Deputados querem comissão especial para investigar Banco da Terra

O Banco da Terra foi alvo de duras críticas nesta quarta-feira (21/9/05), durante reunião da Comissão de Política Agr...

21/09/2005 - 00:00
 

Deputados querem comissão especial para investigar Banco da Terra

O Banco da Terra foi alvo de duras críticas nesta quarta-feira (21/9/05), durante reunião da Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial que discutiu esse programa do governo federal para aquisição de imóveis rurais e que tem hoje em Minas 2,5 mil famílias de agricultores assentadas. Implantado durante o governo Fernando Henrique Cardoso, o Banco da Terra apresenta várias irregularidades e problemas, como falta de organização e desinformação dos trabalhadores; compra de terras acima do valor de mercado para beneficiar fazendeiros; uso indevido dos recursos e das terras por políticos locais e dívidas coletivas impagáveis. Um dos resultados da reunião foi aprovar requerimento para que a Assembléia instale uma comissão especial para apurar as denúncias.

Dezenas de agricultores participaram dos debates, vindos de cidades como Canápolis, Monte Alegre de Minas, Presidente Olegário, Iraí de Minas e Ponte Nova. Outra decisão tomada foi de que a Assembléia de Minas será parceira dos movimentos sociais e dos órgãos de governo na busca de uma saída para o problema. Segundo o presidente da comissão, deputado Padre João (PT), o debate foi importante por reunir todos os atores do processo. Ele destacou que não se podem cometer novos erros, colocando as famílias dos agricultores em dificuldade. Já o deputado Ricardo Duarte (PT) enfatizou que o Banco da Terra era uma "tragédia anunciada". Ele assumiu o compromisso de que a Assembléia vai intermediar decisões e buscar as soluções - necessárias e urgentes. Padre João e Ricardo Duarte são os autores do requerimento que motivou a reunião.

Resposta - O assessor do Departamento Técnico de Crédito Fundiário do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Danilo Prado Garcia, informou que será assinado este mês um convênio entre União e Instituto de Terras de Minas Gerais (Iter), a fim de acompanhar os projetos do Banco da Terra no Estado. O objetivo é traçar um diagnóstico da situação e colher sugestões. Ele adiantou que o agricultor que deixar o projeto não poderá concorrer a outro financiamento de projeto fundiário nem ser assentado do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Danilo Garcia também disse, frustrando expectativas, que anistia ou mais tempo de carência nos financiamentos só poderiam ser viabilizados por meio de lei aprovada pelo Congresso Nacional.

Entre as soluções apontadas pelo Ministério, está a de revisão das dívidas - cobrança feita pelos participantes da reunião. Nessa revisão, as parcelas vencidas e outras a vencer poderão ser renegociadas. O agricultor poderá quitar ainda 1% e reescalonar o pagamento do restante da dívida. O prazo do financiamento é de 20 anos. Danilo Garcia também informou que os projetos técnicos que legitimaram a concessão dos financiamentos serão revistos caso a caso, por meio do Iter. Em várias situações, os projetos são questionados, já que atestam como terra adequada propriedades de reduzido potencial agrícola e também áreas pequenas para o número de famílias a serem assentadas.

CPT, Via Campesina e Comissariado Franciscano apontam irregularidades

O frei Rodrigo, do Comissariado Franciscano, sintetizou os vários problemas existentes no Banco da Terra - que foi suspenso em 2003 pelo governo Lula. Para o frei, o programa é uma "reforma agrária de mercado", pois é simplesmente uma relação de compra e venda de terras. Na sua avaliação, o Banco da Terra atendeu pequenos grupos de sem-terra que receberam crédito do Estado para comprar suas propriedades. Os trabalhadores, no entanto, não foram organizados em associações para terem direito aos recursos, mas sim "juntados para comprar propriedades". Segundo ele, havia interesse direto na venda das terras por parte de fazendeiros, corretores de imóveis, políticos ligados aos latifundiários, sindicatos rurais e prefeituras.

Tanto ele quanto Vilson Luiz da Silva, da Federação dos Trabalhadores em Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), lembraram que o Banco da Terra em Minas não foi implantado por meio de parceria com o governo estadual, mas sim através de associações de municípios. Isto porque o então governador Itamar Franco não aceitou assinar o convênio. A Fetaemg afirmou ter sido contrária ao Banco da Terra desde o início, pois sabia que ele deixaria os agricultores em um "túnel sem saída". Para Marcelo Rezende, da Via Campesina, as famílias não foram beneficiadas, mas sim atingidas pelo Banco da Terra, que é monitorado pelo Banco Mundial. Na opinião dele, o programa não é complementar à reforma agrária, mas concorre com ela no Orçamento da União.

