Carvoeiros do Médio Espinhaço reclamam de fiscalização do
IEF
Multas abusivas que podem chegar a R$ 86 mil,
proibição de desmatamento para plantio de alimentos, apreensão de
caminhões carregados de carvão, truculência dos fiscais e da Polícia
Florestal contra trabalhadores de carvoarias. Essas foram as
principais queixas de moradores dos municípios da região conhecida
como Médio Espinhaço, no centro do Estado, trazidas aos deputados da
Comissão do Trabalho, da Previdência e da Ação Social, em audiência
pública realizada no auditório da Assembléia Legislativa, nesta
terça-feira (14/06/05).
A audiência foi pedida pelo deputado Alencar da
Silveira Jr, (PDT), que também preside a comissão. O deputado
convidou os prefeitos de Rio Vermelho, Sêrro, Serra Azul de Minas e
Santo Antônio do Itambé, além de donos de carvoarias, sindicalistas,
e dos representantes do IEF e do Ministério Público. Alencar da
Silveira Jr. abriu a reunião resumindo as queixas que havia recebido
previamente, e considerando que o direito de propriedade estava
sendo desrespeitado. "Se o governo não permite que o proprietário
faça nada com sua terra, que lhe pague então um salário para ficar
de braços cruzados tomando conta", propôs o parlamentar.
O deputado Gustavo Valadares (PFL) e a deputada
Elisa Costa (PT) procuraram a conciliação entre as exigências legais
e as dificuldades dos trabalhadores. "Precisamos encontrar um bom
termo que sirva para os carvoeiros e para o meio ambiente", disse
Valadares. "Não queremos o desemprego, nem a devastação do que resta
de nossas florestas naturais", ajuntou Elisa Costa. Também a
deputada Jô Moraes (PCdoB) disse que a solução dependia de uma
conversa franca entre os órgãos competentes e as pessoas
afetadas.
Os quatro prefeitos presentes traçaram um quadro
das dificuldades de seus municípios, que enfrentam muita pobreza e
cuja população mora principalmente na zona rural. Sargento Leonardo,
prefeito de Serra Azul de Minas, afirmou que parte da população
depende do trabalho na Prefeitura e os restantes sobrevivem dos
desmatamentos ilegais, atividade a que se dedicam há 14 anos sem
receber orientação e sem contato com a fiscalização. "O povo está
desesperado. Os fiscais chegam de forma arbitrária, maltratam
trabalhadores humildes que respeitam a autoridade. Precisamos de
receber cestas básicas e medicamentos, para evitar que saqueiem os
estabelecimentos", disse Sargento Leonardo.
Newton Firmino de Souza, de Rio Vermelho, falou das
filas de desempregados, impedidos de qualquer forma de extrativismo.
"Segurança pública não existe em nossa região, mas quando é para
reprimir quem está trabalhando, toda hora estão lá. Rio Vermelho
faliu, o comércio parou, quem tinha caminhão está vendendo". Souza
disse que não há alternativa de sobrevivência e pediu a revogação
das medidas. José Augusto Silva Neto, de Santo Antônio do Itambé,
disse que é certo buscar o equilíbrio das questões sociais e
ambientais, mas que "a fiscalização chegou de forma abrupta. Os pais
de família não tiveram tempo de buscar alternativa". Só o prefeito
do Sêrro, Guilherme Simões Neves, tem uma relação melhor com o IEF,
a quem propôs uma parceria para reflorestar áreas que podem se
tornar auto-sustentáveis. Mesmo assim, pediu que algumas áreas sejam
reclassificadas como de cultura, para que os proprietários possam
plantar o sustento.
Zé Ditão, sindicalista de Rio Vermelho, expôs o
sentimento dos trabalhadores: "O povo tá acuado porque não
tá podendo mais nada. Não pode nem roçar para plantar
alimento. Não queremos destruir o ambiente, mas não é só o ambiente
que merece viver. A gente também tem o direito de tirar a
sobrevivência, trabalhando honestamente".
O promotor Fernando Galvão, da Promotoria de Meio
Ambiente do Ministério Público, lamentou que o impasse fosse
percebido dessa maneira. "Órgão ambiental que cumpre o seu dever não
pode ser responsabilizado pela pobreza da região. Estamos aqui para
dar apoio à legalidade". No entanto, Galvão ressalvou que a conduta
porventura abusiva de fiscais e policiais devia ser investigada e
punida.
Cristina Chiodi, da Associação Mineira de Defesa do
Meio Ambiente (Amda), também argumentou em defesa do IEF, ao dizer
que os trechos remanescentes da Mata Atlântica são protegidos pela
própria Constituição Federal, e que seu estoque não permite mais
intervenções. Aproveitou a fala dos prefeitos para argumentar que as
carvoarias perpetuam a pobreza da população. "Se vocês fazem carvão
e continuam pobres, isso mostra que a atividade apenas destrói a
mata e não traz desenvolvimento", raciocinou.
Mais argumentos em favor do meio ambiente vieram de
Sylvio Castro Fonseca, chefe do IEF em Diamantina. Ele informou que
a Mata Atlântica foi dizimada em 80 anos, e que restam apenas 2,8%
da mata original em Minas. Os remanescentes mais importantes
estariam em Rio Vermelho. Em toda a região, uma imagem de satélite
mostra mais de 800 focos de desmatamento. Fonseca fez uma exposição
sobre a importância das florestas para proteção dos lençóis
freáticos, e previu que, se a situação continuasse, dentro de 20
anos não haveria nem mesmo água para beber na região.
Feitos os desabafos e as defesas, os deputados e
autoridades começaram a discutir alternativas para o desenvolvimento
sustentável da região. Esperanças de médio prazo são depositadas no
Programa Estrada Real e no desenvolvimento do turismo. Foi sugerido
o cultivo comercial da candeia, espécie nativa da região. Também
alternativas de piscicultura foram sugeridas devido à abundância de
água, e de apicultura, que pode ser feita na floresta nativa. "A
floresta é o pasto apícola", resumiu o técnico do IEF. Até mesmo
recursos internacionais do Protocolo de Kioto para regeneração de
áreas devastadas e geração de créditos de oxigênio foram cogitados
pelo promotor Galvão.
Ao final, o deputado Alencar da Silveira Jr. propôs
reuniões no Sêrro e em Rio Vermelho, para a educação da população e
a construção de projetos alternativos junto com a comunidade. Pediu
também a humanização das relações do IEF com a comunidade e a
revisão das multas consideradas excessivas. Gustavo Valadares pediu
uma trégua temporária na fiscalização e Elisa Costa propôs soluções
coletivas que envolvessem recursos dos governos estadual e
federal.
Presenças: Deputado
Alencar da Silveira Jr (PDT), presidente; deputada Elisa Costa (PT),
vice-presidente; deputado Gustavo Valadares (PFL) e deputada Jô
Moraes (PCdoB).
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