Pesquisadores alertam sobre perigos que caramujo africano
representa
A presença de um molusco conhecido como "caramujo
africano" em várias regiões do Estado motivou reunião da Comissão de
Meio Ambiente e Recursos Naturais da Assembléia Legislativa de Minas
Gerais nesta quarta-feira (17/05/06). A espécie foi trazida para o
Brasil no início da década de 80, para ser comercializada como
alternativa ao escargot, outro molusco comestível. O cultivo
não deu certo e os animais foram descartados na natureza. Hoje,
segundo pesquisadores, está prestes a se transformar em um grave
problema ambiental, sanitário e até de saúde pública. Ao final da
reunião, os deputados Laudelino Augusto (PT), presidente da
comissão; Doutor Ronaldo (PDT) e Sávio Souza Cruz (PMDB)
apresentaram requerimento para que a Assembléia realize um ciclo de
debates sobre o assunto.
A reunião desta quarta-feira foi solicitada pelo
deputado Doutor Ronaldo. Segundo ele, em Sete Lagoas foram
encontrados caramujos africanos em cinco bairros da cidade, o que
despertou sua preocupação, principalmente por causa do risco de
transmissão de doenças. O molusco, cujo nome científico é Acatina
Fulica, é hermafrodita, coloca de 200 a 800 ovos por vez e vive
até cinco anos solto no ambiente. Quando adulto, chega a medir 17
centímetros, com peso aproximado de 340 gramas. A pesquisadora e
professora de zoobotânica da UFMG, Teofânia Heloisa Dutra Amorin,
disse que nos últimos meses vem sendo procurada em seu laboratório
por pessoas de todo o País, que querem informações sobre o caramujo.
"Temos que buscar o controle da espécie, porque erradicar é
praticamente impossível", alertou.
Como estão povoando terrenos baldios, depósitos de
lixo e quintais, os caramujos se transformam em veiculadores de
vários microorganismos e potenciais causadores de doenças, disse a
bióloga Langia Coli Montressor. Na Ásia, são transmissores também de
um tipo gravíssimo de meningite e de hemorragia abdominal causadas
por um verme. "Ainda não encontramos nenhum caramujo infectado no
Brasil, mas vivemos num mundo globalizado, não podemos nos esquecer
disso", completou Langia. O molusco não tem predador natural no
Brasil. "Não podemos esperar que haja uma situação de emergência
para nos posicionar", advertiu o deputado Doutor Ronaldo.
Os deputados lamentaram a ausência de
representantes da Secretaria de Estado da Agricultura, da Fundação
Estadual do Meio Ambiente (Feam) e do Ibama, também convidados para
a reunião. Em justificativas, a Feam alegou não ter técnico
especializado no assunto, e o Ibama disse que os funcionários do
órgão estão em greve, por isso não enviaria ninguém. "É inexplicável
a ausência de órgãos ambientais e agropecuários nesta audiência",
afirmou o deputado Sávio Souza Cruz (PMDB).
É preciso ação conjunta para barrar a
superpopulação
Todos os participantes da reunião enfatizaram a
necessidade de um trabalho conjunto, sistemático e continuado para
controlar a presença do caramujo no Estado. O representante da
Secretaria de Estado da Saúde, Marcelo Henrique Marques, relatou
experiências de eliminação dos moluscos em Ituiutaba e na região de
Alfenas, mas reconheceu que essas ações não tiveram sucesso porque
foram descontinuadas. Em Ituiutaba, em seis meses, a prefeitura
recolheu 250 mil caramujos, que foram incinerados e jogados em uma
vala. "Mais tarde ficamos sabendo que o Ibama está desaconselhando a
queima", disse Marcelo Marques. "A catação pura e simples não é
suficiente, as pessoas se cansam porque eles se reproduzem demais",
completou a pesquisadora Teofânia Dutra Amorin.
