Ambientalistas e setor produtivo discutem alteração da Lei Florestal

Defendido pela indústria do ferro-gusa e pela Associação Mineira de Silvicultura e criticado por ambientalistas, Inst...

22/06/2005 - 00:01
 

Ambientalistas e setor produtivo discutem alteração da Lei Florestal

Defendido pela indústria do ferro-gusa e pela Associação Mineira de Silvicultura e criticado por ambientalistas, Instituto Estadual de Florestas (IEF) e Ministério Público, o projeto que altera a Lei Florestal foi discutido nesta quarta-feira (22/6/05) pela Comissão de Meio Ambiente e Recursos Naturais da Assembléia Legislativa. O debate foi solicitado pelo relator, deputado Paulo Piau (PP). A proposição amplia a base legal para o consumo de carvão proveniente de desmatamentos autorizados de mata nativa, como forma de estimular o comércio formal da matéria-prima. Os defensores do projeto dizem que ele vai coibir a comercialização informal do carvão vegetal e evitar fraudes. Já os críticos alegam que a proposição vai legalizar o consumo indiscriminado de carvão de nativa, causando prejuízos ao meio ambiente.

A superintendente executiva da Associação Mineira de Defesa do Meio Ambiente (Amda), Maria Dalce Ricas, esclareceu que a entidade não quer paralisar a atividade econômica, mas denunciou que a maior fonte de desmatamento em Minas é a do setor de produção de carvão para a usina siderúrgica. "O setor de ferro-gusa é viciado em derrubar floresta nativa, pois pagar pela reposição florestal em dobro é menos oneroso do que plantar", criticou. Para Maria Dalce Ricas, a Assembléia não deveria buscar uma mudança pontual na Lei Florestal, mas sim discutir o tema em profundidade. Ela defendeu o fim da possibilidade de reposição florestal em dobro e a implementação de mecanismos de incentivo para as florestas plantadas - já previstos em lei.

A defesa do projeto coube aos secretários executivos do Sindicato da Indústria do Ferro (Sindifer), Luiz Eduardo Furiati Lopes, e da Associação Mineira de Silvicultura (AMS), Ricardo Castilho. Furiati disse que seu setor não é a favor da degradação do meio ambiente ou de prejudicar a biodiversidade. Lembrou que o PL 1.920/04, que altera a Lei Florestal, é de autoria da Comissão Especial da Silvicultura, que colheu sugestões dos segmentos envolvidos para apresentar a proposição. A comissão funcionou entre maio e setembro de 2004. Furiati disse discordar das empresas que usam artifícios para usar carvão ilegal e que a tendência, com o projeto, é reduzir os desmates, apoiado também em maior controle pelo IEF.

Ricardo Castilho, da AMS, lembrou que o carvão de floresta plantada é mais produtivo do que o de floresta nativa. Por isso, um hectare de floresta plantada representaria a preservação de 10 hectares de mata nativa. Ele assegurou aos deputados que o setor de floresta plantada tem investido em tecnologia e em expansão da área. Ao final da reunião, o deputado João Leite (sem partido) sugeriu um seminário para discutir a Lei Florestal em profundidade. O relator do PL 1.920/04 na comissão, deputado Paulo Piau, apoiou a idéia, mas disse que é possível avançar também por meio do projeto. Ele defendeu a simplificação de procedimentos, mais fiscalização e punição adequada para quem infringir a lei. O presidente da comissão, deputado Laudelino Augusto (PT), lembrou, por outro lado, que o assunto não acabava na reunião desta quarta.

Para entender o projeto

O PL 1.920/04, da Comissão Especial da Silvicultura, altera os artigos 47 e 48 da Lei 14.309, de 2002, que dispõe sobre as políticas florestal e de proteção à biodiversidade. A lei determina que o consumidor de matéria-prima florestal deverá manter 90% de seu consumo proveniente de floresta plantada. Os restantes 10% poderão ser oriundos de floresta nativa de áreas de uso alternativo do solo autorizado (produção de carvão, madeira ou lenha), com o devido pagamento de reposição florestal. Essa reposição pode ocorrer por meio do plantio florestal próprio, do plantio realizado por uma associação de reposição florestal ou pelo pagamento, em dinheiro, depositado em conta especial do IEF. Caso o consumo de carvão de mata nativa seja superior ao máximo autorizado, a reposição deve ser paga em dobro, e o valor dobrado deve ser obrigatoriamente depositado na conta especial do instituto.