Críticos do Banco da Terra querem auditoria; governo diz que está investigando

As soluções, na opinião do frei Rodrigo, passam por: auditoria dos programas de crédito fundiário; revisão das dívidas e dos projetos técnicos; formação dos agricultores para o associativismo e acompanhamento dessa organização. O frei classificou como "negociata" os projetos que avaliou no Triângulo Mineiro e cobrou soluções imediatas. "Não se pode brincar com o sonho das pessoas de terem sua própria terra", disse o religioso, sendo acompanhado nas críticas por Antônio Maria Fortini, da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Famílias abandonadas, sem assistência técnica, nas mãos de políticos locais e totalmente desinformadas sobre os termos dos contratos de financiamento. Assim resumiu a situação das famílias o representante da CPT.

Auditoria em andamento - Danilo Garcia, representante do MDA, informou que há 70 processos administrativos em análise hoje por uma comissão de sindicância, relativos a irregularidades no Banco da Terra. Ele garantiu que todas as denúncias serão apuradas. Garcia fez um relato também do programa federal Crédito Fundiário, comparando-o ao Banco da Terra. Segundo o técnico, no programa Crédito Fundiário o agricultor sabe de todos os termos do financiamento e sua organização em associações é acompanhada de perto pela sociedade civil e governo. Disse também que o financiamento abrange a estruturação da unidade produtiva e não apenas a infra-estrutura básica, como o Banco da Terra; e que as decisões são colegiadas, via conselho estadual.

Outros convidados foram: o gerente do Departamento Técnico da Empresa Mineira de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), Feliciano Nogueira de Oliveira, que reconheceu a situação difícil das famílias, mas alegou que a assistência técnica está sendo feita; o gerente regional do Banco do Nordeste, Hamilton Ribeiro França, que acredita em solução para o Banco da Terra, mas teme problemas relacionados à evasão das famílias; Jorge da Costa Vicente, secretário-executivo do Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf), que destacou como preocupações fazer chegar o crédito produtivo a quem ainda não recebeu e verificar o que está ocorrendo com os agricultores do Banco da Terra que receberam os recursos. Já o superintendente do Incra em Minas, Marcos Helênio, informou que até dezembro o Estado terá 173 projetos de assentamento.

O deputado Doutor Viana (PFL), que também participou da reunião, defendeu que se apure de quem é a culpa pelas irregularidades verificadas no Banco da Terra. "Por que não houve fiscalização anterior?", questionou.

Lideranças e assentados avaliam erros do Banco da Terra

Após a exposição dos convidados para a audiência pública, abriu-se a fase de debates, com a participação de lideranças e assentados que lotaram o Teatro da Assembléia Legislativa. O primeiro a se manifestar foi o prefeito de Presidente Olegário, Antônio Cláudio, conhecido como Palito, para quem o simples reescalonamento da dívida ou alongamento do prazo para pagamento não resolverão o problema, pois a dívida dos assentados é impagável. Segundo ele, para efetuar a quitação, seria necessário que cada família economizasse o equivalente a um salário mínimo por mês, o que corresponde praticamente à renda mensal dos assentados. Muitos dos presentes reiteraram as críticas e apontaram dificuldades como a demora na liberação de recursos do Pronaf; o não reconhecimento, pelo Banco do Brasil, da substituição de nomes de assentados; e a falta de uma cultura de associativismo na população brasileira.

Integrante da coordenação estadual do MST, Ademar disse que a entidade, desde o início, condenou o Banco da Terra, recomendando a todos que "não embarcassem nessa canoa furada". Segundo ele, a única saída, para os que se julgam prejudicados, é se organizarem para reivindicar seus direitos. Lucimere, da CPT, defendeu rigorosa sindicância em todos os programas do Banco da Terra em Minas, e lamentou que representantes de assentados do Norte de Minas e do Vale do Jequitinhonha, onde os problemas seriam ainda maiores, não estivessem presentes à audiência.

Defesa - O contraponto foi feito pelo ex-gerente do Banco da Terra e secretário da Associação dos Municípios do Vale do Rio Piranga (Amapi), José Adalberto de Rezende, para quem a demanda por terras no Estado é grande e tanto o Banco da Terra, quanto o Crédito Fundiário, são "grandes alternativas" para acesso à terra. Ele discordou das afirmações de que o programa Banco da Terra é inviável e disse que não se pode generalizar, uma vez que em sua região, onde a opção foi por programas individuais, os problemas não são grandes. Ele criticou, ainda, a necessidade de licenciamento ambiental nos empreendimentos de reforma agrária. Ao final do debate, o deputado Ricardo Duarte discordou, ressaltando a importância do respeito à legislação ambiental.

Presenças - Deputados: Padre João (PT), presidente; Marlos Fernandes (PPS), vice-presidente; Doutor Viana (PFL), Ricardo Duarte (PT) e a deputada Elisa Costa (PT), além dos convidados citados.

 

 

 

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