Projeto de 30 barraginhas em Salinas não tem objetivo
claro
Um projeto de 30 pequenas barragens no Rio Bananal,
em execução pela Fundação Rural Mineira (Ruralminas), ao custo de R$
22 milhões, está afetando a vida de 400 famílias de pequenos
agricultores que vivem no vale. Eles não compreendem a finalidade do
projeto e receiam que sua vida possa piorar, desconfiando do
benefício. Esse problema motivou uma audiência pública da Comissão
de Meio Ambiente e Recursos Naturais da Assembléia Legislativa,
realizada na Câmara Municipal de Salinas nesta quinta-feira
(30/6/05), a requerimento do deputado Rogério Correia (PT).
A audiência foi presidida pelo deputado Doutor
Ronaldo (PDT), e teve a participação do autor do requerimento e do
deputado Alencar da Silveira Jr. (PDT). Os deputados decidiram
visitar o vale do rio Bananal antes da reunião, para tomarem
conhecimento da situação. Em companhia do prefeito Zé Prates, de
vereadores e lideranças dos trabalhadores rurais, foram primeiro à
barragem 22, ouvir os moradores. Waldemar Rosa Pereira, de 62 anos,
explicou que a água ficou turva e o rio cheio de lama, e denunciou a
existência de uma draga de areia abaixo daquele ponto.
"O assoreamento aqui é rápido", explicou o prefeito
Zé Prates. "Nas primeiras barragens, construídas em 2002, a água só
chega ao joelho. Quando o rio subir muito, vai passar pelos lados e
levar tudo", previu.
Na segunda visita, à barragem nº 7, chamada da
Ponte de Madeira, os deputados constataram rachaduras preocupantes,
e o consultor da Comissão de Meio Ambiente, André Naves, mediu o
assoreamento, que deixava menos de um metro de lâmina d'água.
Famílias ilhadas e sem acesso à estrada
Na Câmara Municipal, estavam presentes quase uma
centena dos agricultores do Bananal, a maioria composta por idosos.
Rogério Correia explicou que a reunião tinha quatro finalidades:
discutir os impactos ambientais, avaliar os impactos sociais, apurar
em que ponto estão as obras e se há dinheiro para concluí-las.
O prefeito questionou os critérios de definição
daquela obra, que não foram sequer discutidos com a comunidade, a
ponto de restarem dúvidas se seriam destinadas à perenização do rio,
à agricultura irrigada, ao abastecimento ou ao lazer. Na opinião de
Zé Prates, seria melhor descer tubulação da grande barragem
construída pela Cemig no rio Bananal e fazer irrigação por
gravidade, sem o custo de eletricidade. "As barragens cortaram
caminhos naturais dos produtores e destruíram as várzeas",
alertou.
Francisco Alves dos Santos confirma que perdeu os
"quintalinhos" onde plantava horta. "A barragem encurtou as vargens.
A mulher vai lavar roupa, não pode. Vai pegar água, não presta. Pra
quê fazer uma coisa dessas?", questionou.
Moradores denunciaram que 16 famílias compostas
quase em sua totalidade por idosos ficaram ilhadas entre as
barragens 27 e 28, sem acesso à estrada. Outros reclamaram que antes
era possível entrar um trator para gradear sua propriedade, mas
agora nem carro-de-boi consegue passar para tirar a produção.
O presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais
de Salinas, Mário Francisco dos Santos, disse que o projeto foi
decidido de cima para baixo, e que agora a Ruralminas quer que os
produtores, que tinham água de graça, tenham que comprar bombas e
pagar energia à Cemig. "Querem pôr cangalha em nós",
denunciou.
Draga de areia foi lacrada, mas continuou
funcionando
O promotor de Justiça de Salinas, Vinicius Galvão,
explicou detalhadamente sua luta para interditar a draga denunciada
pelo morador Waldemar Pereira, que funcionava entre as barragens 21
e 22, e além de destruir o rio ainda o poluía com óleo. Ele pediu a
presença de agentes ambientais de Taiobeiras, mas não havia pessoal
para atendê-lo. Então lacrou sozinho a draga, mas teve notícias de
que o empreendedor retirou o lacre e vendeu mais de 200 caminhões de
areia depois disso. Com seu empenho, a draga agora está parada,
aguardando ser retirada do local.
José Alvarenga Ribeiro, veterano engenheiro da
Ruralminas, admitiu que o projeto de 30 barramentos com intervalos
de um quilômetro entre cada um é de sua autoria, e sustentou que a
idéia do prefeito Prates de descida de tubos de irrigação da
barragem principal não funcionaria, porque a vazão é grande, de 1,2
metros cúbicos por segundo. Concordou que o solo da região faz com
que o assoreamento seja inexorável, até mesmo na grande barragem do
Rio Salinas, que abastece a cidade e cuja vida útil não passaria de
20 anos. Contudo, sugeriu que os próprios produtores, beneficiários
das barraginhas, fizessem anualmente um mutirão para limpeza. Essa
sugestão foi recebida com protestos da platéia.
Falando em nome da Emater, Antônio Eustáquio
Ferreira Dutra disse que o escritório local não está dimensionado
para dar assistência às 195 propriedades do Bananal, que
totalizariam 1.130 hectares irrigados. O agrônomo Edson Nogueira
admitiu que participou da elaboração do projeto agrícola para a
Ruralminas, e recomendou que os cultivos ali sejam de fruticultura e
cana-de-açúcar, mas que isso ainda não está definido. Informou ainda
que faltam apenas dez propriedades para conseguirem o licenciamento
ambiental exigido pelo Copam.
Deputado quer que Ruralminas pague limpeza das
barragens
Ao final da reunião, os deputados tomaram algumas
decisões. Rogério Correia estranhou que o projeto não tivesse meta
ou planejamento real de objetivos. Doutor Ronaldo afirmou que
projeto algum pode prosperar sem que seja feito em parceria com a
comunidade ou sem considerar o saber popular. Alencar da Silveira
Jr. propôs que a Ruralminas contrate e pague o povo para limpar as
represas, em vez de pretender que isso seja feito em mutirão. "É
preciso gerar emprego aqui. Se for preciso bombear a água, vamos
pedir à Cemig que conceda uma tarifa subsidiada", disse Silveira Jr.
Proposta apresentada pelo deputado Rogério Correia
pede para que os agricultores formem uma comissão e vão a Belo
Horizonte em companhia do prefeito, para audiências que serão
marcadas com a direção da Ruralminas e da Cemig. Os deputados
pretendem também solicitar à Emater que crie a estrutura necessária
para assessorar os produtores do Vale do Bananal.
Presenças - Deputados
Doutor Ronaldo (PDT), que presidiu a reunião; Rogério Correia (PT) e
Alencar da Silveira Jr. (PDT).
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