Projeto sobre ato médico divide opiniões em audiência
pública
O Projeto de Lei 25/2002, do ex-senador Geraldo
Altholff, que tramita no Senado, e vem sendo chamado "projeto do ato
médico", provoca polêmica desde que foi apresentado. Os defensores
dizem que o projeto apenas regulamenta a profissão do médico. O que
são contrários afirmam que ele acaba com a interdisciplinaridade no
cuidado e assistência à saúde, e impede o exercício de outras
profissões como enfermagem, fisioterapia, terapia ocupacional e
nutrição. O assunto é tão complexo que foi objeto de audiência
pública da Comissão de Saúde da Assembléia Legislativa, nesta
quarta-feira (30/11/05).
Enquanto era realizada a audiência, enfermeiros,
psicólogos e estudantes distribuíam panfletos do movimento nacional
"Não ao ato médico", em frente à Assembléia. O movimento já fez
passeatas e manifestações nas principais capitais do país e tem até
página na internet: www.naoaoatomedico.com.br. O presidente da
comissão, deputado Adelmo Carneiro Leão (PT), que pediu a realização
da reunião, destacou a importância do diálogo, para que os
profissionais de Minas possam dar sua contribuição aos congressistas
que apreciam o projeto.
O presidente do Conselho Regional de Psicologia,
Humberto Cota Verona, é um dos que combatem o projeto, pedindo seu
arquivamento imediato. Ele lembrou que a Constituição Federal de
1988 ampliou o conceito de saúde e permitiu que uma gama maior de
profissionais e a própria sociedade passassem a discutir o assunto.
Na opinião dele, o PL 25/2002 se baseia no conceito de que o médico
é o único detentor do saber relativo à saúde, o que não é verdade. A
professora do curso de Enfermagem da UFMG, Aidê Ferreira Ferraz,
afirmou que a assistência integral à saúde, com o envolvimento de
vários profissionais, é pressuposto básico do Sistema Único de Saúde
(SUS).
Segundo o presidente do Sindicato dos
fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, Tiago Possas, o grande
temor é que "o PL transforme todos os outros profissionais da área
médica, que têm nível superior, em técnicos meramente executores de
ordens médicas". De acordo com o texto do projeto, o diagnóstico
médico e as prescrições terapêuticas são atos privativos do
profissional médico.
Indústria de escolas prejudica exercício da
profissão
Quem defende o projeto, como Eliane de Souza, do
Conselho Regional de Medicina, nega que os médicos queiram diminuir
a atuação dos outros profissionais de saúde. Na opinião dela,
trata-se apenas de regulamentar e preservar a profissão, ameaçada
"pela explosão do número de escolas de saúde em todo o país". Eliane
de Souza disse que as escolas estão atendendo a interesses puramente
mercantilistas, questionando a competência de muitos dos
profissionais formados recentemente.
O presidente da Associação Médica, José Carlos
Viana, acredita que a discussão sobre o projeto é apenas "semântica"
e que todos os profissionais estão buscando a interdisciplinaridade.
Ele também defende que os médicos estão apenas lutando pela
regulamentação profissional. "Em décadas de exercício da profissão,
nunca invadi a área de ninguém, nem deixei que invadissem a minha.",
declarou.
O deputado Adelmo Carneiro Leão, que é médico,
também alertou contra o que chamou de "visão mercantilista da
saúde", mas chamou a atenção para a responsabilidade dos médicos na
mudança dessa mentalidade. Na opinião do deputado, não se pode
simplesmente criticar o excesso de cursos sendo abertos a todo
momento, uma vez que ainda há, no interior, centenas de municípios
onde não há nenhum médico. "Devemos definir, sim, o que é ato
médico, mas também devemos cobrar dos profissionais que estejam
dispostos a ocupar todos os espaços, inclusive no interior",
ponderou.
Luta deve ser contra a engenharia genética
Presidente do Sindicato dos Psicólogos de Minas
Gerais, Roges Carvalho dos Santos, é outro crítico do PL 25/2002. Na
opinião dele, o projeto "fere de morte" os interesses do SUS, uma
vez que o sistema foi e está sendo construído por uma equipe
multidisciplinar. "Diagnóstico e prescrição terapêutica são termos
abstratos. Vamos retirar isso do texto!", defendeu.
A grande ameaça aos médicos e à própria saúde,
segundo Roges, não são os psicólogos, fisioterapeutas ou
nutricionistas, mas os engenheiros, com o avanço da engenharia
genética e a visão mercadológica da saúde: "A medicina hoje é feita
por máquinas, e quem faz máquina é engenheiro! A engenharia genética
está invadindo totalmente o campo da medicina". Roges fez um apelo
para que, respeitando-se as especificidades de cada área, todos os
profissionais se unam, compartilhando experiências em favor da vida.
Nesse ponto, concordou também o presidente da Associação Médica,
José Carlos Viana. Ele lembrou que dois engenheiros já ganharam o
prêmio Nobel de Medicina, pela invenção do tomógrafo.
Presenças - Deputado
Adelmo Carneiro Leão (PT), presidente da Comissão; e, além dos
convidados citados na matéria, o presidente da Associação dos
Usuários dos Serviços de Saúde, Paulo José Azevedo; e a diretora de
assuntos jurídicos do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais, Georgia
Cristina Basílio Medrado.
|