi prestado na
audiência pública da Comissão Especial de Transtorno, Deficiência
Mental e Autismo, realizada na tarde desta terça-feira (30/5/06) no
auditório da Assembléia. Outros pais de pacientes, psiquiatras e
autoridades da área de saúde também participaram da reunião
presidida pelo deputado Célio Moreira (PSDB). Maria Helena Roscoe,
da Associação dos Amigos dos Autistas, acusou os órgãos de governo
de não se entenderem quanto à responsabilidade pelo atendimento. "A
Saúde remete para a Educação, esta para a Assistência Social; cada
uma passa a bola para a outra e ninguém assume. Por esta razão,
nossa entidade não quis assumir o atendimento, mas lutar para fazer
o governo funcionar", disse Maria Helena.
A defesa do atendimento público ficou a cargo de
Maria Tereza Nogueira, psicóloga da Secretaria Municipal de Saúde da
PBH. Reconhecendo as deficiências, ela disse que o atendimento pensa
cada caso, e que o atendimento pode chegar ao período das 8 às 19
horas, todos os dias. Lourdes Aparecida Machado, coordenadora
estadual de saúde mental, informou que a OMS manda tratar o paciente
mental dentro do convívio social. "Exclusão não é eficaz, nem
digna", afirmou.
Poucas entidades se dedicam à reabilitação
Flávio Lúcio Assis Moreira, líder de uma associação
de defesa de pessoas portadoras de deficiência, disse que "a roda já
foi inventada; cabe a nós fazê-la andar". Ele defendeu a
intersetorialidade entre Educação, Saúde e serviços sociais para
fazer os programas funcionarem como deveriam. "Sabemos que há muitas
entidades com caráter muito mais assistencialista do que
reabilitador. Temos que cobrar o preenchimento das lacunas dessa
rede", propôs.
O princípio da igualdade nos direitos humanos,
segundo o qual as diferenças devem ser respeitadas e os desiguais
não podem ser tratados igualmente foi defendido pelo deputado Célio
Moreira e por Estela Mares Guillen de Souza, presidente da Apae-BH.
Ambos discorreram sobre as diferenças e os graus de transtorno
mental e autismo, e Estela afirmou que muitos tipos de autismo estão
associados a deficiência mental. Moreira admitiu que é leigo no
assunto, mas que deseja chegar a um final nesta batalha, depois de
mostrar ao Brasil o descaso com que são tratados os pacientes
mentais.
A posição do ex-deputado João Batista Oliveira,
subsecretário de Direitos Humanos da Sedese, foi a de militante dos
direitos humanos. "Há atores que ainda não compreenderam a extensão
do seu papel. O atendimento tem que estar à altura da expectativa. É
preciso arrombar portas trancadas a sete chaves para que a população
tenha acesso". João Batista apoiou a decisão da entidade de Maria
Helena Roscoe de não se dedicar ao atendimento para não perder a
capacidade de luta.
Por sua vez, a procuradora de Justiça Ana Ivanete
dos Santos relatou os anos em que passou atuando em favor dos
internos do manicômio Raul Soares, para onde a Polícia encaminhava
pacientes mentais recolhidos durante surtos psiquiátricos, e ali
ficavam às vezes 20 ou 30 anos sem qualquer tipo de direito. "Eles
respondiam ao tratamento e ficavam aptos a voltar ao convívio
social, mas não tinham sequer um documento, nem meios de se manter
fora da instituição. Tratamos, então, de providenciar carteira de
identidade para que pudessem requerer o direito à aposentadoria pelo
INSS, caso tivessem trabalhado, ou direito a um benefício de
prestação continuada", relatou a procuradora.
A deputada Maria Tereza Lara (PT) elogiou a
presença de todos na audiência, capaz de fazer avançar a defesa dos
direitos da pessoa humana. "A inclusão é um desafio. Na escola é
preciso um atendimento multidisciplinar, mas não podemos ignorar os
avanços que vieram depois da Lei Carlão, fruto da luta
antimanicomial. É preciso pinçar os problemas, mas sem perder a
noção do conjunto", exortou a deputada.
Presenças: Deputado Célio
Moreira (PSDB), presidente; deputada Maria Tereza Lara (PT),
relatora. Além dos citados na matéria, compuseram a mesa ainda
Walter Camargos Júnior, da Associação Mineira de Psiquiatria; Gean
Carlo Mário Capeline, médico psiquiatra; e Raquel Ribeiro, da
Secretaria de Estado da Saúde.
|