Audiência debate destino do Cardiominas
A construção de um centro de especialidades médicas
no prédio do extinto Cardiominas, na Capital, mediante parceria
entre a Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte, as secretarias
estadual e municipal de Saúde, o Ministério da Saúde e o Instituto
de Previdência dos Servidores do Estado (Ipsemg) divide a opinião de
parlamentares, trabalhadores e dirigentes de entidades da área de
saúde. Enquanto as partes diretamente envolvidas na proposta de
parceria defendem a iniciativa, os conselhos municipal e estadual de
Saúde e sindicatos de servidores estaduais já se posicionaram
contrários à idéia, porque não concordam com a transferência do
imóvel para a iniciativa privada. A proposta é objeto de um projeto
de lei que tramita na Assembléia Legislativa e que dá mais tempo à
Santa Casa para assumir o Cardiominas, e foi debatida, durante
quatro horas, em audiência pública da Comissão de Saúde nesta
terça-feira (2/8/05).
A reunião foi realizada a requerimento do deputado
Adelmo Carneiro Leão (PT), presidente da Comissão de Saúde e relator
do Projeto de Lei (PL) 2.265/05, do governador, que trata do
assunto. No final de junho, o projeto recebeu parecer favorável da
Comissão de Constituição e Justiça. Na reunião em que foi aprovado o
parecer, o parlamentar ponderou que era preciso aprofundar as
discussões. Na opinião dele, a matéria não pode tramitar de forma
apressada, pois envolve a doação de um patrimônio público, sem
licitação, para a iniciativa privada; e muitos recursos para
reerguer o que chamou de "esqueleto" do Cardiominas - que fica no
bairro Santa Efigênia, em Belo Horizonte.
Centro de especialidades médicas
De acordo com o secretário municipal de Saúde,
Helvécio Magalhães, os serviços de saúde da Capital são demandados
por pacientes de cerca de 630 municípios mineiros, sobretudo nos
procedimentos de internações e consultas de especialidades médicas.
"O maior estrangulamento acontece nos atendimentos de média
complexidade", esclareceu o secretário. Segundo ele, o SUS/BH oferta
serviços em 42 especialidades, sendo que há demanda reprimida em
várias delas, problema que poderia ser amenizado com a implantação
de um centro de especialidades médicas. Helvécio Magalhães disse que
a PBH não tem condições de assumir, como serviço próprio, a
instalação desse centro, e que uma boa alternativa seria a ampliação
desse serviço mediante contrato com um prestador como a Santa Casa.
Ele esclareceu que até o momento não há nenhum convênio ou
transferência de recursos com essa finalidade, mas apenas discussões
e negociações sobre a viabilidade da utilização de parte do prédio
do Cardiominas para construção do centro de especialidades. O
secretário disse, ainda, que o ambulatório da Santa Casa tem sido
regulado pela Secretaria Municipal desde 2002.
Marcelo Gouvêa Teixeira, subsecretário de Inovação
e Logística da Secretaria de Estado de Saúde, confirmou as
negociações que envolvem a elaboração do projeto do centro de
especialidades e informou que o Ministério da Saúde já manifestou
interesse em participar do empreendimento. Na avaliação do
subsecretário, após passar por graves problemas de gestão a Santa
Casa encontra-se num processo de franca recuperação financeira, que
aponta para a sustentabilidade da instituição. "A Santa Casa é hoje
um exemplo de serviço público não estatal e pode ser uma grande
parceira na construção do centro", analisou.
Recuperação do imóvel do Cardiominas
O presidente do Ipsemg, Mauro Lobo, também defendeu
a proposta como meio de se dar uma destinação à estrutura do
Cardiominas, que encontra-se inacabada e sem qualquer serventia há
15 anos. Segundo ele, o instituto poderia ser parceiro na iniciativa
transferindo, para o local, os serviços atualmente prestados em
prédio alugado na região da Savassi, além da drogaria do Ipsemg.
Isso, de acordo com Mauro Lobo, traria economia significativa para a
autarquia.
O diretor-geral da Santa Casa, Porfírio Marcos
Rocha, destacou a reformulação gerencial interna da instituição e
considerou que ela poderá ser uma espécie de "catalisador" da
parceria entre Município, Estado e União, com ganhos para a
população. Ele lembrou que diversos estudos já apontaram que não há
necessidade de ampliação do número de leitos hospitalares na região
e que o "grande gargalo" no atendimento à saúde é justamente no
campo das especialidades. Porfírio Rocha ressaltou, ainda, a
localização estratégica do Cardiominas.
Destinação para iniciativa privada é
polêmica
A polêmica sobre a doação do imóvel do Cardiominas
para a Santa Casa ficou evidente nas intervenções dos representantes
dos conselhos responsáveis pelo controle social na área de saúde.
Nicodemus de Arimathea e Silva Jr., vice-presidente do Conselho
Estadual de Saúde, declarou que desde 1997, quando foi aprovada a
lei que autorizou a doação, o órgão posicionou-se contrário à
medida. Ele lembrou que o conselho já havia apontado a dificuldade
da Santa Casa para arcar com a construção de um hospital, como
estava previsto na lei; e manifestou a indignação dos membros do CES
com a possibilidade de a doação ser reiterada com a ampliação do
prazo para efetiva utilização do imóvel. Nicodemus de Arimathea
considerou um "descalabro" o fato de o poder público ter investido
milhões no projeto do Cardiominas sem que, 15 anos depois, tenha
sido produzido um ato médico sequer como resultado. Ele criticou,
também, a disposição do governo de efetivar a transferência da
gestão do hospital de Venda Nova, na Capital, para uma Oscip -
organização da sociedade civil de interesse público.
