Comitês relatam dificuldades durante Fórum das
Águas
As dificuldades vivenciadas pelos comitês de bacia
hidrográfica e a defesa do papel dos agricultores na preservação
ambiental polarizaram, em Plenário, parte dos debates da manhã desta
quarta-feira (22/3/06), durante o 5o Fórum das Águas. No
Dia Mundial da Água, os representantes dos comitês listaram como
entraves ao trabalho desses órgãos colegiados a carência de recursos
e de suporte à sua estruturação. Considerado o verdadeiro
"parlamento das águas", o comitê é formado pelo poder público,
usuários e sociedade civil e tem competência para aprovar o plano
diretor da bacia (diretrizes e metas para investimentos e obras),
forma e valores da cobrança pelo uso da água.
José Adalberto de Rezende, do Comitê da Bacia
Hidrográfica do Rio Piranga, lembrou que há um Brasil onde as
informações sobre o sistema estadual de recursos hídricos são
precisas e informatizadas, mas também existe um outro país onde
estão aqueles que vivem nas bacias e não têm acesso a esses dados.
Ao mesmo tempo em que se ressentem da situação vivida pelos comitês,
essas comunidades demonstram que, muitas vezes, não estão atentas à
preservação das águas. "Tem mãe que ainda fala para o seu filho não
jogar lixo no terreiro, pois terreiro não é rio", ilustrou Rezende,
que é secretário-executivo da Associação dos Municípios do Vale do
Piranga. Na opinião dele, os comitês estão "à deriva", esperando
pela criação das agências de bacia - encarregadas da cobrança pelo
uso da água, cujos recursos poderiam viabilizar esses órgãos
colegiados.
Outra demonstração das dificuldades vividas pelos
comitês foi dada por Vinícius Ferreira, da Comissão Pró-Comitê do
Alto Rio Grande. Ele explicou que está sendo estruturada na bacia
uma rede de informações que beneficiará diretamente 15 municípios e
indiretamente, 28. Esse levantamento abrangerá as ocorrências de
grandes erosões, as chamadas voçorocas. O problema é que a
comunidade não consegue informações sobre as voçorocas. A Cemig
poderia ajudar, pois detém fotos aéreas que registram a presença da
erosão e seus respectivos impactos no ambiente. Mas, segundo
Ferreira, a comunidade não consegue obter essas fotos. Cada uma
custa R$ 100 e, para cada cidade, seriam necessárias 10 fotos.
Vinícius Ferreira apelou, durante o Fórum das Águas, para o
diretor-geral do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), Paulo
Teodoro de Carvalho, que se comprometeu a levar a reivindicação à
Cemig.
Contraponto - A realidade
dos comitês e das comissões pró-comitês foi expressada durante a
fase de debates dos painéis da manhã desta quarta-feira (22). Em
resposta, o diretor-geral do Igam ressaltou que o envolvimento da
sociedade - como prevê a legislação sobre as águas - não é algo
imediato; e que o órgão gestor "não está parado". Ele informou ainda
que será marcado um evento para discutir especificamente a
implementação das agências de bacia. Paulo Teodoro de Carvalho
ponderou que o processo de criação das agências é complicado e que,
no caso da Bacia do Rio Paraíba do Sul, o debate se arrastou por
cerca de 10 anos antes da instituição da agência.
Já os deputados José Henrique (PMDB) e Laudelino
Augusto (PT), coordenadores dos debates, ponderaram que compartilham
a angústia de muitos: saber quando será implementado, de fato, o
novo modelo de gestão das águas, que é calcado na atuação dos
comitês. O deputado José Henrique ressaltou que, apesar das
dificuldades, é preciso sempre estimular a participação da
sociedade. Ele preside a Comissão Interestadual Parlamentar de
Estudos para o Desenvolvimento Sustentável do Rio Doce (Cipe Rio
Doce), e o deputado Laudelino Augusto, a Comissão de Meio Ambiente e
Recursos Naturais e a Frente Parlamentar Mineira de Defesa e
Preservação das Águas.
