Comissão de Saúde discute situação dos hospitais
filantrópicos
A defasagem na tabela de remuneração de
procedimentos médicos do SUS está levando os hospitais filantrópicos
mineiros a uma situação de insolvência. Administradores e provedores
de hospitais de Belo Horizonte, Montes Claros, Ipatinga e Alfenas
revelaram, durante uma audiência pública da Comissão de Saúde,
realizada nesta quarta-feira (29/6/05), que o SUS paga R$ 2,50 por
um conjunto de cinco refeições, e que o repasse per capita em
Minas é R$ 4,00 inferior à média nacional.
A audiência pública resultou de um requerimento
conjunto dos deputados Célio Moreira (PL) e Adelmo Carneiro Leão
(PT). Moreira relatou a situação da Santa Casa de Corinto, que
atende também a Buenópolis, Monjolos e Santo Hipólito, cujo bloco
cirúrgico foi fechado há dois anos e só recentemente se equipou para
realizar partos. "Em média, os hospitais filantrópicos realizaram
70% das consultas do SUS, e por isso precisam ter tratamento
diferenciado", cobrou o deputado, lembrando que participou da luta
para impedir que a Siemens retirasse seus tomógrafos da Santa Casa
de Belo Horizonte, por atraso no pagamento. Moreira admitiu,
todavia, que, embora insuficiente, o Pro-Hosp, programa do Governo
de Minas, "está dando um fôlego aos hospitais".
Para o presidente da Comissão, deputado Adelmo
Carneiro Leão (PT), "é preciso fazer valer o fundamento da Emenda 29
e o detalhamento da pactuação de recursos através das boas leis que
já temos. Não nos cabe, como parlamentares, definir qual é o lugar
que precisa de uma ambulância ou de um equipamento".
Média complexidade é o gargalo para os
hospitais
Os administradores dos hospitais filiados à
Federasantas, a federação das santas casas, passaram a relatar a
situação de suas instituições. Juracy Gomes Carneiro, de Alfenas,
disse que os hospitais pequenos, com 10 a 30 leitos, não têm como
sobreviver. Segundo ele, a pior defasagem está nas tabelas de
remuneração dos procedimentos de média complexidade. Tereza da Gama
Paes, do Hospital da Baleia, confirmou a afirmação, e elogiou o
advento do Pro-Hosp. Mas considerou que os critérios de distribuição
de recursos têm que ser técnicos, e não políticos. "Quem atende mais
que receba mais". Pediu atenção especial ao custeio, porque para
comprar equipamentos modernos os hospitais até conseguem doações.
"Infelizmente, o custeio não tem apelo", explicou.
O Hospital N. Sra. das Mercês, de Montes Claros,
atende uma vasta região que compreende o Norte de Minas, o
Jequitinhonha e o Sul da Bahia. Elias Siufi, seu provedor, disse que
61% dos internados não são da cidade. "Há nove anos
profissionalizamos nossa gestão e diversificamos as atividades para
buscar recursos, com funerária, floricultura e plano de saúde",
disse ele, ressalvando que não reduziram o atendimento pelo SUS
porque o arcebispo exigiu que o hospital faça filantropia. "Nessa
busca incessante por recursos, viajamos a Brasília, sorrimos para
deputados, pedimos emendas, sendo que este não é nosso papel. Nosso
papel é oferecer saúde à população", disse Siufi.
O hospital Márcio Cunha, de Ipatinga, foi criado
pela Usiminas, mas esta siderúrgica estaria impedida de destinar
verbas à instituição desde que foi privatizada. "Somos o maior
hospital da região Leste de Minas. Oferecemos 480 leitos para uma
região com 750 mil habitantes e investimos recentemente R$ 55
milhões na ampliação. Em 2004 fizemos 19.212 internamentos pelo SUS,
pelos quais recebemos R$ 9,9 milhões. Nosso custo com esses
pacientes foi de R$ 19,4 milhões. O déficit é de R$ 9,5 milhões",
informa o diretor José Carlos Gallinari.
Negociação da Santa Casa com a Siemens foi
bem-sucedida
A questão da Santa Casa de Belo Horizonte, bem
conhecida dos deputados, foi resumida por seu diretor, César
Cristiano de Lima. O hospital administra uma dívida de R$ 251
milhões, que corresponde a 1/4 de toda a dívida das instituições
filantrópicas, mas conseguiu pelo menos frear sua evolução, ao
negociar com a Siemens a redução pela metade da dívida, e ganhar
tratamento diferenciado nas questões trabalhistas julgadas pelo TRT.
"Temos capacidade para oferecer mil leitos, mas oferecemos hoje
cerca de 830. Embora privada, a Santa Casa é o mais público dos
hospitais mineiros. Criamos um plano de saúde que tem 120 mil vidas,
administramos também os hospitais São Lucas e Hilda Brandão, asilo,
creche, funerária, cursos de mestrado e pós-graduação, em busca de
recursos para equilibrar a filantropia, e estabilizamos nossa
situação em 2004", disse César Lima.
