TSE quer moralização das campanhas e devassa nas contas dos
partidos
Moralização das campanhas políticas e endurecimento
nas penas para crimes eleitorais são a resposta que o Tribunal
Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal procuram dar à crise
que envolve o Governo Federal e o Congresso Nacional. O ministro do
STF Carlos Velloso, que preside o TSE, relatou os esforços da
comissão que dirige para apresentar propostas de reforma política e
eleitoral para vigorarem nas próximas eleições. Ele foi um dos
participantes do Fórum Técnico "Reforma Política e Eleitoral: como
viabilizá-la", promovido pela Assembléia Legislativa nesta
sexta-feira (16/9/05).
Velloso defendeu o voto distrital misto, com base
no modelo bem-sucedido da Alemanha, para substituir o atual sistema
proporcional puro, em que cada candidato pode ir buscar votos em
qualquer região. "Este sistema está altamente comprometido com os
abusos do poder econômico, e só existe aqui no Brasil e na
Finlândia", afirmou.
As campanhas milionárias também foram alvejadas
pelo ministro. "É preciso baratear as campanhas, eliminar as cenas
externas, o recurso dos marqueteiros, proibir os showmícios. Não faz
sentido vender um candidato como se fosse sabonete", disparou Carlos
Velloso, acrescentando que, com moderação, "as campanhas podem ficar
mais enfadonhas, porém mais honestas".
Ele não concorda com o financiamento público das
campanhas por várias razões. A principal delas é que o Brasil tem
outras prioridades para atender com dinheiro público. O custo do
financiamento para a próxima campanha, se for mantido em R$ 7,00 por
eleitor, significará uma despesa entre R$ 800 milhões e R$ 1 bilhão.
"O governo já contribui com o horário eleitoral
gratuito, que democratiza a divulgação dos candidatos", argumentou.
"Além disso, o financiamento público não eliminaria os recursos
clandestinos, o chamado caixa 2". Para o ministro, o ideal seria
oferecer benefícios fiscais aos doadores identificados.
TSE promete devassa nas contas dos partidos
políticos
O ministro Velloso relatou uma série de medidas que
devem ser tomadas para controlar a máquina eleitoral. A de maior
impacto é passar um "pente fino" nas contas dos partidos políticos.
Para tanto, o TSE está convocando o Tribunal de Contas da União,
especialistas dos TREs e das receitas Federal, estaduais e
municipais.
Ele quer ainda punições mais severas para crimes
como os de caixa 2. "A lei prevê pena de um a cinco anos, mas
acontece que quase todos esses criminosos são primários, e pegam
apenas um ano, sem chegar a entrar numa cela. Essa punição é água de
flor de laranjeira", criticou.
Outra medida consiste em impedir que notórios
criminosos sejam candidatos. "Temos casos de candidatos condenados
por tráfico de drogas, reincidentes, que conseguiram registro
eleitoral, porque a lei só impede o registro daqueles que têm
sentença transitada em julgado. Ora, advogados hábeis podem protelar
indefinidamente, através de recursos, a conclusão de um processo.
Para nós, basta que a pessoa seja condenada para se tornar
inelegível", defendeu.
Um ponto polêmico defendido pelo ministro é a
aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional que tramita no
Congresso, alterando o artigo 16 da Constituição, que estabelece o
prazo de um ano para a edição de normas eleitorais para o pleito
seguinte. Esse artigo define o próximo dia 30 de setembro como prazo
fatal para alteração das regras do jogo eleitoral de 2006. Ninguém
acredita que seja possível fazer essas alterações num prazo tão
curto. A PEC adiaria esse prazo para o final de março próximo. Outra
PEC, do deputado Nei Lopes, simplesmente adia o prazo para 31 de
dezembro.
"Trata-se de um casuísmo, admito, mas um casuísmo
para o bem, porque é urgente e necessário aperfeiçoar a legislação
eleitoral que vai reger as próximas eleições", afirmou. A posição de
Velloso é compartilhada pelo presidente do Tribunal Regional
Eleitoral mineiro, desembargador Kelsen do Prado Carneiro.
Advogados não querem remendos no artigo 16 da
Constituição
Os advogados discordam com veemência da posição dos
magistrados quanto à PEC casuística que tramita no Congresso. A
exemplo do promotor de Justiça Thales Cerqueira, que fez exposição
no painel da manhã, o vice-presidente da Comissão de Estudos
Constitucionais da OAB, Fernando Neves, condena a agressão ao
princípio constitucional contido no artigo 16. "A Constituição não é
uma colcha de retalhos para ser remendada por qualquer interesse
momentâneo. Ela estabelece o prazo de um ano de antecedência para
dar tranqüilidade ao processo eleitoral.
No entanto, Neves acredita que o prazo será
prorrogado. "Isso é lamentável, porque muitas medidas propostas não
estariam sujeitas à regra do artigo 16, como a revisão da legislação
penal", afirmou. O jurista se inclui na corrente que defende que as
instruções do TSE não se limitem a cumprir as leis, mas dar sentido
a elas, e diz que toda a sociedade deve pressionar o Congresso para
que faça a reforma. "Pessoalmente, acho que a implantação do voto
distrital misto será mais fácil que a do financiamento público das
campanhas, que, entre outros problemas, jogaria o financiamento
privado para a clandestinidade", previu.
Maria Helena Weber, professora da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, falou sobre o papel da comunicação no
processo eleitoral e da necessidade de que a sociedade ingresse no
debate sobre as reformas políticas. "Leio centenas de notícias por
dia e não encontrei até agora um argumento mobilizador da sociedade,
talvez porque a mídia não queira cumprir esse papel, ou esteja
esperando uma iniciativa do Judiciário".
Weber não acredita que a propaganda política deva
voltar aos tempos da Lei Falcão, com retratinho e currículo dos
candidatos na TV, mas também condena a encenação política e o
interesse mercadológico do capital sobre as candidaturas. Para ela,
"a imagem pública do candidato não é formada apenas pela propaganda,
mas também pelo noticiário e pela opinião dos jornalistas que cobrem
a cena política. Passamos do palanque para o showmício. Será que não
há forma melhor para a política se comunicar?"
Presenças - Os deputados
Rogério Correia (PT) e Antônio Júlio (PMDB), coordenaram os dois
painéis da tarde e os debates. Participaram da mesa o ministro
Carlos Velloso, presidente do TSE; o desembargador Kelsen Carneiro,
presidente do TRE; o vice-presidente da Comissão de Estudos
Constitucionais da OAB, Fernando Neves; a professora Maria Helena
Weber e o desembargador Reynaldo Ximenes, do TRE.
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