O projeto altera a base de cálculo, para o consumo anual total, do carvão de nativa autorizado. A Comissão Especial da Silvicultura alega que a base de cálculo prevista na lei é a parcela do consumo oriunda de florestas plantadas no território mineiro, o que reduz à insignificância esse volume. Segundo a comissão, a quase totalidade do carvão de nativa consumido acaba pagando reposição em dobro. Esse método estimula, por esse motivo, a aquisição de carvão produzido informalmente, já que fica onerada a produção legal. Ao criar a autodeclaração de consumo excedente de carvão de nativa, o projeto determina, ainda, que o consumidor terá o direito de optar por uma das três formas de pagamento da reposição em dobro. Isso permitirá, segundo a autora do projeto, que se invista o recurso em floresta própria ou em associação de reposição, evitando o pagamento em dinheiro.

O diretor de Monitoramento e Controle do IEF, Rubens Vargas Filho, afirmou que o projeto vai possibilitar a ampliação do volume de carvão de mata nativa consumido hoje, mas sem o pagamento da reposição em dobro. Ele informou que a produção autorizada de madeira proveniente de floresta nativa foi de 5 milhões de m³, em 2004. Desse total, 2,5 milhões de m³ foram de carvão e cerca de 90% da produção foi destinada às siderúrgicas. Também em 2004, o volume de floresta plantada em Minas foi de 12 milhões de m³ de carvão. De acordo com a Lei 14.309, portanto, o máximo de carvão de mata nativa que deveria ter sido consumido seria 1,2 milhão de m³. Como houve uma autorização maior por parte do IEF, os grandes consumidores tiveram de pagar a reposição florestal em dobro. Rubens Vargas Filho admitiu, no entanto, que o consumo pode ter sido muito superior a esses 2,5 milhões de m³, já que a fiscalização do instituto é deficiente.

Continuando esse raciocínio, ele ponderou que, caso a base de cálculo do carvão de nativa autorizado mude para o consumo anual total, o máximo de carvão de mata nativa a ser consumido passará de 1,2 milhão de m³ para 2,6 milhões. Isto porque o consumo total, englobando florestas plantadas no território mineiro ou fora dele, foi de 26 milhões de m³, em 2004. O diretor de Pesca e Biodiversidade do IEF, Célio Vale, foi além. Para ele, é preciso chegar a um ponto na legislação em que a floresta nativa permanecerá intocada. "O apego dos produtores ao carvão de nativa é pré-histórico. Eles continuam a ser homens das cavernas", desabafou, afirmando que a floresta de carvoejamento é conduzida por irresponsáveis, que estão pilhando a biodiversidade do país.

Ministério Público também tem postura crítica

Os dois representantes do Ministério Público Estadual que participaram da reunião criticaram não somente o PL 1.920/04, mas também a Lei Florestal. Na opinião do coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Habitação e Urbanismo, Rodrigo Cançado Anaya Rojas, Minas Gerais está perdendo a luta pela preservação das matas nativas. "O pagamento da reposição florestal em dobro deve ser economicamente viável, já que a pressão sobre a floresta nativa não diminuiu", opinou, criticando a possibilidade dessa reposição. Já a autodeclaração de consumo excedente de carvão de nativa, prevista no projeto, é "uma confissão do crime", na opinião dele.

O promotor José Aparecido Gomes Rodrigues enfatizou que o setor produtivo precisa reconhecer sua culpa. "Se a fiscalização do IEF é deficiente, falta também ética no comportamento das empresas de siderurgia", apontou. Ele reivindicou um debate mais aprofundado sobre o assunto, afirmando que o carvão ilegal é transportado clandestinamente nas rodovias - e há quem o compre. Rodrigues também cobrou que o setor produtivo invista nas florestas plantadas. "Apesar dos esforços de despejar recursos públicos no reflorestamento, há uma leniência do setor produtivo em buscar a solução na floresta plantada", completou.

Requerimentos - Foram aprovados ainda cinco requerimentos: do deputado Célio Moreira (PL), solicitando audiência pública sobre o gás natural veicular; da deputada Elisa Costa (PT), solicitando à Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) o envio de cópia de parecer técnico sobre a situação do aterro sanitário de Governador Valadares; do deputado Doutor Ronaldo (PDT), solicitando audiência pública para discutir o impacto ambiental na bacia do Rio Bananeiras; do deputado Padre João (PT), audiência pública para discutir resolução que disciplina o cadastramento de unidades de conservação da natureza; do deputado Paulo Piau (PP), solicitando audiência pública para analisar a eficácia dos instrumentos de gestão ambiental.

Presenças - Deputados Laudelino Augusto (PT), presidente; João Leite (sem partido), Paulo Piau (PP), Padre João (PT), Dalmo Ribeiro Silva (PSDB) e Carlos Gomes (PT). Além dos convidados mencionados na matéria, participaram o diretor de Desenvolvimento Florestal Sustentável do IEF, Geraldo Fausto da Silva, e Cristina Chiodi, da Amda.

 

 

 

 

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