Cláusula de barreira e fidelidade partidária são temas de
debate
Fidelidade partidária, cláusula de barreira e
verticalização foram os temas abordados na manhã deste sábado
(17/9/05), segundo e último dia do Fórum Técnico "Reforma política e
eleitoral: como viabilizá-la", promovido pela Assembléia, TRE e
UFMG. Enquanto o presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, e o
cientista político Carlos Ranulfo posicionaram-se contra a cláusula
de barreira, o promotor Marcelo Milagres defendeu-a, tendo em vista
os desvios praticados hoje pelos partidos políticos. A medida,
prevista em lei de 1995 mas nunca implementada, determina que os
partidos precisam ter 5% dos votos nacionais para obterem direito à
propaganda política e ao dinheiro do fundo partidário. O Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) pretende aplicar a regra nas próximas
eleições.
O cientista político Carlos Ranulfo, que coordena o
Centro de Estudos Legislativos da UFMG, avalia que, se implementada
a cláusula de barreira, 23% do eleitorado estariam excluídos de
representação no Congresso. A regra também serviria para "colocar a
corda no pescoço" de partidos como PDT, PPS, PV e PCdoB, entre
outros. Para o professor, o problema não está no número de partidos
ou nos partidos pequenos, que pouca influência têm no processo
decisório do Congresso Nacional. O problema está nas relações entre
os partidos e seus membros e entre partidos e eleitores. Para Renato
Rabelo, a cláusula de barreira é um instrumento anti-democrático,
ainda mais quando se leva em conta que a maioria dos partidos no
Brasil tem uma história recente, inferior a 25 anos.
Já o promotor Marcelo Milagres, que é professor de
Direito Civil da Faculdade de Direito Milton Campos, não encara a
regra como artifício para barrar os partidos, mas uma solução para
os inúmeros desvios praticados hoje pelas legendas. Ele pondera, por
outro lado, que o índice de 5% é elevado no atual estágio
democrático do País e deve ser reduzido. O Projeto de Lei (PL)
2.679/03, de autoria da Câmara dos Deputados, que tramita no
Congresso, reduz o índice de 5% para 2% e permite a associação de
partidos por três anos (federação de partidos) para viabilizar o
cumprimento da norma.
Virgílio Guimarães defende mini-Constituinte para
reforma profunda
O deputado federal Virgílio Guimarães (PT/MG), que
também participou dos debates, defende que uma reforma política
profunda não será viabilizada por um Parlamento regular. Para ele,
uma saída emergencial para a atual crise política seria cuidar tão
somente dos custos de campanha. Nesse sentido, o deputado elogia a
redução dos custos prevista no Projeto de Lei (PL) 275/05, de
autoria do Senado - a mini-reforma política que o Congresso quer
aprovar. Mudanças mais profundas, para Virgílio Guimarães, deveriam
ser propostas por uma mini-Constituinte exclusiva cujos integrantes
seriam, depois, inelegíveis. As resoluções dessa mini-Constituinte
seriam então submetidas a um referendo popular.
Na opinião do promotor Marcelo Milagres, no
entanto, "crise não se resolve com mudanças constitucionais". Nesse
sentido, ele é contra a proposta de emenda à Constituição que
pretende aumentar o prazo para modificações na lei eleitoral, a fim
de que as regras possam valer em 2006. Segundo a Constituição
Federal, esse prazo termina no dia 30 de setembro. O professor
argumenta ainda que a infidelidade partidária - problema crônico no
sistema brasileiro - poderia ser coibida com mudanças nos estatutos
dos próprios partidos. A lei estabelece que o prazo mínimo para
filiação, a fim de concorrer ao processo eleitoral, é de um ano
antes do pleito, a não ser que os partidos políticos deliberem de
maneira diversa. "Não precisamos de mudança na Constituição para
isso. Basta a deliberação democrática no âmbito das legendas",
defendeu, ao interpretar a lei.