Quando um hospital extrapola o teto do SUS, os
repasses são negados pelo gestor municipal de Belo Horizonte, que é
o secretário municipal de Saúde, Helvécio Magalhães. Isso aconteceu
com o Hospital da Baleia, segundo seu administrador, Francisco
Figueiredo, gerando um déficit de R$ 200 mil. "Ora, nós atendemos
93% dos pacientes pelo SUS, mas o reconhecimento não vem. Teremos
que diversificar nossos negócios para buscar sustentabilidade",
disse ele.
O custo da tecnologia em saúde foi tema recorrente
na audiência pública. Vários depoentes afirmaram que a época em que
o médico resolvia grande parte dos problemas com um simples
estetoscópio está encerrada. Os equipamentos modernos são
importados, caríssimos, e sua manutenção tem custo exorbitante. Por
isso Samuel Figueiredo, da Santa Casa de Montes Claros, propôs que o
Brasil assuma o desafio de, num horizonte de dez anos, tornar-se
auto-suficiente e exportador de tecnologia médica.
Teto do SUS em Minas está paralisado com dados
populacionais de 2001
Marcelo Gouveia Teixeira, secretário adjunto de
Estado da Saúde, explicou a gênese do Pro-Hosp, programa criado para
enfrentar a crise do acesso ao atendimento hospitalar. "O primeiro
princípio foi o de que não haveria relação direta entre a Secretaria
e os hospitais. Essa se daria através do gestor municipal de saúde.
O segundo foi que as decisões sobre metas saíssem do gabinete do
secretário e fossem tomadas nas macrorregiões. Daí criamos a
Diretoria de Ações Descentralizadas de Saúde (DADS). Definimos
também que parte dos recursos poderia ser destinada ao custeio, mas
não sua totalidade". A profissionalização da gestão dos hospitais
também contribuiu para reduzir o problema. Teixeira também
considerou injusto que Minas receba R$ 4,00 a menos per
capita, porque o pressuposto seria de que o mineiro adoecesse
menos, quando acontece o contrário. "Outra questão é que o teto está
paralisado com os dados populacionais de 2001, e o secretário Marcus
Pestana luta para atualizá-lo", informou.
Dentre os deputados, o maior volume de temas
polêmicos foi levantado por Carlos Pimenta (PDT), que tem
consultório em Montes Claros, diante do Pronto Socorro da cidade.
"Outro dia chamei a imprensa para contar 37 ambulâncias de outras
cidades, estacionadas ali, levando até colchão e comida para os
pacientes que não conseguem leitos ou macas", denunciou o deputado
médico.
Pimenta ressalvou as qualidades do SUS, que
considera um sistema milagroso, bem-sucedido, sem os ralos de
antigamente, com controles rigorosos em todas as instâncias, mas não
deixou de assinalar que o superávit primário de janeiro a maio,
anunciado pelo ministro Palocci, foi superior a todo o gasto
previsto para a saúde ao longo do ano. Concordou com Tereza Paes de
que os critérios para repasses do Pro-Hosp deveriam ser técnicos, e
que gostaria de ficar livre de intervir para conseguir recursos para
sua região. No entanto, disse que o papel do deputado é fiscalizar e
denunciar as discrepâncias, como a que apurou em Turmalina e Minas
Novas, no Jequitinhonha, que receberam recursos e Capelinha, que
atende um número maior de pacientes, ficou à míngua.
Pimenta pediu o rápido credenciamento de leitos na
sua região, o credenciamento de serviços caros que foram implantados
nos hospitais por exigência do Ministério da Saúde e a implantação
do Cartão SUS, que assegure que o recurso entre diariamente na conta
do hospital.
Um ponto de vista dos hospitais privados foi
trazido à reunião pelo deputado Rêmolo Aloise (PSDB), que empreende
um hospital em sua cidade, São Sebastião do Paraíso. Pediu que todos
reconhecessem que a ambulância reduz o custo dos pequenos
municípios, e que esses assumam os procedimentos de baixa
complexidade. Opinou que a busca dos planos de saúde vai na mesma
lógica dos hospitais privados. "Não combatam os hospitais privados,
senão vai ser o caos total", disse Aloise. "Precisamos ser
parceiros, cada um no seu lugar", concluiu o deputado.
Presenças: Deputados
Adelmo Carneiro Leão (PT), presidente; Carlos Pimenta (PDT),
vice-presidente; Fahim Sawan (PSDB), Edson Rezende (PT), Célio
Moreira (PL), Rêmolo Aloise (PSDB) e a deputada Jô Moraes
(PCdoB).
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