Segundo informações do representante da Secretaria
de Estado do Meio Ambiente, Miguel Ribon, a legislação brasileira,
tanto federal quando estadual, proíbe a comercialização do caramujo
africano. A despeito da proibição, Teofânia Amorin afirmou que é
possível comprar exemplares até pela internet, com a maior
facilidade. Miguel Ribon sugeriu que seja elaborado um plano
emergencial de controle de espécie, a exemplo do que já existe no
Estado com relação ao mexilhão dourado. Colher subsídios para
elaboração do plano deve ser um dos objetivos do ciclo de debates
proposto pelos deputados.
Extinção de espécies nativas - Um dos maiores
problemas, segundo os pesquisadores, é que as pessoas, assustadas
com a presença do caramujo africano, acabam eliminando outras
espécies nativas e raras de moluscos, desequilibrando mais ainda o
meio ambiente. "Em Belém (PA) já existem outdoors nas ruas,
alertando para os perigos da Acatina Fulica. Então
as pessoas estão catando tudo o que é molusco!", informou Teofânia
Amorin. De acordo com Langia Coli, há muitos países na Ásia onde não
há mais nenhum caramujo nativo, só o caramujo africano.
Deputado sugere aproveitamento econômico da
espécie
A carne do caramujo Acatina Fulica é
altamente rica em proteína e sua concha, em carbonato de cálcio. O
deputado Sávio Souza Cruz questionou o porquê de não se utilizar o
animal para fabricação de rações, por exemplo, estimulado seu
aproveitamento econômico. Os pesquisadores presentes refutaram a
idéia, dizendo que o assunto já foi muito discutido em fóruns e
congressos, mas até hoje não se chegou a nenhuma proposta viável de
aproveitamento. "Acho que vale ao menos uma tentativa. Não há
produção de nenhuma fonte de proteína que não traga impacto
ambiental", defendeu o deputado.
Langia Coli lembrou que animais exóticos não podem
ser levados para outros ambientes, como tem sido feito, sem controle
e estudo ambiental sério. "A Acatina acabou com a
biodiversidade de algumas ilhas do pacífico. E mesmo assim, depois
disso, ainda foi levada para outros países para ser aproveitada
economicamente. Mas nunca deu certo", alertou. Segundo ela, apenas
na África, habitat natural da espécie, ela ainda convive de forma
pacífica com o ambiente, porque os caramujos são amplamente usados
como alimento para a população, que não tem outras fontes de
proteína, e também predados por algumas aves locais. Ainda assim,
segundo ela, algumas tribos que vivem da agricultura são obrigadas a
migrar, de tempos em tempos, por causa do caramujo. "No Brasil, não
se consome esse tipo de animal, nem mesmo o escargot, que tem
carne mais macia", disse a bióloga.
Marcelo Henrique Marques, da Secretaria de Estado
da Saúde, lembrou que na maioria dos países, como Austrália e
Estados Unidos, a criação e comercialização deste animal é proibida,
por causa do risco que representa para a agricultura. Os caramujos
africanos comem de tudo: a maioria dos vegetais, plantas
ornamentais, restos de papelão e até isopor.
Requerimentos - Na reunião
desta quarta-feira, os deputados também aprovaram outros três
requerimentos:
* do deputado Carlos Gomes (PT), solicitando
audiência pública para debater as ações, problemas, desafios e
perspectivas da Fundação Zoobotânica de Belo Horizonte;
* do deputado Laudelino Agusto (PT), para completar
requerimento por audiência já marcada para o dia 25 de maio, em
Poços de Caldas, incluindo o debate sobre denúncias de degradação
ambiental naquele município entre os assuntos a serem
discutidos;
* dos deputados Laudelino Augusto e Doutor Ronaldo,
para discussão, em audiência pública, do Plano Nacional
Energético.
Presenças - Deputados
Laudelino Augusto (PT), presidente; Doutor Ronando (PDT), vice;
Sávio Souza Cruz (PMDB) e Carlos Gomes (PT).
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