Atingidos por barragens denunciam abandono em reunião sobre
PCHs
Representantes do Movimento dos Atingidos por
Barragens (MAB) denunciaram mais uma vez, na Assembléia, nesta
quarta-feira (19/10/05), o abandono dessa população no Estado. Em
reunião da Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial que
discutiu a situação das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), eles
questionaram o porquê do incentivo à construção dessas barragens
pelos governos estadual e federal. Como proposta, o padre Antônio
Claret, do MAB, defendeu que as PCHs fiquem sob o controle das
comunidades e dispensem a formação de lagos, caso sejam reativadas.
Mas as críticas ao modelo energético que privilegia as
hidrelétricas, mesmo as pequenas, marcaram a fala dos atingidos - a
maioria do Vale do Rio Doce, e também de Aimorés.
Os deputados Padre João, presidente da comissão, e
Rogério Correia, do PT, pediram o debate para colher sugestões sobre
como utilizar as PCHs sem ampliar o impacto já causado por sua
construção. Querem ainda discutir alternativas às grandes barragens
e ouvir a população. É deles o requerimento, ainda não aprovado, que
pede à Eletrobras, Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e
Companhia Força e Luz Cataguazes-Leopoldina o levantamento das PCHs
em Minas e sua situação. O diagnóstico é importante para buscar o
aproveitamento das PCHs, a partir da discussão com prefeituras,
comunidades e Eletrobras - que detém os imóveis das usinas
desativadas. O respeito aos atingidos foi destacado ainda pelo
vice-presidente, deputado Marlos Fernandes (PPS).
Incógnita - Até o número de
PCHs em Minas é uma incógnita. Segundo dados de pesquisas
universitárias trazidos pelo Grupo de Estudos em Temáticas
Ambientais (Gesta) da UFMG, até 1941, havia 424 PCHs em Minas. Desse
total, 322 seriam da iniciativa privada. Um estudo mais recente, da
Universidade de Itajubá, aponta a existência de 150 PCHs abandonadas
na região Sudeste, a maioria em fazendas de Minas Gerais e São
Paulo. Vale lembrar que, antes, os municípios eram geralmente
supridos com a energia elétrica gerada por pequenas barragens. Aos
poucos, elas foram desativadas ou passaram a ser subutilizadas, com
o surgimento dos grandes reservatórios.
Parcerias - Alcides
Lipporacci da Silva, da Eletrobras, acenou com parcerias com
prefeituras e comunidades atingidas para dar nova destinação às
PCHs. A pequena usina de Volta Grande, com 5 mil habitantes, pode
ser reativada, através de uma parceria com a prefeitura. A cidade da
Zona da Mata gasta hoje R$ 20 mil mensais com energia, o que, para
ele, é "um absurdo", considerando que ela sobrevive apenas com os
recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Em
Diamantina, acrescentou, a usina desativada poderá voltar a produzir
e seu entorno ser transformado em parque. Mas em outros casos, o que
restou não serve mais para gerar energia.
Representante da UFMG faz críticas à PCHs
Marcos Zucarelli, do Gesta, é crítico das PCHs e
também do modelo energético brasileiro que privilegia a usina
hidrelétrica. Assim como o padre Claret, Zucarelli afirmou que o
tamanho de uma barragem não é critério para definir seu menor ou
maior impacto ambiental e social. Ele citou a PCH Fumaça, em Diogo
de Vasconcelos, região Central, que produz 10 megawatts, obedecendo
ao padrão internacional para uma pequena barragem. Apesar disso, a
usina atingiu 200 famílias, que hoje recebem cestas básicas do Fome
Zero porque não tiveram o tratamento devido como atingidos.
O representante da UFMG lembra que, no caso das
novas PCHs, o objetivo de geração de energia é claro: o fomento à
iniciativa privada e, em muitas vezes, às indústrias de alumínio,
como é o caso de Diogo de Vasconcelos - onde a PCH foi construída
para autoprodução da Alcan. Apesar de ponderar que a repotenciação
das pequenas barragens pode ser um caminho, ele criticou projeto do
governador Aécio Neves para construção de outras 252 PCHs no Estado.
"Com que objetivo e para quem a energia vai servir?", questionou,
denunciando também que os atingidos não estão representados no grupo
técnico especial previsto no decreto do governador que trata do
assunto. No caso do Vale do Rio Doce, segundo Zucarelli, haveria 32
projetos de PCHs e de grandes barragens previstos para a região, com
impactos imensos. O conjunto das obras atingiria 2 mil famílias.
Fazendo coro à fala de Zucarelli, atingidos por
barragens fizeram críticas à atuação da Feam, que não estaria
fazendo as vistorias necessárias nos empreendimentos, sendo submissa
aos interesses dos empreendedores. Os integrantes do MAB também
criticaram a atuação dos empreendedores nas usinas de Fumaça,
Candonga e Itueta. Essas empresas estariam descumprindo várias
condicionantes determinadas pela Feam, a qual, por sua vez, não
estaria também exercendo a fiscalização adequada.
Feam confirma interesse em construir PCHs
A gerente do Núcleo de PCHs da Fundação Estadual do
Meio Ambiente (Feam), Marília Gonçalves Souza, confirmou o interesse
pelas PCHs: há 110 processos formalizados em diferentes fases de
licenciamento. Daqueles em fase de licença de operação, há as
recentemente concedidas; os empreendimentos que pedem licença
corretiva, pois já funcionavam antes da legislação ambiental; e
outros com validade da licença vencida. Segundo Marília Souza, a
fundação se preocupa com a repotenciação das PCHs desativadas ou em
estado precário. Segundo ela, a reativação de uma PCH pode implicar
em menor impacto, se comparada a uma usina nova. Mas é necessário
analisar cada caso, pois pode haver conseqüências como, por exemplo,
a criação de trechos de vazão reduzida.
Cemig - O representante da
Cemig, Evandro Leite Vasconcelos, lembrou que, muitas vezes, o
impacto de uma grande usina é menor que o de uma PCH, pois é preciso
comparar o volume de megawatts gerado e o número de famílias
atingidas. Para ele, o modelo energético em vigor ainda onera muito
as PCHs, em particular por causa dos custos de transporte da
energia. "O empreendedor não se interessa pela PCH por causa do
ônus. Hoje, ela não é economicamente viável", resumiu.
EPE - Já o chefe do
Departamento Municipal de Energia de Poços de Caldas, Cícero Machado
de Morais, falou sobre a experiência do município, onde a prefeitura
é a concessionária. A energia que abastece o município vem das PCHs
desde 1911, sendo bem-sucedida a experiência. Para ele, também é
preciso analisar caso a caso a proposta de reativação das PCHs.
Sobre o diagnóstico da situação das PCHs, Cícero informou que o
governo federal criou uma empresa que, provavelmente vai lidar com
essa questão: a Empresa de Planejamento Energético (EPE), o que foi
considerado correto também pelo representante da Cemig, Evandro
Leite.
Sônia de Oliveira, do MAB, rechaçou a idéia de
construir novas PCHs no Estado: "Minas Gerais não precisa de mais
PCHs; nós do MAB dizemos chega!" Segundo ela, em várias das pequenas
usinas inundam-se áreas enormes, provocando um impacto ambiental
considerável, sem o correspondente ganho em geração de energia
elétrica. Em Emboque, por exemplo, foram inundados 216 hectares e
gerados apenas 21 megawatts.
Presenças - Participaram da
reunião os deputados Padre João (PT), presidente; Marlos Fernandes
(PPS), vice; e Rogério Correia (PT), além dos convidados citados e
do engenheiro Antônio Marcos, da Eletrobras.
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