Transporte de minério por crianças em Ouro Preto motiva audiência

Denúncias de que crianças estariam trabalhando no transporte da rocha esteatita (conhecida como pedra-sabão ou minéri...

22/03/2006 - 00:01
 

Transporte de minério por crianças em Ouro Preto motiva audiência

Denúncias de que crianças estariam trabalhando no transporte da rocha esteatita (conhecida como pedra-sabão ou minério de talco), que seria vendida por atravessadores a mineradoras na zona rural de Ouro Preto, região Central do Estado, foram a tônica da audiência pública desta terça-feira (21/3/06) da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Representantes dos Ministérios Públicos Estadual e do Trabalho e dos Ministérios do Trabalho e de Minas e Energia, entre outros órgãos, além das empresas envolvidas e de mais de cem moradores, lotaram o plenário da Câmara Municipal da cidade. O deputado Durval Ângelo, presidente da comissão, e Rogério Correia, autor do requerimento pela reunião, ambos do PT, participaram da audiência.

As denúncias foram publicadas em janeiro deste ano pela revista do Instituto Observatório Social, entidade criada pela CUT para estudar as cadeias produtivas das empresas e, entre outras funções, monitorar a existência do trabalho infantil. Segundo o supervisor de comunicação do Instituto, o jornalista Marques Casara, que participou da reunião e responde pela apuração das denúncias, a reportagem comprovou que crianças que moram no distrito de Mata dos Palmitos estariam participando da coleta de rochas vendidas pelos superficiários (donos de terras em que há minério) a empresas que atuam na área, mesmo sem a autorização de lavra, que deve ser concedida pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), do Ministério de Minas e Energia.

O minério recolhido, por sua vez, seria processado e vendido para grandes empresas multinacionais. "Esse não é um problema isolado do interior de Ouro Preto, pois está inserido em um processo produtivo que pode terminar em produtos de alta tecnologia", alertou o jornalista. A pedido do deputado Durval Ângelo, Marques Casara afirmou que vai encaminhar à Comissão de Direitos Humanos todas as fotos tiradas para a reportagem, mesmo as não publicadas. A revista também apresenta muitos depoimentos e documentos, como notas fiscais.

Problemas de saúde - As condições de saúde de cerca de 123 pessoas que moram em Mata dos Palmitos, onde o artesanato da pedra-sabão é a principal atividade geradora de renda há mais de cem anos, foram avaliadas em uma tese de doutorado da professora adjunta da Escola de Nutrição da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Olívia Maria de Paula Alves Bezerra. A pesquisa foi feita em 1999 com moradores, incluindo crianças a partir dos sete anos, e mostrou que pelo menos 16 pessoas já tinham algum tipo de comprometimento dos pulmões. Olívia explicou que as crianças trabalhavam tanto para aprender, quanto para contribuir para a arrecadação da família.

 

Empresário nega envolvimento

Nelson Ribeiro Vaz, gerente da Minas Talco, uma das duas empresas denunciadas pelo Instituto Observatório Social, negou qualquer ligação com trabalho infantil e pediu prudência por parte da imprensa ao tratar o caso. Ele afirmou que suas duas empresas, a Minas Talco e a Minas Serpentinito, estão agindo na legalidade; e que não pode ser responsabilizado se crianças estiverem trabalhando para ajudar os superficiários que teriam invadido algumas áreas da empresa e estariam vendendo rochas extraídas para empresas clandestinas. Para ele, é preciso criar mecanismos para modernizar a lavra e dar um destino apropriado para os materiais que não são utilizados.

O representante do Ministério de Minas e Energia, José Carlos do Vale, afirmou que a fiscalização do DNPM não constatou a existência direta de trabalho infantil nas minas, o que também foi dito pela consultora técnica do órgão, Margareth Pedrosa. Segundo ela, porém, as vistoriais indicaram que há empresas comprando minério lavrado ilegalmente (sem título autorizativo) pelos superficiários, que, por falta de maquinário, recebem um preço irrisório pelas rochas. O material é vendido para outras empresas, para ser beneficiado e exportado. Segundo ela, o DNPM já autuou as empresas que estariam sendo coniventes para se beneficiar através do arrendamento e da conseqüente venda. O DNPM notificou os órgãos públicos competentes sobre a ocorrência, como Ministério Público e Polícia Federal.

A promotora de Justiça de Ouro Preto, Paula Ayres de Lima, lembrou que a exploração ilegal de minério e até mesmo carvão na região apresenta problemas de cunho não só ambiental, como também social. A promotora disse que está apoiando a formação de uma cooperativa para que os superficiários lutem pela cessão de 55 hectares da Mata dos Palmitos, que está sob exploração de empresas, e trabalhem para legalizar a exploração do minério. José Eustáquio Cardoso, presidente da Cooperativa dos Mineradores de Ouro Preto, pediu o apoio de órgãos públicos e entidades.

Investigação das denúncias será minuciosa

De acordo com a procuradora do Trabalho, Adriana Augusta Souza, do Ministério Público do Trabalho, as denúncias contidas na reportagem do Instituto Observatório Social já estão sendo investigadas minuciosamente e, se for constatado o envolvimento direto ou indireto de trabalho infantil, os responsáveis serão punidos. "Este é um problema social grave que precisa ter a articulação dos órgãos públicos e da sociedade", disse. Ela alertou para o fato de que o trabalho infantil, mesmo que seja uma tradição secular, é crime e gerador de mais pobreza. "À medida que as famílias negam o trabalho infantil, estão negando ajuda a si mesmas e a seus filhos, perpetuando uma situação de miséria", completou a técnica da Delegacia Regional do Trabalho, Elvira Míriam Veloso de Mello Consendy.

O deputado Durval Ângelo afirmou que dará continuidade aos trabalhos nas próximas reuniões e cobrou maior controle, por parte das empresas, em relação ao trabalho infantil, em qualquer etapa da produção. No fim da reunião, o deputado Rogério Correia afirmou que o encontro foi muito produtivo e que é preciso estudar formas de planejamento e controle do problema, com a colaboração dos governos municipal, estadual e federal. Correia destacou, ainda, que a proteção à infância está garantida no artigo 226 da Constituição da República.

Também participaram da reunião, entre outros, o presidente da Câmara Municipal de Ouro Preto, vereador Wanderley Rossi Júnior; o secretário municipal Vittorio Lanari Júnior; o presidente da Associação dos Moradores de Mata dos Palmitos e coordenador do PET, Lourival Amâncio da Costa; a auditora Fiscal do Trabalho, Christiane Azevedo Barros; a subdelegada Regional do Trabalho, Maria Isabel Dacall.

Presenças - Deputados Durval Ângelo e Rogério Correia, ambos do PT.

 

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