Debate opõe profissionais da optometria e
oftalmologistas
Defensores e críticos da optometria, atividade de
auxílio à saúde visual, participaram nesta quinta-feira (1º/12/05),
de audiência pública da Comissão de Saúde da Assembléia Legislativa.
De um lado, optometristas e membros dos conselhos de Óptica e
Optometria divulgaram as vantagens da técnica científica que seria
uma alternativa mais barata e acessível a toda a população, para
prevenir doenças e outros problemas visuais. De outro,
representantes do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO)
condenaram a prática por considerarem que, devido à complexidade da
visão humana, exames de vista e diagnósticos nessa área devem ser
feitos somente por médicos oftalmologistas.
O presidente do Conselho Brasileiro de Óptica e
Optometria (CBBO), Danny Carvalho Magalhães, fez um histórico da
atividade, que teria começado no Brasil pouco antes de 1930. São
dessa época, os dois decretos do presidente Vargas que tentaram, de
maneira dúbia, segundo ele, regulamentar a profissão: o 20.931, de
1932 e o 24.492, de 1.934. Essas legislações, na avaliação de
Carvalho, impediram a evolução da optometria no Brasil,
diferentemente do que ocorreu no mundo, com a expansão da atividade
e reconhecimento em 150 países.
"Olho sadio" - De acordo
com o presidente do CBBO, o que separa o trabalho do optometrista da
atividade do oftalmologista é que o primeiro atua no "olho sadio".
Ele informou que o optometrista examina e avalia a função visual,
prescrevendo óculos de grau, lentes de contato e outras soluções
ópticas, nos casos de miopia, hipermetropia, astigmatismo, vista
cançada (presbiopia) e estrabismo. Na opinião dele, esses problemas,
chamados de ametropias, são alterações visuais de ordem não
patológica ocular ou sistêmica. "Se identifico que o olho está
doente, vou encaminhar para o oftalmologista; não é nossa função
cuidar de patologias da vista", esclareceu.
Oftalmologistas acham que optometristas não podem
examinar
Discordando da visão da CBBO, o coordenador de
Oftalmologia da Secretaria de Estado da Saúde, Julis Jésus Ayoub,
afirmou que as ametropias são doenças, previstas na Classificação
Internacional de Doenças (CID). Por esse motivo, não podem ser
diagnosticadas por um profissional não médico. "A optometria é
apenas um exame de refração, para determinar o grau de deficiência
na visão; os optometristas são técnicos, não têm capacitação
médica", alertou. Para Jésus, o exame de fundo de olho pode ser a
janela para a descoberta de várias doenças graves, que só podem ser
diagnosticadas pelo oftalmologista, como glaucoma, tumores,
cardiopatias, doenças renais e outras.
Com essa mesma opinião, munido de transparências,
Elizabeto Gonçalves, do CBO, vaticinou que "o propósito da
optometria é equivocado: indicar, prescrever para o paciente é papel
do médico". Ele apresentou dados da Associação Médica da Inglaterra
mostrando que 35% dos pacientes que procuram optometristas naquele
país apresentam afecções não reconhecidas por esses profissionais.
Citou dados de uma pesquisa realizada no Reino Unido com 890
crianças examinadas por optometristas e oftalmologistas. Os
primeiros prescreveram óculos para 35% das crianças; enquanto que o
índice foi de apenas 13,5 % no caso dos oftalmologistas.
Na avaliação do advogado do CBO, Flávio de Castro
Winkler, "legalizar a optometria significa colocar a raposa para
cuidar das galinhas". Ele avalia que o profissional que prescreve a
receita não pode ser o mesmo que vende o produto: "seria o mesmo que
o médico ser o dono da farmácia", o que para ele, configuraria uma
venda casada, prática condenada pelo Código de Defesa do Consumidor.
Ele cita pontos dos decretos de Vargas 20.931 e 24.492, para mostrar
que o ótico ou optometrista não pode substituir o oftalmologista,
cabendo ao primeiro apenas fabricar a lente.
Doenças visuais podem ser diagnosticas pelo
optometrista
De acordo com Celso Barros Gama, do Conselho
Regional de Óptica e Optometria, as doenças listadas por Jésus e
Elizabeto, podem ser diagnosticadas pelo optometrista, usando
aparelhos como o oftalmoscópio e o retinoscópio. "A optometria não é
apenas prescrever óculos; estuda ortóptica, que não é vista pelos
oftalmologistas", rebateu. Gama valorizou a importância social da
optometria, instrumento, a seu ver, fundamental no atendimento
primário e preventivo da saúde visual. "Muitas pessoas ficam cegas
por não terem condições de ir ao oftalmologista. O paciente só é
atendido quando sua saúde já se agravou", confirmou.
O assessor jurídico do Conselho Brasileiro de
Óptica e Optometria, Torbi Rech, lembrou que somente 10% das pessoas
examinadas possuem patologias na visão, e os outros 90% precisam
apenas de verificação da acuidade visual. "As patologias, muitas
vezes, são geradas pela falta de atendimento preventivo ou pela
demora", analisou. Sobre a formação do profissional, de quatro anos,
ele informou que o Brasil tem cinco cursos de nível superior e um de
pós-graduação. E defendeu a regulamentação da profissão, para que
cessem as ações judiciais contra os optometristas. Sobre esse
aspecto, ele informou que o Superior Tribunal de Justiça, por
decisão unânime, reconheceu os cursos de optometria, autorizando o
exercício profissional dos formados.
Interatividade - Num tom
conciliatório, o oftalmologista de São Paulo, Pedro Silveira
Gonçalves Filho, tratou da interatividade da optometria e da
oftalmologia na saúde do Brasil. Ele trouxe dados sobre a saúde
visual brasileira e mundial, mostrando a necessidade de que os
optometristas auxiliem os oftalmologistas, de modo a suprir a
deficiência nesse setor. Atualmente, há um profissional de saúde
visual para cada 74 mil habitantes, enquanto que, na Espanha (onde a
optometria é regulamentada), são 4 profissionais para um grupo de 10
mil pessoas.
O presidente da comissão, deputado Adelmo Carneiro
Leão (PT), que é médico, disse que "não é possível admitir que
médicos sejam essenciais para exames elementares", apoiando, nesse
aspecto, os optometristas. Comentando a fala de Winkler, Adelmo
afirma que leis devem valer para todos, não para poucos. "Muitas
coisas criticadas na optometria são praticadas pela medicina; há
oftalmologistas donos de ótica", lembrou. Também concordou com Pedro
Silveira quanto à possibilidade de uma ação conjunta dos dois
profissionais em prol da saúde pública.
O autor do requerimento pela reunião, deputado
Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), disse que via "nos olhos de todos a
vontade de servir à população". E anunciou que iria fazer gestões
junto à Câmara dos Deputados e outros órgãos para avançar no sentido
de regulamentar a profissão do optometrista. O deputado Doutor
Ronaldo (PDT) parabenizou Dalmo pela iniciativa da audiência, e
disse que, na sua área de atuação como médico cirurgião, não podia
delegar seu trabalho a ninguém.
Presenças - Deputados
Adelmo Carneiro Leão (PT), presidente; Doutor Ronaldo (PDT) e Dalmo
Ribeiro Silva (PSDB).
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