Sigilo dos financiadores - O deputado Virgílio Guimarães retomou debate realizado na
sexta-feira sobre o "caixa 2" de campanhas. Ele sugeriu algo
defendido também pelo promotor eleitoral Thales Tácito Cerqueira:
que deveriam ser mantidos os sigilos dos financiadores pelo tribunal
eleitoral, a fim de evitar constrangimentos e estimular as doações
legais. O parlamentar pondera que as doações deveriam ser feitas
através de cheque nominal e ficariam registradas no tribunal. Ao
retomar o tema da mini-Constituinte, Virgílio Guimarães analisou que
ela seria um momento importante para repensar também o papel do
Senado. Para o deputado, deveria haver um representante por Estado,
com período de mandato coincidente com o do governador e eleito na
mesma chapa deste. Para ele, dessa forma os senadores estariam
representando, de fato, cada unidade da federação.
Convidados falam sobre lista aberta e fechada
A lista fechada, já discutida no primeiro dia do
fórum técnico, foi novamente abordada neste sábado. O cientista
político Carlos Ranulfo defendeu a adoção da lista fechada ou
flexível. Hoje, a lista é aberta, ou seja, o eleitor vota no
candidato de sua preferência. Na lista fechada, o cidadão vota no
partido e não no candidato. São os delegados do partido que
escolhem, em convenção, os nomes dos candidatos que vão figurar
nessa lista. Já na lista flexível, o partido ordena os nomes da
lista, mas o eleitor pode concordar ou não com esse ordenamento,
escolhendo outro nome da listagem.
Ao defender a lista fechada ou flexível, em
substituição à lista aberta adotada no Brasil, o professor da UFMG
fez duras críticas ao modelo em vigor no País. Questionando a
alegação de que a lista aberta cria vínculo entre eleitor e
deputado, Ranulfo destacou que o Congresso Nacional tem uma das mais
altas taxas de renovação do mundo, sendo a maior parte de seus
integrantes políticos novatos. Além disso, já foi demonstrado em
pesquisas que o eleitor esquece em qual candidato votou. Outro dado:
cerca de 25% a 30% dos eleitores brasileiros votam em candidatos
derrotados nas eleições, sendo seu voto transferido para o candidato
em melhor lugar na lista. "No Brasil, o cidadão vota em quem conhece
e pode eleger alguém de quem nunca ouviu falar", criticou.
Também defensor da lista fechada, o presidente do
PCdoB, Renato Rabelo, disse não acreditar em democracias fortes sem
partidos fortes. Rabelo foi o único entre os convidados a defender,
por outro lado, o financiamento público de campanhas - tema abordado
no primeiro dia do fórum. Ele acredita num avanço democrático com a
adoção da regra, apesar de avaliar que no País ainda não há cultura
para se implementar a novidade. Rabelo acredita que a fiscalização
dos gastos de campanha seria facilitada no financiamento público,
pois os valores a serem destinados aos partidos seriam fixos. Ele
classificou a opção privada como um "saco sem fundo".
Já o deputado Virgílio Guimarães é crítico da lista
fechada. Na opinião dele, a disputa partidária na convenção em que
seriam ordenados os nomes da lista poderia ser influenciada pelo
poder econômico. Uma saída seria deixar a opção de adotar lista
aberta ou fechada para os próprios partidos. Ele alega que isso
seria viável tecnicamente.
Aviso - O deputado João
Leite (sem partido), que coordenou os debates da manhã, informou que
a ata do fórum técnico será publicada no jornal oficial "Minas
Gerais"/Diário do Legislativo no dia 24 de setembro. Já a TV
Assembléia vai reprisar os debates nas seguintes datas: no dia 7/10,
às 8h30, a reprise será dos debates da manhã do dia 16/9; no dia
8/10, às 10 horas, a reprise será das discussões da tarde do dia
16/9. No dia 9/10, às 10 horas, a TV retransmitirá os trabalhos da
manhã deste sábado (17) e, no dia 10/10, às 8h30, as discussões da
tarde de sábado.
Presenças - Além das
autoridades citadas, compuseram a Mesa o 2º-vice-presidente da
Assembléia, deputado Rogério Correia (PT), autor do requerimento
para realização do fórum, que abriu os trabalhos; a professora Silma
Mendes Bertti, da UFMG, e Eleonora Fernandes Rennó, representando o
TRE.
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