Comissão investiga direitos de chapadeiros a áreas do
IEF-MG
Um desentendimento entre 80 famílias de posseiros
do município de Felício dos Santos e a administração do Parque
Estadual do Rio Preto, com risco de degenerar em conflito, foi
intermediado pela Comissão de Direitos Humanos da Assembléia
Legislativa, em audiência pública realizada na igreja dacidade,
nesta quinta-feira (4/8/05).
Há mais de cinqüenta anos, os posseiros criam gado
solto na chapada onde estão as nascentes do Rio Preto, afluente do
Jequitinhonha. Em 1993, foi criado o parque por lei estadual,
mediante a desapropriação de 10.755 hectares de terras que incluíam
esses pastos. Os fatos que motivaram o deslocamento do presidente da
comissão, deputado Durval Ângelo (PT), até Felício dos Santos,
tiveram início no dia 29 de abril passado, quando os guardas do
Parque Estadual, com apoio da Polícia Ambiental, destruíram um
curral reformado pelos chapadeiros.
Segundo o porta-voz dos chapadeiros, vereador
Mateus Lima Leite Soares, a alegação dos policiais era a de que os
mourões de candeia utilizados na reforma do curral tinham sido
retirados ilegalmente da reserva do parque. Reconhecendo essa razão,
fizeram uma coleta na comunidade para comprar 43 postes de
eucalipto, com nota fiscal, e mil metros de arame liso. O curral foi
reconstruído, mas um mês depois foi novamente desmanchado e o
material confiscado, gerando grande revolta entre os
chapadeiros.
Mateus Soares exibiu na audiência um mapa assinado
por profissional registrado no Crea-MG, demonstrando que a área do
curral estaria fora dos limites do parque, e entregou ao deputado
Durval Ângelo um dossiê com o histórico detalhado do conflito, onde
consta a denúncia de que as terras teriam sido adquiridas
irregularmente de um alto funcionário do governo de Minas, chamado
Dilson Cosme Ramos.
"O Dilson tinha apenas 144 hectares documentados, e
declarou que possuía outros 10 mil hectares, mas não apresentou
documentação. O Estado pagou por essa posse R$ 488 mil em 1994",
afirmou o vereador. Suas palavras foram confirmadas pelo
superintendente regional do IEF, Sílvio de Castro Fonseca: "A minha
verdade é de que o único posseiro verdadeiro naquela região era o
falecido Mozart Xavier de Sena, cujos herdeiros ficaram com 3.400
hectares", disse Fonseca.
Diretor diz que remoção do curral foi determinada
pela Promotoria
O diretor de parques do IEF-MG, Célio Murilo
Carvalho Vale, sustenta que o curral foi construído dentro da área
de preservação do parque, e recolheu uma cópia do mapa para
responsabilizar o profissional que o assinou. Reconheceu, todavia,
que a área do parque não está cercada, e que o órgão vem tolerando
essa atividade tradicional de criação de gado solto, até que o
parque tenha seus limites demarcados com absoluta precisão.
"A remoção do curral foi recomendada pelo
departamento jurídico do IEF e determinada pelo promotor de Justiça
de Diamantina, que entendeu que a obra poderia gerar novos direitos
de posse. Posso garantir que o material confiscado está em nosso
poder e será devolvido intacto aos seus proprietários", disse
Carvalho Vale.
Vários dos chapadeiros entendem que a área onde
está o curral lhes pertence, e que se o IEF desejar expandir o
parque, terá que indenizar-lhes os direitos de posse. No entanto, o
diretor do IEF assegura que não há intenção de expandir a área do
parque, que já protege as vertentes das nascentes do rio Preto, e
que não há direitos de posse porque não há família alguma morando
dentro dessas terras. Por outro lado, dispôs-se a negociar uma
solução que atenda as 80 famílias de chapadeiros, desde que não
inclua a reconstrução do curral em área protegida por lei.
Ninguém conhece o vendedor das terras
Outras queixas dos chapadeiros, de que não teriam
sido ouvidos durante uma reunião no escritório regional do IEF em
Diamantina, e denúncias contra o comportamento arbitrário do gerente
do Parque, Antônio Augusto de Almeida, que não compareceu à
audiência, foram recolhidas pelo deputado Durval Ângelo. Ele também
interrogou pelo menos uma dezena dos mais antigos entre os
chapadeiros sobre Dilson Cosme Ramos, que teria vendido as terras
para a constituição do parque, mas todos eles, sem exceção, negaram
conhecê-lo.
Dentre todas as denúncias, o presidente da Comissão
de Direitos Humanos considerou mais grave essa compra irregular de
terras, e anunciou que pretende ir a fundo na questão. Adiantou
ainda que pretende levar a questão à Promotoria de Conflitos
Agrários em Belo Horizonte e à Vara de Conflitos Agrários, cujo
titular, Juiz Renato Dreshi, tem sido sensível à questão dos
direitos humanos. "Todos queremos preservar a natureza, mas de nada
adianta ter um rio limpinho, se for à custa da miséria e da exclusão
social das famílias", afirmou o deputado.
O deputado pediu aos chapadeiros uma trégua de
cinco meses para que a solução seja alcançada, e informou que dentro
de um mês deverá convocá-los para uma reunião em Belo Horizonte, à
qual o gerente do Parque, Antônio Augusto de Almeida, terá que
comparecer.
Presenças - Deputado
Durval Ângelo (PT), presidente; vereador Luiz Lopes do Nascimento,
presidente da Câmara Municipal de Felício dos Santos; Célio Carvalho
Vale, diretor de Parques do IEF-MG; Sílvio Castro Fonseca,
superintendente regional do IEF-MG; Onofre Pinto dos Santos,
presidente do Conselho Comunitário de Desenvolvimento Social;
vereador Antônio Ferreira dos Santos, presidente do Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Felício dos Santos; vereador Mateus Lima
Leite Soares; Charles Alessandro de Castro, advogado da ONG
Sociedade de Investigação Florestal, e os chapadeiros José Pereira
do Cotó, Raimundo Rocha dos Santos, Luiz da Conceição Lopes,
Sebastião Cecílio Jorge, Edésio de Jesus, José Rodrigues e José
Jesus da Luz.
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