O secretário-geral do Conselho Municipal de Saúde,
Paulo Roberto Venâncio, embora reconhecendo a melhoria da gestão
interna da Santa Casa, também condenou a transferência do imóvel
para a iniciativa privada e disse que a solução seria manter a
gestão do centro de especialidades sob o controle público. Ele
criticou o desrespeito às decisões dos conselhos de saúde, que, pela
legislação, são deliberativos. Paulo Roberto disse que o CMS, por
unanimidade, aprovou resolução solicitando, à Assembléia, a
tramitação de auditoria realizada pelo Tribunal de Contas do Estado
sobre o Cardiominas, e indagou sobre a destinação dada aos
equipamentos adquiridos pelo Estado para o Cardiominas. O
conselheiro também pediu que a Assembléia não aprove o projeto que
trata da renovação da doação do Cardiominas.
Após as exposições, o deputado Fahim Sawan (PSDB)
disse que a proposta de criação do centro de especialidades médicas
é uma "grande iniciativa", mas ressaltou a importância de ser ter
garantias efetivas para o custeio do atendimento. Adelmo Carneiro
Leão criticou o fato de o Executivo ainda não ter enviado ao
Legislativo projeto regulamentando o funcionamento do Conselho
Estadual de Saúde e cobrou diálogo entre governo e conselho.
Para entender o projeto
O Projeto de Lei (PL) 2.265/05, do governador Aécio
Neves, que tramita em 1º turno, altera a Lei 12.688, de 1997, que
autoriza a doação de imóvel à Santa Casa de Misericórdia de Belo
Horizonte e extingue a Fundação Instituto do Coração de Minas Gerais
(Cardiominas). Originalmente, o projeto dá novo prazo para a
conclusão do prédio, que seria de 24 meses contados da publicação da
nova lei, além de determinar a implementação de um centro de
especialidades em saúde. Segundo o governo, seria ampliada a
capacidade de atendimento dos hospitais da Santa Casa aos pacientes
do SUS, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, que passaria a
realizar um mínimo de 60 mil atendimentos por mês, em diversas
especialidades.
O deputado Adelmo Carneiro Leão alertou, no
entanto, que a Santa Casa está em crise e que só sobrevive com a
ajuda da Prefeitura de Belo Horizonte e do governo do Estado. "De
onde a Santa Casa vai tirar dinheiro para construir o hospital?",
indagou, na reunião da Comissão de Constituição e Justiça Ele também
questionou, naquela ocasião, a determinação de reservar 60% da
capacidade de atendimento dos hospitais da Santa Casa ao SUS. "Isso
não é mérito. É restrição de atendimento, em detrimento da população
que utiliza o Sistema Único de Saúde", questionou. Outra crítica do
parlamentar foi quanto à garantia de atendimento a servidores
estaduais, mediante convênio com o Ipsemg.
Emenda - O debate na CCJ
não impediu que fosse aprovado o parecer do relator, deputado Ermano
Batista (PSDB), que apresentou a emenda nº 1. Ela modifica a redação
do inciso I do artigo 2º da Lei 12.688, de 1997, a que se refere o
artigo 1º do projeto. Desta forma, obriga a Santa Casa a concluir a
construção do prédio do Cardiominas e a implementar, no prazo de 10
anos da data de lavratura da escritura pública de doação do imóvel
(11/3/98), um centro de especialidades em saúde dedicado
exclusivamente ao atendimento de pacientes do SUS. Esse centro
contará com o mínimo de 60 consultórios de atendimento ambulatorial
de diversas especialidades médicas, uma unidade de cirurgia
ambulatorial e um centro de diagnósticos de suporte. A lei
determinava um prazo de sete anos para concluir a construção do
hospital e colocá-lo em funcionamento.
Na justificativa do parecer, o deputado Ermano
Batista faz referência ao artigo 2º da Lei 12.688, que assegura,
mediante convênio com o Ipsemg, o atendimento a servidores públicos
estaduais na proporção de 15% de sua capacidade. Já no PL 2.265/05
deixa-se de estabelecer um percentual de capacidade da Santa Casa
para esse fim e determina como sua obrigação viabilizar, mediante
convênio, a utilização de parte de suas dependências, em projeto a
ser apresentado pelo Estado. O deputado também informa que, segundo
o governador, foram estabelecidas parcerias com o município de Belo
Horizonte, que contribuirá com recursos financeiros; com o Ipsemg,
que utilizará parte das instalações para organizar novo ambulatório
médico destinado ao atendimento dos servidores; e com a iniciativa
privada.
Presenças - Deputados
Adelmo Carneiro Leão (PT) - presidente;, Fahim Sawan (PSDB), Ivair
Nogueira (PMDB) e Rêmolo Aloise (PSDB). Participaram como convidados
o secretário de Saúde de Belo Horizonte, Helvécio Magalhães; o
subsecretário de Inovação e Logística da Secretaria de Estado de
Saúde, Marcelo Gouvêa Teixeira; o presidente do Ipsemg, Mauro Lobo;
o diretor-geral da Santa Casa, Porfírio Marcos Rocha; o
vice-presidente do Conselho Estadual de Saúde, Nicodemus de
Arimathea e Silva Jr.; o secretário-geral do Conselho Municipal de
Saúde de BH, Paulo Roberto Venâncio; e a secretária adjunta de Saúde
de BH, Maria do Carmo.
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