Anemia infecciosa eqüina atinge 36 mil cavalos em
Minas
Uma doença incurável e mortal que atinge cavalos,
jumentos, asnos, mulas e burros é desconhecida por dois em cada três
fazendeiros em Minas. É a anemia infecciosa eqüina (AIE), provocada
por um vírus que tem afinidade com o HIV humano, e já atinge 36 mil
animais em Minas, dentre um rebanho de eqüídeos estimado em 1,2
milhão. Devido a uma instrução normativa do Ministério da
Agricultura, cada animal que estiver contaminado, mesmo os
assintomáticos, tem que ser sacrificado, e não cabe indenização ao
proprietário, como no caso da febre aftosa.
A pedido dos deputados Padre João (PT) e Gil
Pereira (PP), a anemia infecciosa eqüina foi debatida em audiência
pública na Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial, na
manhã desta quinta-feira (17/11/05). A Comissão está examinando um
projeto de lei do deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), que deseja
tornar obrigatório o exame laboratorial da AIE no território
mineiro. Dois veterinários compareceram para prestar
esclarecimentos: Valéria Almeida, coordenadora de sanidade eqüidea
do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), e Cornélio Junqueira
Maciel, da Associação Brasileira de Criadores do Cavalo Mangalarga
Marchador (ABCCMM).
Valéria Almeida disse que o rebanho eqüídeo do
Brasil é de 8 milhões de cabeças, e que 13% dele está localizado em
Minas. Os maiores rebanhos do mundo são os da China (22 milhões) e
do México (13 milhões). Uma pesquisa pioneira conduzida por ela
revelou a distribuição da doença no Estado, com média de 3,08% de
contaminação do rebanho mineiro. Dos 119 focos descobertos em Minas,
a maior concentração está no Norte, Noroeste, Jequitinhonha e
Mucuri, mas já foram encontrados perto de Belo Horizonte, em Betim e
Itabira.
Mutuca é o vetor e agulha contaminada dissemina
doença
A situação de Minas não é tão grave quanto na
Região Norte, onde os índices seriam alarmantes, e no Pantanal, onde
estima-se que metade do rebanho esteja contaminado. Os animais
doentes perdem o apetite, o peso e a energia. A principal forma de
transmissão é pelo sangue contaminado, e o vetor é uma mosca grande
de picada dolorosa, da família dos tabanídeos - conhecida
popularmente como mutuca. Mas a veterinária está convencida de que a
disseminação num mesmo rebanho vem principalmente do uso
compartilhado de agulhas e seringas nos diversos animais.
"Não existem métodos práticos e eficazes para
combater o vetor, mas é possível fazer campanhas de esclarecimento
do risco de uso das seringas e agulhas", propõe Valéria Almeida.
"Outra dificuldade é o abate dos animais. Nós, do IMA, não podemos
abatê-los a tiros. Temos que chamar a PM, que tem autorização para
uso de armas. Há um produto para abater um cavalo sem sofrimento,
mas custa R$ 300 a dose", acrescentou.
Cornélio Maciel ajuntou sua experiência de 30 anos
lidando com essa doença no ambiente de criadores apaixonados por
cavalos de raça. "Não se trata apenas do preço dos animais, que pode
chegar a R$ 1 milhão, mas da afeição do criador ou do seu filho por
aquele animal em particular. É duro dizer a eles que seu animal de
estimação terá que ser sacrificado. Já diagnostiquei a AIE em cerca
de 330 animais, mas não sei dizer se foram abatidos. Eu pessoalmente
já sacrifiquei mais de 80 animais. Temos que considerar também a
situação do carroceiro, do charreteiro, cujo meio de vida é o
cavalo. Não há dinheiro para indenizá-lo. Não podemos simplesmente
dar a ele um potro sem treinamento", disse Cornélio.
O deputado Padre João perguntou a Valéria Almeida
qual o preço do exame de laboratório, e que providências toma o IMA
quando dá positivo. Ela informou que o custo é de R$ 20, acrescidos
do deslocamento de um médico veterinário, o único profissional
autorizado a coletar o sangue. "Quando o exame dá positivo, nós
orientamos o proprietário a sacrificar o animal. Ele pode ser
vendido a um frigorífico, já que a doença não é prejudicial ao ser
humano. No entanto, não podemos ficar montando guarda na porteira da
fazenda. O dono pode até não sacrificá-lo, mas tem que isolá-lo e
sua propriedade fica interditada. No futuro, pretendemos marcar o
animal, para que ele não possa sair da fazenda", esclareceu.
Deputados sugerem formas de combater a Anemia
Infecciosa Eqüina
Por sua vez, o deputado Marlos Fernandes (PPS) quis
saber se a AIE pode ser transmitida sexualmente entre eqüídeos, como
a Aids entre humanos. A veterinária disse que o vírus pode passar
pelo sêmen, pela placenta ou pelo colostro, mas que isso não tem
importância epidemiológica. O deputado perguntou ainda com qual
freqüência o exame deve ser feito: "Para animais de exposição ou
cavalgadas, de 60 em 60 dias. Para os fixos nas fazendas, o exame
pode ser semestral", disse a especialista. Marlos Fernandes propôs
que seja criado um fundo para indenizar os proprietários carentes, e
sugeriu que os criadores organizados pudessem contribuir com uma
taxa nas feiras e leilões para o combate à doença.
Dalmo Ribeiro Silva afirmou que é preciso assegurar
recursos públicos para o controle da AIE, para que seu projeto de
lei não se torne inócuo: "O Estado tem que ter compromisso e
compartilhar a responsabilidade com os criadores", afirmou. Ribeiro
Silva não é avesso à idéia das taxas, e leu na reunião ofícios de
apoio a seu projeto, vindos dos presidentes das associações
brasileiras de criadores dos cavalos mangalargas marchadores e dos
cavalos pampas. O PL 2.528/05 já passou pela Comissão de
Constituição e Justiça e agora depende de parecer na Comissão de
Política Agropecuária.
Padre João consultou sobre a possibilidade de ter
laboratórios móveis para atender nas fazendas, mas Valéria disse que
a reação leva até 48 horas para dar resultado, o que inviabilizaria
a idéia. Para ela, os 35 laboratórios credenciados pelo Ministério
da Agricultura atenderiam bem a demanda.
Os deputados manifestaram também sua preocupação
quanto ao grande trânsito de animais dentro de fora de Minas, devido
ao número crescente de exposições, rodeios e cavalgadas, que podem
colocar animais sadios em contato com doentes, e entre eles as
moscas que promovem o contágio, também conhecidas como moscas dos
estábulos.
Ao final da reunião, o presidente da Comissão,
deputado Padre João, apresentou requerimento para que, na reunião
marcada para o dia 26 próximo, com a finalidade de debater a febre
aftosa, seja agregado também o tema varíola bovina, que preocupa os
criadores da Zona da Mata mineira. O requerimento foi
aprovado.
Presenças - Deputados Padre
João (PT), presidente; Marlos Fernandes (PPS), vice-presidente;
Dalmo Ribeiro Silva (PSDB). Valéria Almeida, do IMA, e Cornélio
Junqueira Maciel, da ABCCMM.
|