O assessor de Meio Ambiente da Federação da
Agricultura do Estado de Minas Gerais (Faemg), Carlos Aberto Santos
Oliveira, disse que a avaliação da entidade quanto ao
desenvolvimento dos comitês é "pessimista". Segundo relatos de
produtores integrantes desses órgãos colegiados, não há recursos
para comprar computador, alugar sala ou remunerar técnicos. Muitos
comitês funcionariam em prefeituras ou em local cedido por órgãos de
governo. Não teriam, portanto, autonomia ou independência. Para ele,
é preciso dar suporte à estruturação dos comitês, caso contrário o
modelo de gestão descentralizada e participativa das águas não será
implementado. Oliveira também criticou aqueles que falam da agência
de bacia como um "instrumento mágico" para viabilizar
financeiramente os comitês.
Agricultor não é vilão, dizem especialistas
No painel "Agricultura: uso e produção de água",
especialistas fizeram a defesa dos agricultores e da agricultura.
Paulo Romano, consultor da Secretaria de Estado da Agricultura, e o
professor de Meteorologia Agrícola Luiz Cláudio Costa, da
Universidade Federal de Viçosa (UFV), afirmaram que a agricultura e
os agricultores não são vilões no que diz respeito ao consumo de
água. Paulo Romano alertou para o fato de que o produtor rural é um
prestador de serviços ambientais pela conservação do solo e da água.
Ponderou, ainda, que o uso da água é algo inerente a essa atividade
econômica.
Para Luiz Cláudio Costa, a agricultura é vítima de
um sistema ineficiente, em transição violenta, vulnerável no uso e
na quantidade de água devido a mudanças climáticas radicais e à
atuação do homem sobre o meio ambiente. Ele lembrou que a
disponibilidade e o uso da água na agricultura dependem
exclusivamente de fatores meteorológicos e ponderou que as mudanças
climáticas preocupantes são as variações dos extremos. Como exemplo,
citou o aumento dramático na variação das temperaturas de verão e
das secas que fizeram história na década de 90.
Os caminhos para fomentar a produção da água na
agricultura e utilizar melhor os recursos hídricos poderiam ser: a
melhoria do manejo da água na irrigação, para evitar desperdício; o
incentivo ao reuso da água na irrigação; o investimento em
planejamento e no manejo adequado do solo; a redução do plantio
morro abaixo; e a melhoria das condições das estradas vicinais. O
método de plantio, completou o deputado Padre João (PT), é um
componente importante quando se fala na relação entre agricultura e
preservação ambiental. Nesse sentido, ele destacou a conscientização
dos agricultores familiares - que representam 80% da produção
agrícola de Minas -, sendo acompanhado pela assessora jurídica da
Federação dos Trabalhadores em Agricultura (Fetaemg), Sônia
Prata.
Emater explica projeto para revitalização do São
Francisco
A apresentação de caso coube ao gerente da Empresa
Mineira de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) José
Ricardo Ramos Roseno. Ele mencionou que há 200 projetos
desenvolvidos pela empresa a partir de 2001, através de convênio
firmado com a Agência Nacional de Águas (ANA). O objetivo é promover
o manejo integrado de sub-bacias da Bacia do Rio São Francisco,
tendo essas como unidade de gestão. Ele demonstrou o trabalho
desenvolvido no Norte de Minas, quando houve envolvimento das
comunidades por meio de oficinas e foram incentivadas ações como a
proteção das nascentes e da vegetação nativa; o controle das fontes
de poluição; a construção de sistemas de captação das águas das
chuvas. "Precisávamos revitalizar não somente o curso do rio, mas
também as pessoas que ali vivem", ilustrou o técnico.
Ele também revelou aos participantes do Fórum das
Águas projetos em parceria com os Ministérios do Meio Ambiente e da
Integração Nacional focados em 17 cidades nas sub-bacias dos rios
Verde Grande e Pacuí e do córrego Pajeú, onde o que predomina é a
educação ambiental. No Projeto Pajeú, a equipe da Emater contou com
a parceria do Ministério Público, que repassou para investimentos na
bacia os recursos provenientes da aplicação de multas por apreensão
de cargas de carvão e madeira. Os recursos beneficiaram a comunidade
da cidade de São Francisco, que ajudou a decidir onde investir o
dinheiro, como na construção de terraços para plantio, cercamento de
nascentes e sistemas de captação das águas das chuvas, entre outras
atividades.
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